Como vai ser Davos 2017 por quem lá foi no passado

O ex-ministro da Economia, Pires de Lima, um professor da NOVA SBE envolvido em empreendedorismo e a cofundadora da Talkdesk falaram ao ECO sobre o que é Davos e o que significa para Portugal.

Davos, Davos, Davos… a partir desta terça-feira não vai ouvir outro nome. Mas o que acontece neste encontro que junta líderes políticos, grandes empresas e artistas mundiais? Estava prestes a rebentar uma revolução em Portugal quando se realizou o primeiro encontro do Fórum Económico Mundial. Estávamos em janeiro de 1974 quando os líderes mundiais se reuniram, pela primeira vez, na Suíça.

43 anos depois, Portugal marca novamente presença com um secretário-geral da Organização das Nações Unidas na manga e um presidente executivo de um banco inglês resgatado de forma positiva para os contribuintes. Em contrapartida, não há a presença de um ex-presidente da Comissão Europeia português, agora quadro da Goldman Sachs, que outrora era presença assídua.

2017 marca ainda o quarto ano desde que Portugal regressou a Davos com representação governativa. Foi com Pires de Lima que isso mudou, garante o próprio ao ECO: “Foi uma primeiras decisões que tomei quando cheguei ao Governo: posicionar Portugal no radar dos investidores e apresentar o país como um caso de sucesso do ponto de vista da estabilização financeira como da recuperação económica”, revela.

Audição do ex-ministro da Economia, António Pires de Lima, durante a audição sobre vencimentos das entidades reguladoras, a requerimento do PS, e sobre o processo de privatização da TAP, a requerimento do BE, na Assembleia da República, em Lisboa, 26 de abril de 2016. JOÃO RELVAS/LUSA
Audição do ex-ministro da Economia, António Pires de Lima JOÃO RELVAS/LUSALusa

E, para cumprir esse objetivo pouco depois de ter entrado no Governo na reformulação de junho de 2013, Pires de Lima quis ter representantes portugueses no Fórum de Davos, “onde já não íamos há muitos anos”. “Fui o primeiro membro de um Governo a ir a Davos em oito ou nove anos”, garante, ressalvando, no entanto, que esta presença em 2014 foi pouco planeada, pela falta de tempo, e que até ficou num hotel diferente do do secretário de Estado que o acompanhou, Leonardo Mathias.

Fui o primeiro membro de um Governo a ir a Davos em oito ou nove anos.

Pires de Lima

Ex-ministro da Economia

Em Davos entre 18 e 20 de janeiro, o ministro da Economia Manuel Caldeira Cabral vai estar mais focado em contactos. Segundo o gabinete do Ministro da Economia, as reuniões previstas com o Governo nacional nada terão a ver com a Tesla. As prioridades do Executivo são demonstrar que a economia portuguesa está bem colocada para receber investimento e, ao mesmo tempo, aproveitar o contacto com países como Canadá, Argentina e Arábia Saudita. O ministro da Economia vai estar em Davos entre 18 e 20 de janeiro, acompanhado pelo secretário de Estado da Indústria, João Vasconcelos.

Em 2014, Afonso Mendonça Reis, professor assistente na NOVA SBE, estava prestes a passar por Zurique para, nos dois anos seguintes, ser um dos portugueses privilegiados que conseguiu conhecer personalidades como o primeiro-ministro canadiano, o fundador da Wikipedia ou a diretora da UNESCO. Licenciado e com mestrado em Economia, Reis vivia na maior cidade suíça quando foi convidado a integrar os Global Shapers em 2012, daí fazer parte do evento em 2015 e 2016.

No seu currículo trazia passagens pela OCDE, a Fundação Aga Kahn e as Mentes Empreendedoras, uma empresa social que transforma os jovens em cidadãos de impacto, características que o levaram a ser incluído na equipa dos Global Shapers, uma entidade criada pelo Fórum Económico Mundial que pretende destacar os novos líderes do futuro.

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Afonso Mendonça Reis e Justin Tredeau, primeiro-ministro canadiano.

Foi um amigo — “envolvido nas questões das alterações climáticas” — que o desafiou, explica ao ECO, mas rapidamente o exemplo das mentes empreendedoras conquistou os presentes numa conferência. “Já tinha ido a um encontro da China, Annual Meeting of New Champions, em 2014, e por isso tinha uma sensibilidade do que ia acontecer”, recorda ao ECO, sobre a sua participação nos dois anos seguintes. E há uma coisa certa: para um jovem, em Davos há o FOMO, tão aplicado à internet, mas traduzido para um evento especial: significa estar com medo de estar fora do acontecimento.

Davos é uma experiência muito intensa, dorme-se muito pouco porque está-se sempre a conhecer gente interessante“, revela Afonso Reis ao ECO, garantindo que há muito episódios interessantes que lhe ocorreram nos dois anos. Até porque o ambiente, apesar de ser um evento povoado por personalidades reconhecidas mundialmente, é informal. “As pessoas cruzam-se a todo o momento com celebridades empresariais, mas também do campo das artes e política”, explica Pires de Lima, referindo que “o ambiente durante o dia é propício a contactos e reuniões entre políticos e os empresários”.

A plataforma para a recuperação económica de Portugal ser comunicada ao mundo

A missão era simples: difundir na comunicação social internacional que Portugal já estava em recuperação económica. Mais: foi na Suíça que o país anunciou que o Programa de Assistência Financeira ia acabar de forma “limpa”, sem programa cautelar: “Davos foi um ponto central da agenda de comunicação de recuperação económica”, garante Pires de Lima.

“Foi em janeiro de 2014 que anunciámos em Davos que Portugal ia terminar o Programa de Assistência Financeira de uma forma limpa, sem precisar de um programa cautelar, o que foi confirmado uns meses depois”, explica Pires de Lima, então ministro da Economia, ao ECO. Os encontros com televisões como a CBS e a CNN foram “regulares”.

Davos foi um ponto central da agenda de comunicação de recuperação económica.

Pires de Lima

Ex-ministro da Economia

Nesta altura a taxa de juro da dívida portuguesa, ainda sem acesso aos mercados, estava na casa dos 6%, face aos 4% onde se encontra atualmente. “A pergunta que muitos faziam era se nós não iríamos precisar de um segundo programa de resgate ou que tipo de assistência cautelar íamos ter caso terminássemos o nosso programa“, lembra o centrista. “Davos foi muito importante para dar conta dos dados que nós já tínhamos de recuperação económica. Foi muito importante apresentar os estímulos do ponto de vista fiscal e a reforma do IRC”, recorda Pires de Lima.

“É fundamental estar em Davos. Se Portugal precisa de investimento estrangeiro, tem de estar onde os investidores estão. Em dois dias em Davos nós tínhamos uma agenda preenchida que cobria várias viagens que pudéssemos fazer durante meses para encontrar esses mesmos investidores“, conta ao ECO, apesar de não ter saído de lá nenhum investimento concreto. Porquê? Pires de Lima explica: “A atração de investimento leva trabalho e task forces. Em Davos, o esforço era mais relacional. Não era em encontros de meia hora que se fechavam investimentos”.

Não houve nenhum investimento que tenha sido decidido em Davos. A atração de investimento leva trabalho e task forces.

Pires de Lima

Ex-ministro da Economia

Ainda assim, o ex-titular da pasta da Economia no Governo PSD/CDS considera que houve contactos estabelecidos importantes, como foi o caso de empresas da área tecnológica e telecomunicações. Foi-lhes apresentada “a oportunidade de investirem em Portugal em centros de serviços partilhados que hoje são um dos maiores empregadores dentro da categoria de novos investidores”, garante ao ECO.

O professor português que conheceu Justin Trudeau, Irina Bokova, Jimmy Wales e Mohammad Yunus

Há quem aproveite Davos ao máximo. Foi o caso de Afonso Reis que, em dois anos, encontrou várias líderes mundiais e até foi abordada por uma. Certo dia estava com a sua t-shirt “Inspire Your Teacher” (inspire o seu professor) e a diretora da Irina Bokova pediu-lhe para tirar uma fotografia. Dito e feito:

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Afonso Medonça Reis e Irina Bokova, diretora da UNESCO.DR

Mas os encontros mundiais não se ficaram por aqui. Justin Trudeau, atual primeiro-ministro do Canadá, começou a ganhar relevância com a saída do panorama político norte-americano de Barack Obama. Mas a “bomba de empatia”, como descreve o professor português que o conhecer, é igual ao vivo em comparação com a televisão. “Foi super importante conhecer pessoalmente Justin Trudeau, um senhor super bem preparado. Falamos sobre o que é ser professor porque ele próprio foi”, refere Afonso Reis, recordando que o primeiro-ministro canadiano esteve mais de uma hora a falar. “O mundo também precisa de políticos diferentes“, considera.

Da diretora da UNESCO para um primeiro-ministro, o que faltava? Um prémio Nobel da Paz. Sim, Afonso Mendonça Reis moderou um encontro entre os shapers (jovens da Global Shapers, entidade à qual pertence) com Mohammad Yunus. “É muito interessante que uma pessoa que se move nestes ambientes há tanto tempo se mantenha genuíno. Ele adora conhecer as pessoas e isso é uma coisa muito rara”, analisa o professor assistente.

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Afonso Mendonça Reis e Mohammad Yunus, prémio Nobel da Paz.

E, para terminar o leque de muitas personalidades que conheceu, o professor assistente da NOVA relembra Jimmy Wales, fundador da Wikipédia, “uma pessoa muito sólida”. Reis destaca a sua inteligência e independência de espírito, até porque “estava nos painéis e dizia coisas inconvenientes com a maior naturalidade”. “Era uma pessoa que estava a lá a fazer favores a ninguém. Esse desprendimento crítico é muito raro“, destaca.

Cool kids de Davos

“Ando a correr à custa de Davos”, explica Cristina Fonseca, 28 anos, em entrevista ao ECO. Ao telefone, a engenheira portuguesa de telecomunicações e cofundadora da startup portuguesa Talkdesk, explica que está de partida para, pela primeira vez, participar oficialmente no encontro. Mas esta não é a estreia de Cristina Fonseca em Davos: no ano passado, a engenheira integrou “oficiosamente” a comitiva de Global Shapers, “os cool kids de Davos”, garante.

“A grande vantagem que temos, além de podermos conhecer todas estas pessoas, é fazer as perguntas que os mais conhecidos não arriscam. Temos uma perspetiva diferente e mais realista: somos pessoas mais novas e que estão muito em contacto com os problemas do dia a dia”, explica.

Entusiasmada com alguns dos temas em cima das mesas de discussão em Davos, Cristina Fonseca tem, na lista de preferências, as questões relacionadas com Inteligência Artificial — e com o impacto da tecnologia –, Brexit e Trump e o futuro do trabalho e da educação.

“Só em trabalho pré-Davos, há muitas horas de preparação. Nem sempre é fácil inscrevermo-nos nas sessões. Mas é essencial que nos preparemos, sobretudo porque não queremos desperdiçar esta oportunidade”. Jack Ma, chairman do Alibaba, e Sheryl Sandberg, COO do Facebook, são dois dos nomes que Cristina Fonseca não quer perder. “No entanto, acredito que os melhores insights venham de outras sessões, inesperadamente”, garante.

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