Intervenção no Montepio? “Nunca aconteceu, nem há-de acontecer”, diz Vítor Melícias

Vítor Melícias diz que "há demasiada especulação" sobre a situação financeira da Associação Mutualista Montepio Geral. E afasta qualquer cenário de intervenção financeira na instituição.

Padre Vítor Melícias em entrevista ao ECO - 03NOV19
Vítor Melícias no jardim do Seminário da Luz, em Lisboa.Hugo Amaral/ECO

Vítor Melícias considera que “há demasiada especulação” em torno da situação financeira da Associação Mutualista Montepio Geral (AMMG) e que pode ameaçar as poupanças de mais de 600 mil associados e pensionistas. Assegura que a maior mutualista do país está segura do ponto de vista financeiro. “Está lá a melhor gente do mundo, estão lá tipos que trabalharam nas finanças, universitários, economistas, são gente competente”, sublinha, afastando qualquer cenário de intervenção.

A instituição enfrenta desde 2015 um quadro de falência técnica, que tem sido “disfarçado” pelos créditos fiscais de 805 milhões de euros aprovados em 2017 e que estão a engordar de forma meramente contabilística o balanço da AMMG.

Neste cenário, os associados e pensionistas da AMMG podem ser chamados a sanear financeiramente a instituição, correndo o risco de verem os seus benefícios cortados até 30%, tendo em conta a aplicação estrita da lei. Há outra possibilidade em cima da mesa: para evitar perdas para as famílias, o Estado interviria de forma articulada com a Caixa Geral de Depósitos (CGD), assegurando a estabilidade financeira da mutualista, num cenário que tem sido alvo de discussões nos bastidores e que o Público trouxe recentemente à baila.

Em entrevista ao ECO, um dos “históricos” dirigentes do Montepio rejeita o que considera ser “mera teoria” e diz que lhe garantem lá dentro que a instituição está sólida. “Intervenção do Estado? É mera teoria. Isso nunca aconteceu. Nem há-de acontecer. Estas instituições são de natureza associativa, voluntária e solidária“, afirma o padre franciscano Vítor Melícias, que está há mais de 30 anos na instituição e que desde 2008 preside à mesa da assembleia geral.

Acrescentou que quem investe as poupanças no Montepio, esse dinheiro deixa de ser seu e passa a ser “dinheiro social”. “Quem vai para o monte [de piedade, daí montepio] vai para o monte comum, deixa de ser um capital e passa a ser um fundo social ou um monte social. Aquele dinheiro que está ali não é dinheiro privado, lucrativo, que possa ser trocado, vendido, transferido ou deixado em herança. Também não é dinheiro público. É dinheiro social. E se esse dinheiro social se esgotar, obviamente que todos aqueles que participam… se o dinheiro aumentar a todos aumenta, se ele diminuir a todos diminui [o dinheiro]”.

Vítor Melícias criticou ainda as especulações nos jornais, designadamente “de pessoas que não estudam o suficiente os assuntos e depois mandam para fora com números, o que é muito desestabilizador” para uma instituição. “Leva as pessoas a terem medo”, atira o padre, dando o exemplo do caso Banif, que em 2015 teve de ser alvo de uma medida de resolução do Banco de Portugal depois de uma notícia na televisão ter noticiado que o banco ia ser liquidado.

“Toda a gente conhece o caso do Banif. Quando uma comunicação social meteu aquele medo ao povo, o povo foi lá ao banco tirar o dinheiro”, reforça Melícias. Mas pode acontecer o mesmo ao Montepio? “Teoricamente é possível. Mas, na prática, julgo que não é possível. São de naturezas diferentes“, contrapõe Vítor Melícias.

"Quem mete as suas coisas ali não continua a ser dono delas. (…) Aquele dinheiro que está ali não é dinheiro privado, lucrativo, que possa ser trocado, vendido, transferido ou deixado em herança, nem é público. É dinheiro social. Se esse dinheiro social se esgotar, obviamente que todos aqueles que participam…”

Vítor Melícias

Presidente da assembleia geral da Associação Mutualista Montepio Geral

“Deixem lá a carroça andar e logo veem”

Vítor Melícias também defende que os créditos fiscais foram uma medida muito estudada internamente e que se avançou com ela porque foi reconhecida como mais vantajosa para o Montepio.

Os créditos fiscais de 805 milhões foram aprovados há dois pelo Governo e permitiram à instituição evitar “artificialmente” a situação de falência, em que o património (ativo) não é suficiente para fazer face às responsabilidades com os associados.

“Foi uma solução considerada positiva, estudada internamente como deve ser, embora houvesse duas ou três pessoas que não concordaram de maneira nenhuma. Avançou-se para aquela opção. É uma boa opção, está legalizada, vamos praticá-la. Deixem lá a carroça andar e logo veem“, diz o padre franciscano.

A sobrevalorização do banco no ativo na mutualista tem sido identificado como outro dos temas sensíveis. Os próprios auditores da AMMG, a KPMG, tem alertado para o facto de o Banco Montepio estar registado no balanço da AMMG com um valor acima do seu real valor. Vítor Melícias também está tranquilo porque, “podendo haver ajustes a fazer, maiores ou menores”, “os que sabem mais lá dentro” não lhe transmitem motivo de preocupação.

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