2021 pode ser “ano recorde” para o imobiliário. O que esperar de cada setor?
A pandemia teve um impacto negativo de 22% no investimento imobiliário em 2020 mas, mesmo assim, o ano fechou com valores próximos dos observados em 2019. O que esperar de 2021?
A pandemia teve impacto no imobiliário mas, ainda assim, o setor mostrou-se resiliente. As expectativas são de que 2021 seja melhor do que 2020 em termos de negócio. Embora se olhe para o futuro com uma certa cautela, os especialistas estão otimistas e admitem que este ano possa mesmo ser um “ano recorde” em termos de investimento.
“Chegámos ao final de 2020 com 2.900 milhões de euros, o equivalente a uma quebra de 22% face a 2019”, começou por dizer o diretor-geral da CBRE Portugal esta quinta-feira, durante a apresentação do Real Estate Market Outlook 2021. “Ainda assim, chegámos a níveis muito próximos dos 3.000 milhões de euros esperados no início do ano”, acrescentou Francisco Horta e Costa.
Presente no mesmo evento, o responsável da área de investimento da CBRE afirmou que “Portugal continua claramente no radar dos investidores internacionais” e que “a expectativa é de que 2021 seja um novo ano, se não mesmo um ano recorde” para o setor imobiliário. Contudo, Nuno Nunes notou que, “provavelmente, a nuvem mais densa está relacionada com o financiamento”.
O teletrabalho é o futuro? Opiniões dividem-se
Numa análise por setores, o mercado de escritórios é considerado atualmente o “elefante na sala”, como referiu Francisco Horta e Costa. E, aqui, o principal ponto tem a ver com a adoção do teletrabalho. “Não acredito que o teletrabalho venha a ser adotado de forma compulsiva mas, se isso acontecer, vai acabar totalmente com a cultura empresarial”, diz o responsável da consultora.
André Almada, responsável da área de escritórios da CBRE, concorda e afirma que “o teletrabalho do futuro não vai ser adotado da forma massiva como foi até hoje”, mas que haverá, sim, um “modelo híbrido”, em que os colaboradores poderão escolher um ou dois dias para trabalharem remotamente. Uma opinião diferente tem o responsável da Revolut em Portugal, Ricardo Macieira, que acredita que o teletrabalho “é para manter” e que “o importante é como é que as empresas vão fazer a gestão para que os funcionários continuem motivados”.
Falta de estrangeiros dificulta oferta de habitação
Saltando para o setor residencial, o diretor-geral da CBRE nota que, no início de 2020, se previa um “aumento da oferta de habitação”, mas que isso acabou por não se verificar, dado que “os processos de licenciamento revelaram-se ainda mais morosos”. Patrícia Clímaco, partner da Castelhana, nota que “o mercado residencial tem-se mostrado muito resiliente à pandemia e à falta de apoios do Governo”. E isto porque as “taxas de juro estão baixas”, “a oferta de habitação é baixa” e a “casa tem ganho uma nova importância na vida das famílias”.
Pedro Vicente, administrador da Habitat Invest, sublinha mesmo que “os esforços do setor público não chegam” para reforçar a oferta de casas no país, dado que “as frações [que estão a ser disponibilizadas] são diminutas”. E alerta ainda que “para os privados subsiste a inexistência de apoios”. “O Governo não está disponível para apoiar setor privado na promoção do arrendamento”, afirma.
O mercado mais baixo, sobretudo o da reabilitação, “está a sentir mais o efeito da pandemia porque os estrangeiros” não vêm para Portugal, diz Patrícia Clímaco. “O produto de luxo está com níveis de procura elevadíssimo”, diz a partner da Castelhana. Uma opinião confirmada por José Cardoso Botelho, CEO da Vanguard Properties, que refere o limite que foi aprovado aos vistos gold.
“No mercado médio alto a performance foi bastante boa em 2020. Mas nos segmentos mais baixos e em segunda mão será mais difícil. Talvez no próximo ano as coisas retomem. Para que se consiga desenvolver um grande número de apartamentos para arrendamento é preciso capital, coisa que a maioria das empresas nacionais não tem. Têm de recorrer a capital estrangeiro que, agora, duvidam da estabilidade fiscal em Portugal”, acrescenta.
Retalho “vai demorar algum tempo” a recuperar
Carlos Récio, responsável da área de retalho da CBRE, avisa que “a expectativa é de que a retoma vai demorar algum tempo”. “Para retomarmos os níveis de consumo que tínhamos, a retoma vai demorar mais de um ano”, afirma, notando que a situação dos centros comerciais “tem sido um pouco mais complicada” devido às restrições que têm sido aplicadas pelo Governo.
Dentro deste setor, o diretor-geral da Fnac diz que este é um “momento de grande incerteza” dado que há variáveis desconhecidas, sendo que a maior delas é a “variabilidade económica” no segundo semestre. “Obviamente o online teve um crescimento grande e súbito. E vai continuar a crescer e a ganhar peso, mas vai fazer o seu caminho lentamente”, diz Nuno Luz, acrescentado que para continuar a atrair clientes, o “retalho físico tem de continuar a trabalhar na experiência dentro da loja”.
Miguel Coelho, diretor-geral da Tendam, afirma que a recuperação do retalho “vai depender dos estímulos da Comissão Europeia e da resiliência de cada empresa”, defendendo que “as lojas terão de se adaptar, de se tornar mais flexíveis, de integrarem uma maior dinâmica e mais ferramentas informáticas”.
Logística foi o “setor estrela” do imobiliário em 2020
Cristina Arouca, responsável de research da CBRE, afirma que a logística foi o “setor estrela do imobiliário em 2020”, “mas que é ainda muito dependente do mercado internacional, nomeadamente de plataformas em Espanha”. Antes da pandemia, as empresas já tinham em curso vários processos de restruturação dos armazéns e, neste momento, “procuram estruturas e edifícios cada vez mais próximos dos aglomerados urbanos”, nota Nuno Pereira da Silva, responsável de industrial e logística da consultora.
Dentro deste mercado, responsável de e-commerce dos CTT, nota que se observou “durante 2020 e ainda este ano uma grande transferência das compras do canal físico para o online”. “A logística teve de se adaptar, encontrar novas soluções para o last-mile delivery e, a nível do internacional, houve grandes estrangulamentos nas cadeias de abastecimento devido ao lockdown dos transportes”.
Hotelaria não recuperará das perdas em 2021
Relativamente ao setor hoteleiro, Duarte Morais Santos, da CBRE Hotels, diz que “2021 não permitirá recuperar das perdas de 2020”, dado que “a primeira metade do ano é a pior que tivemos até agora”. “A recuperação acontecerá a diferentes velocidades e arriscaria dizer que no Algarve, conseguindo reduzir significativamente o número de casos, poderíamos ter em 2021 um dos melhores verões de sempre”, nota.
“Estamos a correr contra o tempo para quando o mercado abrir nós sermos os first movers“, afirma Manuel Rito, responsável de marketing do Grupo Selina. Duarte Morais Santos acredita mesmo que os níveis de 2019 “não possam voltar a acontecer antes de 2023 ou 2024”.
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