Empresas podem impor horários desfasados sem acordo dos trabalhadores
Os empregadores de Lisboa e do Porto poderão alterar de modo unilateral os horários de trabalho, de forma a garantir o desfasamento exigido pelo Governo.
Com a passagem do país ao estado de contingência, as empresas de Lisboa e do Porto vão ter de implementar horários de trabalho diferenciados não só de entrada e saída, mas também de pausas e troca de turnos. Segundo a proposta de decreto-lei a que o ECO teve acesso, os empregadores poderão organizar unilateralmente esse desfasamento, tendo apenas de consultar os trabalhadores e informá-los da alteração cinco dias antes da sua concretização.
“O empregador pode alterar unilateralmente os horários de trabalho, mediante consulta prévia aos trabalhadores envolvidos e à comissão de trabalhadores ou, na falta desta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais, afixando na empresa os novos horários com antecedência mínima de cinco dias relativamente ao início da sua aplicação”, lê-se no diploma que será enviado aos parceiros sociais.
A Resolução do Conselho de Ministros publicada na sexta-feira já dava sinais de que os empregadores das áreas metropolitanas poderiam organizar o desfasamento dos horários sem acordo dos trabalhadores, remetendo a questão para o Código do Trabalho. A proposta de decreto-lei que será agora enviada para a Concertação Social confirma-o.
O referido diploma publicado na sexta-feira adiantava que caberá ao empregador alterar a organização do tempo de trabalho “ao abrigo do poder da direção”.
O Executivo salientava, então, que se deverá aplicar “o procedimento previsto na legislação aplicável”. E que procedimento é este? De acordo com o advogado Pedro da Quitéria Faria, a lei prevê que apenas nos casos em que os horários estão estipulados no contrato de trabalho é necessário acordo entre o empregador e o trabalhador para avançar com alterações.
O advogado Hugo Martins Braz corrobora: “De acordo com as regras do Código do Trabalho, apenas é vedado ao empregador alterar unilateralmente o horário de trabalho relativamente a trabalhador cujo horário de trabalho tenha sido individualmente acordado”.
Uma grande fatia dos contratos de trabalho feitos em Portugal não inclui, no entanto, esse ponto, deixando ao empregador o poder de definir os horários, explica Pedro da Quitéria Faria.
Nesse caso, a lei prevê que a empresa possa alterar o horário sem chegar a acordo com o trabalhador, tendo de apresentar apenas uma justificação e de informar o trabalhador da mudança sete dias antes da produção de efeitos, explica o mesmo especialista.
“Como regra geral, o empregador pode alterar o respetivo horário de trabalho, desde que cumprindo o processo legalmente previsto para o efeito, que envolve uma consulta aos trabalhadores envolvidos e às estruturas de representação coletiva de trabalhadores (se existentes na empresa) e posterior afixação do novo horário na empresa com uma antecedência de sete dias em relação à data da sua entrada em vigor (ou três dias em caso de empresa que empregue menos de dez trabalhadores). A este respeito, o Código do Trabalho prevê ainda que no caso de a alteração do horário implicar um acréscimo de despesas para o trabalhador, este terá direito a uma compensação económica“, detalha Hugo Martins Braz.
O diploma que agora seguirá para patrões e sindicatos confirma que os empregadores poderão alterar os horários sem acordo dos trabalhadores, reduzindo em dois dias (de sete para cinco dias) a antecedência mínima de afixação dos novos horários antes da sua aplicação face ao que está previsto no Código do Trabalho.
Como já tinha adiantado o Correio da Manhã (acesso pago) e corrobora a proposta de decreto-lei que será enviada para os parceiros sociais, o desfasamento horário previsto nas áreas metropolitanas só será aplicado a empresas com 50 ou mais trabalhadores a prestarem serviços em simultâneo, prevendo-se coimas para aquelas que não cumpram estas normas.
O Governo exige ainda que as empresas organizem o desfasamento dos horários das diferentes equipas com intervalos mínimos de 30 minutos entre si, até ao limite de uma hora.
De notar que a referida Resolução do Conselho de Ministros explicava também que, nas situações em que não seja adotado o regime de teletrabalho, as empresas devem implementar adicionalmente esquemas de trabalho “em espelho”, salvo se tal se “afigurar manifestamente impraticável”.
A regulamentação destas novas formas de organização do trabalho será agora debatida com os parceiros sociais, antes de regressar a Conselho de Ministros para ser efetivamente posta em prática.
Os sindicatos têm defendido que a alteração dos horários não pode ser imposta unilateralmente pelos empregadores (como está previsto pelo Governo), até para proteger a conciliação da vida familiar, pessoal e profissional. Este deverá ser, portanto, um dos pontos mais polémicos, na fase de discussão que se segue.
É importante salientar que o teletrabalho mantém-se obrigatório quando requerido por um trabalhador que seja doente crónico ou tenha um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, bem como quando os espaços físicos e a organização do trabalho não permitam o cumprimento das orientações da Direção-Geral da Saúde e da Autoridade para as Condições do Trabalho para o combate à pandemia de coronavírus.
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