Banca cumpre travão. Mais de 90% dos créditos à habitação financia até 90% do valor da casa

Travão ao crédito do Banco de Portugal está a ser cumprido pelos bancos. Ao contrário das regras sobre LTV, os limites à maturidade média do crédito tiveram um desempenho pior na pandemia.

O crédito para comprar casa atinge apenas 90% do valor do imóvel em mais de 90% dos casos, segundo dados do Banco de Portugal. O limite prende-se com as medidas de travão para novas operações de concessão de crédito, que foram implementadas em julho de 2018 com o objetivo de diminuir o risco no mercado nacional. Contudo, as maturidades médias estão a aumentar.

“O ano de 2020 confirmou a tendência observada anteriormente de elevado grau de conformidade com os limites ao rácio LTV [loan-to-value, ou seja o rácio entre o montante do empréstimo e o valor do ativo], destacando-se que são imateriais as operações de crédito à habitação com rácio LTV acima de 90% (em julho de 2018, 22% das novas operações apresentavam um rácio LTV superior a 90%, tendo-se reduzido no quarto trimestre de 2019 para 2% e no quarto trimestre de 2020 para 1%)”, revela o relatório de acompanhamento da recomendação macroprudencial divulgado esta quarta-feira pelo Banco de Portugal.

Cerca de 50% das novas operações de crédito à habitação apresentavam um rácio inferior a 80% e que o montante de novas operações com acima de 100% é nulo. No quarto trimestre de 2020, 58% das novas operações de crédito à habitação própria e permanente tinham um rácio LTV entre 80% e 90%, apesar de concentradas em valores próximos do limite de 90%.

A medida macroprudencial para o crédito às famílias, anunciada em fevereiro de 2018 e implementada a 1 de julho desse ano, recomenda aos bancos que considerem três indicadores de forma cumulativa: a limitação no valor do crédito concedido face à avaliação do imóvel inferior a 90%, a redução da maturidade dos empréstimos para um máximo de 40 anos (que irá passar para 30 anos em 2022) e limite de 50% na taxa de esforço (debt service-to-income ratio ou DSTI na sigla em inglês).

Os limites à maturidade também foram respeitados no caso das novas operações de crédito à habitação. Em dezembro de 2020, mais de 93% das novas operações de crédito à habitação apresentavam uma maturidade entre 20 e 40 anos, sendo este valor repartido em cerca de 31% com maturidade entre 20 e 30 anos e cerca de 69% entre 30 e 40 anos. “As operações com maturidade superior a 40 anos são imateriais”.

No entanto, em termos médios, a tendência de diminuição da maturidade das novas operações de crédito à habitação inverteu-se com a pandemia. No final de 2020 a maturidade média fixou-se em 33,2 anos, um valor superior aos 32,6 anos registados no fim de 2019 e ao limiar de 30 anos previsto para final de 2022.

Durante a pandemia, o Banco de Portugal decidiu aliviar parte destas regras, permitindo que créditos destinados a mitigar situações de insuficiência temporária de liquidez deixem de cumprir, entre outros, com o pagamento regular das prestações, mas acabou por desistir por considerar que não era preciso. “Esta alteração permaneceu em vigor apenas até setembro de 2020, já que, com base na análise de uma amostra de instituições representativas de cerca de 95% das novas operações de crédito a particulares, não foram concedidos novos créditos enquadráveis nesta flexibilização“, diz o relatório.

Bancos foram mais exigentes na pandemia

As novas operações de crédito a particulares caíram em 2020 devido ao choque da pandemia, especialmente no crédito ao consumo (que recuou 17,6%). “Esta contração, que contrasta com a evolução do crédito à habitação, deverá estar associada ao diferente impacto da pandemia por nível de rendimento das famílias“, explica o BdP. Para habitação, houve um aumento de 7,3% face a 2019, “evidenciando a resiliência deste tipo de crédito”.

A procura diminuiu a partir do segundo trimestre de 2020 em ambos os segmentos. No terceiro e quarto trimestres de 2020, verificou-se um comportamento diferenciado com a procura por crédito à habitação a recuperar e a procura de crédito ao consumo a manter-se inalterada.

“A deterioração da confiança dos particulares foi identificada pelos bancos como o principal determinante para a evolução da procura de crédito por parte dos particulares em 2020, apesar da existência de condições de financiamento favoráveis”, aponta o banco central. A taxa de juro média das novas operações de crédito à habitação diminuiu para 0,8% em dezembro de 2020 (face a 1,1% em janeiro) e consumo para 6,1% (de 7%).

“Não obstante a diminuição da taxa de juro das novas operações, os bancos reportaram uma maior restritividade das condições de concessão de crédito (em particular em relação às garantias exigidas e ao rácio LTV) durante o segundo trimestre de 2020. Esta restritividade manteve-se durante o segundo semestre 2020. Esta evolução traduziu-se num aumento da proporção de operações rejeitadas, quer no segmento de crédito à habitação quer no crédito ao consumo”, explica.

Rácios de capital ganharam 0,74 pontos percentuais com medidas

Passados dois anos desde a implementação da medida macroprudencial, o Banco de Portugal calculou pela primeira vez o impacto para a banca, que diz estar a ganhar com o travão, em termos de qualidade dos ativos. “Verifica-se um impacto positivo da medida macroprudencial sobre o rácio de capital do sistema bancário. Mais especificamente, o modelo micro-macro integrado sugere um aumento de 0,74 pontos percentuais do rácio de capital do sistema bancário resultante da medida”, diz o relatório.

A introdução da medida macroprudencial conduz a uma redução das perdas em operações de crédito, no cenário com medida face ao cenário sem medida. Adicionalmente, a introdução da medida conduz a uma redução dos ponderadores de risco para crédito garantido por imóveis residenciais e a uma redução da concessão de crédito aos mutuários de maior risco, dado que os critérios de concessão de crédito se tornam mais restritivos.

“Esta análise sugere, assim, que a medida macroprudencial aumenta a resiliência das famílias e do sistema bancário, contribuindo para a redução do risco dos mutuários e a resiliência das instituições de crédito”, acrescenta o Banco de Portugal.

(Notícia atualizada às 13h10)

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