Tirar o aeroporto do Montijo? Jamais

Governo está a fazer uma encenação para que o PSD o ajude a mudar a lei. Costa faz de conta que está a reconsiderar a opção Alcochete, Rio faz de conta que acredita e ajuda a desbloquear Montijo.

Se dissermos a um piloto de um avião para aterrar em Lisboa, no novo aeroporto, o senhor é capaz de se ver aflito e andar às voltas, tantas são as opções estudadas, tantos foram os avanços e recuos ao longo dos anos.

Só neste século, começámos com a OTA até se perceber que era uma opção muito cara e fora de mão. Foi nessa altura que Mário Lino afirmou que “construir um aeroporto na Margem Sul, jamais”. Foi nessa altura que a palavra ‘jamais’ perdeu toda a sua credibilidade. Um grupo de empresários mandou fazer um estudo e chegou à conclusão que o aeroporto deveria ser em Alcochete.

Ota ou Alcochete? Desempatou o LNEC que fez precisamente uma Avaliação Ambiental Estratégica entre as duas localizações para concluir que o Campo de Tiro de Alcochete era, do ponto de vista técnico e financeiro, mais favorável.

A 10 de janeiro de 2008, José Sócrates anunciava a construção de um novo Aeroporto Internacional de Lisboa. Local: Campo de Tiro de Alcochete. Entretanto, antes de chegar o aeroporto, chegou a crise e chegaram os senhores da troika. Um país que não tinha dinheiro para pagar salários à Função Pública não podia dar-se à veleidade de construir uma obra faraónica.

Já com Pedro Passos Coelho, o Governo vende a ANA aos franceses da Vinci e no pacote inclui a construção do aeroporto complementar do Montijo. Era a opção mais barata: 650 milhões de euros para a reorientação do aeroporto de Lisboa + 500 milhões para transformar a base militar numa base civil e a Força Aérea entrava ainda com 156 milhões para as obras de acesso às duas infraestruturas aeroportuárias.

Os socialistas que uma década antes eram pró-Alcochete herdaram e não enjeitaram a opção Montijo. Para convencer os social-democratas — que antes eram pró-Montijo e agora com Rui Rio não se sabe muito bem o que são — António Costa chegou a dizer que não havia “plano B” ao Montijo. O “plano B ao Montijo é recuar 7 anos e recomeçar do zero agora com a hipótese Alcochete. Isso terá custos muito grandes para a economia do país. Por isso todos devem agir com responsabilidade”, garantia Costa no ano passado, ainda antes da pandemia.

Para que não haja dúvidas que a opção do Governo não mudou com a pandemia, já em setembro último, o primeiro-ministro deixou bem claro: “Não será uma pandemia a alterar um projeto considerado necessário há mais de 50 anos”.

Ontem, assim do nada, o Governo veio dizer que afinal existe um plano B e um plano C ao Montijo. Volta a colocar em cima da mesa a opção Alcochete e anuncia que vai pedir uma Avaliação Ambiental Estratégica entre estas três opções:

  1. A atual solução dual, em que o Aeroporto Humberto Delgado terá o estatuto de aeroporto principal e o Aeroporto do Montijo o de complementar;
  2. Uma solução dual alternativa, em que o Aeroporto do Montijo adquirirá, progressivamente, o estatuto de aeroporto principal e o Aeroporto Humberto Delgado o de complementar; e,
  3. A construção de um novo aeroporto internacional de Lisboa no Campo de Tiro de Alcochete.

O Governo está a fazer bluff. É grave, mas é ainda mais grave se não estiver a fazer bluff e estiver a considerar genuinamente a opção Alcochete. A opção Alcochete não está em cima da mesa: é longe, traz mais problemas de acessibilidades e como disse o próprio Costa seria andar para trás 7 anos. E é uma opção cara: 8 mil milhões de euros com dinheiro dos contribuintes segundo as contas de José Luís Arnaut, da ANA.

Então porque está a fazer o Governo esta encenação? Está a comprar tempo e a comprar votos.

  1. Tempo. Com as previsões da IATA a apontarem para 2025 ou 2026 como o ano de recuperação da Covid no setor aéreo, o Montijo deixou de ser urgente. Sendo uma obra de execução rápida, o operador agradece este tempo que se vai perder na Avaliação Ambiental Estratégica. É mais fácil pagar a obra com taxas aeroportuárias em 2025 do que propriamente com os aeroportos às moscas.
  2. Votos. Os socialistas precisam do PSD para mudar a lei que hoje dá aos municípios da Moita e do Seixal o poder de vetar uma obra que é de dimensão nacional. Mas Rui Rio disse que queria uma Avaliação Ambiental Estratégica e não queria mudar a lei só para responder ao caso concreto da Moita e do Seixal.

Para resolver a este problema, o Governo finge que volta a colocar em cima da mesa a opção Alcochete, o PSD finge que acredita, o PCP (que tem as câmaras do Seixal e da Moita) finge que não está a perceber, e no final a lei é mudada e regressa a opção do Montijo.

Claro que esta estratégia tem um risco: e se a Avaliação Ambiental Estratégica apontar para Alcochete? O que dirá então o Governo? Jamais?

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