Governo desiste de criar botija de gás solidária a 16 euros para famílias carenciadas
Se o preço solidário para o GPL fosse avante, as famílias mais vulneráveis poderiam pagar 16,13 euros por uma botija de gás butano e 14,64 euros no propano. Em vez de 25 euros, em média.
O Ministério do Ambiente e da Ação Climática admitiu que o projeto-piloto para a criação de um preço solidário para as botijas de gás, tal como previsto por lei desde 2019, afinal “não irá avançar atendendo a que se verificou uma fraca adesão tanto dos municípios quanto dos operadores”, ou seja, das empresas que vendem gás engarrafado em Portugal.
Na lista de entraves que levaram o Governo a deixar cair a criação de uma botija de gás solidária que seria vendida aos beneficiários de tarifa social por menos dez euros (16 euros por garrafa e não 25/26 euros, em média) estão também problemas no armazenamento das botijas por parte das autarquias e na gestão e tratamento contabilístico na relação município-consumidor-operador.
De acordo com o preço solidário para para o gás de petróleo liquefeito (GPL), que todos os meses é publicado pela Entidade Nacional para o Setor Energético (ENSE) no seu site, se o projeto-piloto fosse avante as famílias economicamente vulneráveis poderiam estar a pagar em fevereiro de 2021 apenas 16,13 euros por uma botija de 13 kg de gás butano e 14,64 euros por 11 kg de gás propano.
Neste momento de confinamento em Portugal, e a mando do Governo, os preços das botijas de gás estão fixados pela ERSE: entre 3 e 14 de fevereiro as garrafas de butano de 12,5 kg e 13 kg não podem custar mais de 23,18 euros e 24,10 euros, respetivamente; no propano, uma garrafa de 9 kg custa no máximo 20,27 euros e de 11 kg vale 24,77 euro, informou o regulador. Sem esta medida de controlo, as garrafas de gás custam em média 25 euros em Portugal, segundo dados de dezembro da ERSE.
Questionado pelo ECO/Capital Verde em janeiro sobre o ponto de situação do processo, na sequência de um post da ENSE nas redes sociais (entretanto apagado), sobre o preço solidário do GPL no mês passado, o MAAC confirmou que “o projeto-piloto não se encontra em fase de operacionalização”.
Herdado do anterior secretário de Estado, Seguro Sanches, e apadrinhado pelo ministro do Ambiente e da Ação Climática, Matos Fernandes, e também por João Galamba, na passagem da Energia da pasta da Economia para o Ambiente, o projeto ficou apenas no papel, sem que qualquer protocolo tenha sido assinado entre os sete municípios e as três empresas de gás que em 2019 manifestaram interesse em participar.
“Foram sete os municípios que manifestaram interesse em participar neste projeto-piloto”, voltou a confirmar fonte oficial do MAAC. Já em julho de 2019 o ministro Matos Fernandes dava conta de ter recebido manifestações de interesse de sete municípios (entre eles Vila Real e Penafiel) e três operadores de mercado de GPL para participar no projeto-piloto de criação de uma tarifa solidária para o gás engarrafado. Apesar da fraca adesão, nessa altura o ministro admitia em declarações à Lusa tratar-se de “um bom começo”, com “mais do que um comercializador”.
Cepsa, Galp, Repsol e Rubis foram as empresas que também nessa altura manifestaram interesse em participar no projeto e vender gás engarrafado mais barato às cerca de 800 mil famílias que já beneficiam da tarifa social de eletricidade.
“Para além da fraca adesão dos municípios e comercializadores já mencionada, verificam-se vários constrangimentos práticos que se prendem, nomeadamente com questões de armazenamento das garrafas de GPL num espaço próprio destinado para o efeito, bem como questões de gestão e tratamento contabilístico na relação município-consumidor-operador. Por isso, estão a adotar-se medidas alternativas que logrem com maior eficiência alcançar o mesmo objetivo”, avançou fonte oficial do MAAC ao ECO/Capital Verde.
Mais a curto prazo, o Governo garante que já dotou a ERSE dos instrumentos legais e financeiros para a regulação do setor dos combustíveis. “Isto permite, entre outros, a fixação de tarifas de acesso às infraestruturas de transporte e armazenamento de GPL, bem como um novo regulamento de troca de garrafas de GPL. O efeito destas medidas será a redução de custos, o aumento da concorrência e, portanto, a consequente baixa do preço para os consumidores finais, de forma abrangente”, garante a mesma fonte.
Em Portugal há 2,6 milhões de famílias que dependem do gás em botija, ou seja, dois terços dos lares, sobretudo no interior do país e fora dos grandes centros urbanos. De acordo com a Deco, os consumidores com gás de botija gastam por ano mais 230 euros na fatura de energia do que se tivessem gás natural.
Eletrificação e comunidades de energia são alternativas do Governo para a botija de gás
Logo no início de janeiro de 2021, Matos Fernandes anunciou no Parlamento que o Governo está a elaborar uma Estratégia Nacional para o Combate à Pobreza Energética, que será divulgada em breve.
“Pretende o Governo criar um programa nacional de substituição de equipamentos de uso doméstico a GPL por equipamentos a eletricidade, com enfoque nas famílias mais carenciadas. Estando o programa pensado para as famílias mais carenciadas, estas, por via da substituição do GPL engarrafado por eletricidade, seriam naturalmente elegíveis para a tarifa social de eletricidade, mitigando assim o diferencial de custos que, hoje, existe entre o GPL engarrafado e a eletricidade, e libertando mais recursos dessas famílias para outras necessidades“, explicou fonte do MAAC em resposta ao ECO/Capital Verde.
Além disso, o Governo tem também como objetivo “incentivar a eletrificação dos consumos no setor doméstico, desde que técnica e economicamente viável, com a progressiva substituição de consumos fósseis por consumos de reduzido impacto carbónico”.
O MAAC prevê igualmente que, com o atual regime de autoconsumo e comunidades de energia renovável (CER), as famílias mais carenciadas possam ser enquadradas e beneficiar de energia a custos muito mais acessíveis.
“Já são vários os municípios com projetos para constituição de comunidades de energia, alguns dos quais com o objetivo de incluir famílias carenciadas, pelo que o objetivo também passará por dinamizar e apoiar estas iniciativas a nível nacional”, garante o MAAC.
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