O Natal é uma oportunidade de celebrar a união e reforçar a cultura numa organização. Devido à pandemia, os jantares de Natal vão ser substituídos por encontros virtuais e por cabazes ao domicílio.
De um lado do ecrã, dezenas de caras observam e ouvem com atenção as dicas dadas por Mafalda Sena. Do outro lado, a arquiteta e influenciadora digital do perfil de Instagram “Senas Saudáveis” detalha o potencial dos ingredientes e explica, passo a passo, como fazer a receita previamente definida.
Mafalda Sena já costumava ir a casas particulares cozinhar para pequenos grupos de pessoas mas a pandemia trouxe outro tipo de pedidos: empresas interessadas em organizar a festa de Natal em formato de workshop de cozinha saudável, com muitas dicas à mistura. “As empresas estão sem saber como organizar atividades de encerramento de ano quando as pessoas não podem juntar-se. As ideias acabam por esgotar-se”, detalha Mafalda Sena, em conversa com a Pessoas/ECO.
As opções criadas pela influenciadora preveem um workshop de cozinha mas permitem a contratação de extras de serviço, que podem ser um cabaz com os ingredientes necessários para a receita e até um vinho que harmonize com o prato desejado. A imaginação é que manda nestas “festas de Natal” reinventadas. “Consigo, com algum budget, associar uma receita aos ingredientes, tenho esta empresa parceira que prepara os cabazes em caixas de madeira ou numa cesta bonita que as pessoas podem usar para outros fins depois do workshop, estão incluídos alguns descontos para a loja online e até há empresas que me pedem o workshop que possam incluir os pais a cozinharem com os seus filhos”, explica a arquiteta. Cozinhar um bolo-rainha sem necessidade de este levedar ou acompanhar um copo de vinho com um cabaz de petiscos são algumas das opções disponíveis. O preço dos workshops por pessoa começa nos 20 euros.
Natal é como a empresa quiser
A tradição descreve-o como um momento de união e de reforçar laços. Também nas empresas, o Natal representa a época ideal para os trabalhadores se conhecerem melhor e reforçarem o envolvimento com a equipa e a organização num ambiente mais informal. Com a pandemia, os tradicionais almoços e jantares de Natal das empresas ficaram em suspenso e as empresas foram obrigadas a reinventar as celebrações de Natal e trocar a mesa do restaurante ideal por um encontro através de uma videochamada.
Na Zurich, este ano Natal é sinónimo de desafios. “Temos conseguido manter a tradição em algumas coisas: uma delas tem sido a festa de Natal. Com recorde de participação de 630 pessoas no ano passado, fomos uma das empresas que ocupou a tenda VIP no Passeio Marítimo de Algés em 2019”, começa por contar Nuno Oliveira, diretor de recursos humanos da empresa de seguros.
Este ano, pelos constrangimentos nos encontros, a mediadora de seguros, decidiu cancelar todos os eventos. Todos, menos a festa de Natal. “É fácil entrarmos na bolha da pandemia – indicadores, mortos e infetados – mas, em vez de nos focarmos nas dificuldades, vamos tentar identificar o mar de oportunidades. Associado ao programa BeConected lançado a 29 de março, decidimos trabalhar três pilares: cultura, desenvolvimento de competências e saúde mental e bem-estar das equipas. E mantivemos a ideia da ‘festa de Natal’ porque era a altura em que, num único momento, todas as pessoas encontram”, justifica o responsável.
Os termos mudaram um pouco, explica Nuno Oliveira: primeiro, a Zurich decidiu prolongar as ações de Natal para durante todo o mês de dezembro. Depois, foi entregue nas 519 localizações — as casas dos colaboradores — kits que incluem um calendário de advento “para alimentar esta interação”. Em terceiro lugar, foram criados grupos de trabalho e enviados convites para participar em atividades, partilhar fotografias das experiências propostas, que incluem enfeitar uma árvore de Natal, elogiar colegas. Tudo para contar a “HiZtória de Natal”. “Vai culminar só no dia de Reis, com a compilação desses vários momentos partilhadores”, antecipa Nuno Oliveira. “Isto não substitui de modo algum o presencial mas queremos reforçar a cultura, a marca e levá-la para casa das pessoas”, acrescenta.
Em termos práticos, estas alterações mudam também o foco de investimento que as empresas costumam fazer nesta época festiva. No caso da Zurich, se até 2020 o maior investimento em matéria de festa de Natal era feito em catering e aluguer de espaço, este dezembro tudo mudou. “Procurámos converter o mesmo em tudo o resto. Obviamente que há um novo custo, de distribuição e logística, que ganha dimensão, porque exige gerir mais de 500 pontos de entrega. Os grandes custos estão a ser a distribuição, já que o investimento nos cabazes é quase uma colagem direta com que tínhamos com o catering“, assinala Nuno Oliveira, diretor de recursos humanos da Zurich Portugal, acrescentando que, ao contrário de anos anteriores, era exigida uma inscrição na atividade de Natal, este ano não houve exceção. “O universo é 100% dos colaboradores”.
Para algumas empresas, as ferramentas tecnológicas permitem estender as celebrações de Natal, dar asas à imaginação e canalizar o investimento que era feito nestes eventos para ajudar a fatia da população com maiores necessidades.
É o caso da startup Landing.jobs, que adaptou o tradicional jantar de Natal a tempos de Covid. “O dia 17 de dezembro não será um dia de trabalho normal. Vamos ‘encontrar-nos’ para almoçar, cada um no seu computador. Antes desse dia, cada um dos 40 trabalhadores receberá um cabaz com produtos artesanais, merchandising e outros goodies, uma espécie de kit de sobrevivência”, conta Diogo Oliveira, managing director da empresa de recrutamento em tecnologia. A ideia de reunir todos os membros da equipa num evento online é muito mais do que assinalar a época do ano.
“Estando todos remote, estamos a aproveitar para caprichar um bocadinho mais num ano que foi difícil, uma espécie de recompensa dos bons resultados”, assinala o responsável. Por isso, este ano, a empresa investe cerca do dobro nesta atividade. “Além do almoço, teremos um dia cheio de atividades, com iniciativas de team building e training específícias, além de equipa de trabalho a tentar resolver problemas existentes. Tudo virtual”, sublinha.
Na consultora de gestão de recursos humanos Mercer, a festa de Natal anual foi cancelada, mas nem por isso a empresa suspendeu as celebrações. Por outro lado, a empresa decidiu prolongar as celebrações de Natal por várias semanas, num ambiente remoto. Para celebrar a época natalícia, vai organizar ações de consciencialização para a cidadania e solidariedade, workshops de decorações de Natal, jogos nas redes sociais e o desafio do “amigo secreto”.
“No final da jornada vamos fazer uma celebração especial pelo que acreditamos que será uma experiência inesquecível. Usando sempre os canais digitais para chegarmos às nossas pessoas”, conta à Pessoas Sónia Nunes, people team leader da Mercer Portugal.
Na Tabaqueira, onde trabalham mais de 1.000 pessoas, com 25 nacionalidades e 15 idiomas diferentes, o Natal é um momento de união para reforçar a cultura da empresa. Este ano, o tradicional encontro presencial será substituído por um evento virtual para todos os trabalhadores e a empresa assegura que tem surpresas preparadas.
“Queremos sobretudo garantir que assinalamos o momento juntando toda a organização e, sendo remoto, poderá até tornar-se num evento partilhado com as famílias“, assegura Miguel Matos, diretor-geral da Tabaqueira.
Cabazes ao domicílio
“Não vamos poder ter as nossas festas nas unidades, nem vamos ter os grandes encontros informais de equipas, mas não vamos deixar de celebrar, seja em grupos mais pequenos, seja nas nossas casas, com a oferta de um cabaz com diversos produtos para uma consoada mais aconchegante, porque a nossa preocupação com as nossas pessoas vai muito além da celebração pontual de efemérides”, conta à Pessoas Cláudio Valente, diretor de recursos humanos da IKEA, sem revelar as surpresas que só serão reveladas aos trabalhadores perto do dia de Natal.
Para ajudar as empresas a fazer chegar um cabaz a casa de cada um dos trabalhadores, sem preocupações, a Glovo criou a plataforma Christmas Virtual Dinner, que permite às empresas levar os ingredientes para que os trabalhadores possam organizar um jantar de Natal virtual e o Christmas Gift, um código com um valor para descontar em serviços da empresa.
Através da plataforma Christmas Virtual Dinner, as empresas podem oferecer códigos promocionais entre 15 e 50 euros. Com o Christmas Gift, os colaboradores podem encomendar a ceia para a sua família de comprar presentes ou ainda encomendar mercearias para casa.
Para surpreender os trabalhadores das empresas, também o Holiday Inn Porto Gaia criou a Christmas Box, uma caixa mistério que é entregue na casa de cada colaborador. Pode optar pela Gingerbread Box (8,5 euros), Dinner Box (13,50 euros) ou a Gift Box (9,50 euros), que incluem a refeição de natal completa, inlcuindo as bebidas, as rabanadas e o bolo-rei. As encomendas podem ser feitas através do email banquetes@hiportogaia.com.
O novo serviço da Uber Eats para empresas, que dá a possibilidade de enviar vouchers aos colaboradores, também pode ser uma alternativa para celebrar à distância.
(Re)direcionar recursos para ajudar a comunidade
Devido à impossibilidade de investirem nos jantares e encontros de Natal, para onde vai o dinheiro que era investido na organização desses eventos? A tecnológica Primavera decidiu mudar o destino da verba usada nos encontros de Natal na empresa com o movimento #MultiplicarONatal. Em parceria com a ONG Refood, por cada colaborador a empresa vai oferecer uma refeição e, com essa ação, ajudar 300 famílias carenciadas em vários pontos do país.
O mesmo vai acontecer na Mercer, que decidiu colocar o orçamento dos encontros de Natal na empresa ao serviço da comunidade.
“Infelizmente este ano não conseguimos realizar nenhum destes momentos, pelo que juntámos os orçamentos de cada iniciativa para um apoio direto à comunidade que nos rodeia. Ao longo dos anos fomos criando relações de parceria com várias organizações sem fins lucrativos e optámos por distribuir o nosso orçamento por estes parceiros“, explica a responsável da Mercer.
500 bolos-rei. É o número de unidades desta receita natalícia que os trabalhadores da Tabaqueira e as suas famílias vão ajudar a decorar com mensagens personalizadas, para serem distribuídos por IPSS da zona da grande Lisboa ou outras, escolhidas pelos colaboradores.
“Face à impossibilidade de realizarmos a ação nos moldes habituais, e de sermos nós próprios a meter as ‘mãos na massa’, decidimos continuar a apoiar quem mais precisa, através da distribuição de 500 bolos-rei a instituições sugeridas pelos trabalhadores da Tabaqueira. Em alternativa ao evento na cantina da empresa, lançámos aos nossos trabalhadores o desafio de criar uma mensagem de Natal personalizada que vai acompanhar os bolos entregues a cada uma das instituições”, descreve o diretor-geral da Tabaqueira.
Também a EDP decidiu ajudar e espera doar 2.600 cabazes de Natal com bacalhau, azeite, feijão ou bolo-rei, integrados na campanha solidária de Natal da empresa, que conta com o apoio dos colaboradores. Este ano, por cada cabaz doado pelos trabalhadores, a EDP doa outro.
“Em 2020, a pandemia agravou algumas das discrepâncias já existentes na sociedade e afetou economicamente muitas famílias, sendo o acesso a bens essenciais uma das prioridades da atual emergência social. Assim, a EDP também vai incentivar os colaboradores da empresa a participarem na oferta de cabazes de Natal com produtos alimentares“, refere fonte oficial da EDP. Além dos cabazes, a EDP terá ainda outra campanha de entrega de sacos-cama e espera chegar a mais de 1.700 pessoas carenciadas, apoiadas por seis delegações do CASA – Centro de Apoio ao Sem Abrigo.
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Festas em ano de pandemia, ou a ressurreição dos cabazes de Natal
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