Acordo de rendas acessíveis entre Segurança Social e CML beneficiou apenas autarquia, acusa Tribunal de Contas
O acordo assinado entre a Segurança Social e a Câmara de Lisboa para a cedência de imóveis para rendas acessíveis beneficiou a autarquia "em detrimento da receita" da instituição, conclui auditoria.
A Segurança Social e a Câmara de Lisboa (CML) assinaram um acordo para a cedência de imóveis da instituição ao Programa de Renda Acessível (PRA). Entre dúvidas nas avaliações dos imóveis e “falta de sustentação técnica”, uma auditoria do Tribunal de Contas (TdC) concluiu que esse “contrato” foi apenas benéfico para a autarquia, prejudicando as contas da Segurança Social.
Em junho de 2018, a CML demonstrou “interesse na alienação ou arrendamento” de um conjunto de 11 edifícios em Lisboa, pertencentes à Segurança Social que, uma vez desocupados, seriam alvo de uma avaliação por parte da instituição. Depois de a Segurança Social ter encomendado essa avaliação a duas empresas, que determinaria o valor de mercado e a yield (taxa de rentabilidade), a autarquia “também promoveu a avaliação dos referidos edifícios por outras duas empresas de avaliação imobiliária”, refere a auditoria do TdC à gestão do património imobiliário da Segurança Social.
Na sequência desses dois processos de avaliação, o Ministério do Trabalho, liderado por Vieira da Silva, a Segurança Social e a CML, presidida por Fernando Medina, assinaram um “Memorando de Entendimento” que visava “afetar ao PRA os imóveis da Segurança Social”. Assim, estava prevista a celebração de contratos de arrendamento com um prazo de dez anos, automaticamente renováveis por igual período, com uam carência de dois anos, podendo a autarquia exercer a opção de compra dos imóveis nos primeiros cinco anos pelo valor médio das quatro avaliações.
Método para determinar valor de mercado foi “distinto”
O primeiro problema apontado pelo TdC tem a ver com o método adotado na determinação do valor de mercado dos imóveis. Na ótica do Tribunal, este foi “distinto dos procedimentos adotados relativamente à alienação de património da Segurança Social pelo IGFSS, nomeadamente a entidades públicas”.
Isto é, as avaliações da Segurança Social valorizaram os imóveis em 62.272.586 euros e 59.122.500 euros, enquanto as avaliações da CML valorizaram os imóveis em 54.412.000 euros e 53.149.000 euros. Em média, as avaliações da Segurança Social fixam 60.697.543 euros, enquanto a média das avaliações da autarquia foi de 53.780.500 euros, ou seja, inferior em 11,4% (6.917.043 euros).
Mas foram exatamente os valores da autarquia que a Segurança Social teve em conta. Do lado da CML, esta defende-se ao afirmar que “o critério que tem sido adotado”, perante “três ou mais avaliações, é o da maior diferença relativa para a média aritmética (…) e fica 25,4%, o que para o tipo de imóvel em causa, e existindo quatro avaliações, se considera perfeitamente aceitável“.
"Estas alegações não integram qualquer fundamentação, designadamente que justifiquem o critério que, alegadamente, vem sendo adotado. Assim, reitera-se que, na ausência de norma legal ou regulamentar, devem ser observadas as boas práticas de gestão.”
Contudo, para a instituição liderada por Vítor Caldeira, estas justificações “não integram qualquer fundamentação, designadamente que justifiquem o critério que, alegadamente, vem sendo adotado”. Isto porque, diz o Regime Geral dos Organismos de Investimento Coletivo, “caso os valores atribuídos difiram entre si em mais de 20%, por referência ao menor valor, o imóvel em causa é novamente avaliado”. E, neste caso, de acordo com o TdC, há um desvio generalizado de 70,6%, e em apenas dois dos 11 imóveis é que se observou um desvio inferior a esses 20%.
Já o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social defende-se e afirma que a “determinação do preço foi efetuada de acordo com os princípios previstos nos normativos da CMVM, sendo que quer as avaliações do IGFSS, quer as do município respeitam os intervalos de 20%, recorrendo a dois de três métodos”. Mas o TdC insiste que “apenas considerando o valor global das avaliações realizadas foi respeitado o intervalo de 20%, sendo certo que o intervalo das avaliações deve ser aferido para cada imóvel“.
Entre os pontos destacados pelo Tribunal de Contas estão ainda o facto de, em dez das 11 avaliações feitas pela CML “o valor atribuído ao imóvel não ter resultado da utilização da metodologia de avaliação (…) pelo que falta sustentação técnica aos valores atribuídos”. Em contraditório, a CML argumenta que a empresa em causa utilizou o “método comparativo de mercado e o método de custo”, ao que o TdC responde que “tendo o avaliador apresentado dois valores, um para cada cenário, foi sempre adotado o maior de entre ambos“.
"As condições da operação fixadas no Memorando e posteriormente nos contratos celebrados apresentavam-se vantajosas para o município, em detrimento da receita e da sustentabilidade do orçamento da Segurança Social.”
Resumindo, o TdC conclui que “as condições da operação fixadas no Memorando e posteriormente nos contratos celebrados apresentavam-se vantajosas para a CML, em detrimento da receita e da sustentabilidade do orçamento da Segurança Social”.
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