Novo Banco vendeu imóveis com desconto sem explicar porquê, diz a Deloitte
A Deloitte conclui que foram vendidos imóveis abaixo do preço da última avaliação sem haver uma explicação para tal. Em reação, o Novo Banco diz que as vendas foram por concurso internacional.
Na análise que fez ao banco, a Deloitte concluiu que o Novo Banco vendeu imóveis a um preço inferior ao da última avaliação sem uma análise e justificação. Uma situação que é permitida pelas regras internas, segundo a consultora. Esta é uma das conclusões da auditoria — expurgada das matérias consideradas confidenciais — que foi divulgada esta terça-feira no site da Assembleia da República.
“As vendas efetuadas pelo Novo Banco foram realizadas por valores inferiores (em alguns casos de forma significativa) face aos valores das últimas avaliações disponíveis“, começa por explicar a auditora, confirmando as notícias de que foram vendidos vários imóveis com desconto.
Contudo, o banco não deu uma explicação para tal. “O Novo Banco não tinha igualmente implementado procedimentos de análise e justificação formal das variações ocorridas nas avaliações obtidas, comparativamente às avaliações anteriormente disponíveis“, lê-se na auditoria.
A equipa da Deloitte verificou que nas propostas de aprovação das vendas de imóveis consta uma descrição das características dos mesmos, mas “não é incluída uma justificação ou explicação para a diferença entre o valor de venda e o valor de avaliação anterior”. A consultora nota, porém, que “esta justificação não era requerida de acordo com o normativo interno aplicável“.
Mais: “Refira-se a inexistência de normativos especificamente relativos a vendas agregadas de imóveis em vigor no período em análise, ao nível do Novo Banco e da sociedade gestora dos fundos, que identifiquem os passos a seguir no processo de deliberação por parte do órgão decisório e a documentação a ser preparada nesse âmbito, não obstante existirem normativos para a venda isolada de imóveis que foram considerados na análise efetuada”.
De acordo com a auditoria, a carteira de imóveis do Novo Banco tinha um valor líquido de 2.079 milhões de euros a 4 de agosto de 2014, subindo até 2.722 milhões de euros a 31 de dezembro de 2015. “A partir dessa data a carteira de imóveis foi evidenciando uma redução progressiva, sendo o seu valor liquido total de 2.035 milhões de euros em 31 de dezembro de 2018”, refere a Deloitte, explicando que nesse ano houve a venda de imóveis do Projeto Viriato, cujo valor ascendia a cerca de 550 milhões de euros. Tanto em 2017 como em 2018, os imóveis foram responsáveis pela maior parte das perdas do banco.
A Deloitte explica ainda que as vendas de carteiras de imóveis detidos por fundos de investimento abertos ocorrem entre 2014 e 2017, sendo que estas operações “nem sempre se apresentaram adequadamente documentados o racional para a montagem da carteira, o valor de venda esperado (sustentado em avaliações da carteira), ou uma análise de cenários alternativos“.
Em reação à auditoria, o Novo Banco esclarece que “tem, desde 2014, procurado reduzir o anormal volume de imóveis que detinha em carteira, como aliás era sua obrigação legal”. O banco liderado por António Ramalho argumenta que as vendas em “pacote” foram feitas por concurso internacional, “organizado e competitivo”, e “não por adjudicação direta, visando assegurar a obtenção o melhor preço de mercado“.
Além disso, o Novo Banco recorda que “todos os imóveis que faziam parte do património protegido pelo Mecanismo de Capital Contingente foram sujeitos a análise pela Comissão de Acompanhamento e a sua venda autorizada expressamente àquele preço, pelo Fundo de Resolução onde estão representados o Banco de Portugal e o Ministério das Finanças“.
Deloitte deteta ausência de análises de conflitos de interesses
A auditoria da Deloitte verificou “a inexistência de normativos internos para todo o período que regulassem a realização sistemática de uma análise das entidades compradoras que participaram em processos de desinvestimento, de forma a concluir acerca de eventuais riscos de branqueamento de capitais e de conflitos de interesse“. No caso do BESI e do BES V, esta análise “não foi efetuada”.
Em causa estarão situações como as já noticiadas pelo Público em que o Novo Banco poderá ter vendido imóveis a fundos com ligações diretas ou indiretas ao Loan Star, o fundo norte-americano que comprou o banco em 2016.
Segundo a Deloitte, os pareceres da direção de compliance do Novo Banco apenas dizem que as estruturas dos fundos são complexas e que há declarações das sociedades gestoras de que não há participantes com maior de 25% do capital, “conforme estipulado em legislação para o dever de diligência no âmbito do branqueamento de capitais, pelo que não qualificam como últimos beneficiários efetivos, não tendo deste modo sido obtida informação adicional sobre a respetiva identidade”. Assim, os gestores da sociedade gestores são considerados os últimos beneficiários efetivos.
“Adicionalmente, nas situações em que foram realizadas análises de contraparte, não tendo sido identificadas pessoas relacionadas com o Novo Banco ou a Lone Star, de acordo com informação prestada pelo Novo Banco, não foram efetuadas análises de partes relacionadas ou análises de conflitos de interesses“, alerta a consultora, revelando “a inexistência de normativos internos para todo o período que regulassem a realização sistemática de uma análise das entidades compradoras que participaram em processos de venda, incluindo vendas agregadas de ativos, de forma a concluir acerca de eventuais conflitos de interesse ou outros constrangimentos à realização das operações“.
Em reação, o Novo Banco reafirma que “os compradores são naturalmente conhecidos, não só por exigência do Novo Banco, como porque, em Portugal, os imóveis são transmitidos por escritura pública e sujeitos a registo predial“.
(Notícia atualizada às 14h47 com a reação do Novo Banco)
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