Todos ganham, mas há uns que ganham mais do que outros
Todos podem reclamar vitória , mas o pior é mesmo o que se segue, o plano de reestruturação que tem de ser, ao mesmo tempo, um plano de viabilização da TAP.
Está feita a nacionalização que não é apresentada como tal (e que, por isso, poupa desde logo o dano reputacional que daí adviria), o Estado passa a controlar 72,5% da TAP, David Neeleman vai-se embora e o empresário Humberto Pedrosa fica para manter-se a presença de um privado na companhia. Todos podem reclamar vitória — Pedro Nuno Santos a política, Neeleman a financeira –, mas o pior é mesmo o que se segue, o plano de reestruturação que tem de ser, ao mesmo tempo, um plano de viabilização da TAP.
Quando, na madrugada de quinta-feira, o ECO avança em primeira mão que já havia um acordo de princípio para a reestruturação acionista da TAP que evitaria a nacionalização imediata e permitiria a injeção de fundos públicos no curto prazo, a reação foi de surpresa. Afinal, o spin do Governo, o público e o privado, apostou tudo na ideia de que a nacionalização era mesmo para avançar. Na verdade ninguém a queria, porque os riscos seriam enormes. Mas o acordo final a que se chegou é na verdade uma nacionalização suave.
O ministro Pedro Nuno Santos pode reclamar vitória, porque andou semanas a dizer que não autorizaria a transferência de qualquer apoio sem um reforço de poderes do Estado, sem o Estado a mandar. E se tanto disse, vai mesmo tê-lo. Mas se politicamente o ministro pode reivindicar esta narrativa, também é verdade que David Neeleman queria ir embora da TAP há muito e fez a sua estratégia com um objetivo: Como é que vou maximizar o encaixe com a saída? Recebeu 55 milhões de euros, portanto, fez também um grande negócio, sobretudo se pensarmos que lhe pagaram o que pagaram por 22,5% do capital de uma empresa falida. A alternativa era receber ‘zero’. Por isso, Neeleman vai sair calado e feliz.
Há uma explicação para este negócio de Neeleman, o pecado original: O parassocial que lhe foi dado em 2016 quando foi renegociada a posição acionista do Estado para 50%. Com aqueles cintos e suspensórios, só podia dar nisto, independentemente da narrativa política deste negócio.
Agora, com a TAP ‘nacionalizada’, vem a fatura. E a hora de decisões, leia-se, o plano de reestruturação que vai tornar a TAP mais pequena e, desejavelmente, mais bem preparada para ser viável, coisa que está longe de ser um dado adquirido. É por isso irónico ler comunicados dos sindicatos a mostrarem o seu contentamento com a solução de ‘nacionalização’, e não faltará muito para lermos, dos mesmos sindicatos, ataques ao ministro que agora elogiam.
A TAP vai receber 1.200 milhões de euros até ao final do ano, dos quais 250 milhões nos próximos dias para pagar dívidas a fornecedores e para pagar salários de julho, que já estavam em risco. Mas já se sabe que este será apenas o primeiro cheque, no próximo ano será necessário reforçar o capital da companhia, porque os prejuízos deste ano serão superiores a mil milhões de euros. E as perspetivas para o setor da aviação nos próximos anos estão longe de serem positivas, menos ainda para a TAP.
A TAP terá dois caminhos: participar num processo de consolidação internacional ou transformar-se numa companhia de dimensão regional, dedicada a responder ao serviço público com as comunidades portuguesas no mundo, a unidade territorial e pouco mais. Se no primeiro caso, poderá caminhar para a viabilidade, e o Estado poderá voltar a sair do capital, no segundo caminhará para a subsidiação permanente pelos contribuintes. O plano que se segue ditará o que se vai seguir?
Última nota: Pedro Nuno Santos despediu o presidente executivo da TAP, Antonoaldo Neves, em direto nas televisões. Não foi bonito, foi uma demonstração de poder que tocou na humilhação. É um pormenor no meio desta história, mas serve para uma coisa: Vamos ver qual vai ser a escolha do Governo para a TAP e se a companhia vai ser gerida por um gestor profissional como Antonoaldo Neves, com experiência no setor, ou por um qualquer ‘boy’ do PS.
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