O rent-a-car também foi travado pela pandemia, mas começa a percorrer os primeiros quilómetros da recuperação. A crise dos chips fez disparar o preço do aluguer de um carro, diz a Europcar.
A crise dos chips tem afetado severamente o setor automóvel. E as empresas de aluguer de automóveis, que precisam de grandes volumes de carros, não escaparam. Querem renovar as frotas para responder à crescente procura, numa altura em que o turismo começa a recuperar, mas não têm como. Em entrevista ao ECO, o diretor-geral da Europcar explica como a falta de carros levou a um aumento dos preços. Alugar um automóvel hoje é cerca de 100 euros mais caro do que no verão passado, diz Paulo Moura. “Os preços acabam por subir, até mais do que o normal”, nota.
Como evoluiu o negócio de aluguer de automóveis desde que a pandemia começou?
Temos o negócio segmentado em duas áreas. Uma é o negócio mais corporativo, relacionado com as empresas, seguradoras, etc., que mostrou ser mais resiliente durante a pandemia, com quebras inicialmente significativas, especialmente no primeiro confinamento, que foi muito radical. Mas recuperou logo quase de imediato parte da atividade e desde há alguns meses voltou para próximo dos volumes pré-pandemia. Depois temos o segmento que tem a ver com o turismo e algum negócio de proximidade. Esse teve uma quebra enormíssima e tem demorado muito mais a recuperar. O corporativo tem-nos ajudado bastante a ultrapassar este período difícil e no lazer só agora começamos a ver uma recuperação.
E receberam apoios durante este tempo todo? Foram suficientes?
Os apoios foram essencialmente dois. Um deles foi o lay-off simplificado, que foi um bom instrumento. Numa primeira fase, o Governo teve uma boa ação, foi rápido e implementou uma medida que era essencial. E a questão das moratórias de crédito também foi muito importante. Mas, além disso, para o nosso setor, pouco ou nada mais [houve de apoios]. Nós somos uma multinacional e, comparando com os sucessivos apoios que as nossas subsidiárias no resto da Europa receberam, nós não recebemos nem uma fração. Foi de facto muito difícil.
A Europcar cá é considerada uma grande empresa e está fora de todos estes apoios. Pessoalmente é um bocadinho mais ideológico, mas pronto, é o que é. Ignora-se que as grandes empresas são os grandes empregadores.
Que tipo de apoios considera que faltam?
Apoios a fundo perdido. Também houve outras linhas de apoio para o setor, mas em Portugal todas as linhas que se criaram estavam muito dirigidas a pequenas e médias empresas. A Europcar cá é considerada uma grande empresa e está fora de todos estes apoios. Pessoalmente é um bocadinho mais ideológico, mas pronto, é o que é. Ignora-se que as grandes empresas são os grandes empregadores. Mas é muito difícil para as médias e grandes empresas a vida em Portugal.
E 2021? Está a ter um melhor desempenho?
No negócio de proximidade houve, de facto, uma procura crescente de serviços, sobretudo na oferta de alugueres de média e longa duração. Numa primeira fase, as pessoas tinham mais receio de usar os transportes públicos e quem não tinha carro recorreu ao carro privado. E isso tem-se mantido, é uma tendência. Achamos que há uma apetência para esse tipo de oferta e essa foi uma das apostas do grupo.
Querem reforçar a vossa frota. Estamos a falar de quantos veículos?
Poderíamos ter umas centenas a mais, não sei dizer exatamente quantas. Mas se houvesse frota disponível, teríamos comprado mais algumas unidades.
“Se houvesse frota disponível”. Porquê? Estão a ter dificuldades em comprar carros por causa da crise dos chips?
Sim, sem dúvida. É um problema global. A crise dos semicondutores tem condicionado a produção de veículos automóvel. Houve aqui um duplo impacto no nosso setor: numa primeira fase da pandemia, todos os operadores procuraram reduzir significativamente a frota. Portanto, vendemos boa parte da nossa frota ou devolvemos aos fabricantes, dependendo do tipo de acordos. Reduzimos imenso a nossa frota.
Com a gradual retoma da atividade, temos um plano de entrada de frota que estava programado, mas dá-se a coincidência da crise dos semicondutores e da redução de produção de viaturas por parte dos fabricantes que tem condicionado muito o mercado. Neste momento há dificuldade em adquirir frota. Portugal não está particularmente afetado, mas ainda assim, se fosse possível, gostaríamos neste momento de ter mais algumas centenas de carros. E isso está a ter, naturalmente, impacto no mercado, porque os preços acabam por subir, até mais do que o normal.
Portugal não está particularmente afetado [pela crise dos chips], mas ainda assim, gostaríamos de ter mais algumas centenas de carros. E isso está a ter, naturalmente, impacto no mercado, porque os preços acabam por subir, até mais do que o normal.
Querem apostar numa frota mais elétrica? Sentem que há procura por esses carros? Sai mais caro?
Procura, há alguma, mas ainda é muito reduzida. Há um aumento, mas estamos a partir de uma base muito baixa. Agora, a mobilidade elétrica é uma tendência que parece não ter retorno. Todos os fabricantes estão a apostar forte nisso. No nosso país, temos ainda uma lacuna muito grande em termos de infraestruturas, porque há uma clara falta de postos de carregamento. Na realidade, o aumento da frota elétrica, percentualmente, tem aumentado muito, partindo de uma base muito baixa. Cerca de 200 a 300 dos nossos carros são elétricos (devemos ter cerca de 18 mil carros no total).
Neste momento ainda é mais caro. Obviamente que a utilização é mais económica, porque o carregamento é mais barato do que combustível. Mas os elétricos ainda são mais caros. Mas a tendência é que, obviamente, com o aumento da produção, hão de ser mais competitivos em termos de preços.
Referiu que “os preços acabam por subir”. É mais caro alugar um carro hoje?
Sim, mas creio que tem a ver com a escassez. São as leis normais da oferta e da procura. Há uma procura crescente — não está ainda aos níveis de 2019 — mas as frotas também não estão. Nem de perto nem de longe. Temos uma frota cerca de 40% ou 50% abaixo de 2019 e a procura já recuperou um pouco mais que isso para o pico do verão, durante esse período os preços estão elevados. Estão ao nível ou acima dos máximos.
Há um aumento dos preços generalizado, não só no Porto, Lisboa, Faro e ilhas. É generalizado. Mas neste momento em particular, onde se praticam os preços mais altos talvez seja nas ilhas. São as zonas que recuperaram mais rapidamente. Isso tem muito a ver com a questão das regras e das restrições que os turistas têm. Há uma procura muito grande e os preços estão, sem dúvida, elevados. No continente o aumento foi um pouco menor. E no Algarve ainda está um pouco morno, não sabemos se vai recuperar.
Mas quanto é que custa alugar um carro hoje em dia?
Depende muito do tipo de carro e da semana. Se for uma semana na época super alta (entre 15 de julho e 15 de agosto) um carro pequeno pode custar entre 500 a 600 euros por semana. Mais ou menos por aí, mas há exceções. Em 2019, se calhar, custava menos uns 100 euros, é uma diferença substancial.
Que nacionalidade é que mais vos procuram?
Historicamente, sobretudo ingleses, alemães e franceses. E outros mercados mais pequenos, como a Bélgica, Suíça, Itália e Espanha.
As reservas estão ainda bastantes baixas. É uma tendência que vem de há um ano e meio, desde o início da pandemia. Acontecem muito mais em cima da hora.
Como estão as reservas para o verão?
As reservas estão ainda bastantes baixas. É uma tendência que vem de há um ano e meio, desde o início da pandemia. Acontecem muito mais em cima da hora. Continuamos hoje ainda a verificar que na própria semana ou na anterior cai um número elevado de reservas, mas no pipeline ainda não há um numero significativo. E isto dificulta o planear da atividade. Mas é algo com que temos de lidar. As pessoas reservam mais em cima da hora, face à incerteza, e as regras estão constantemente a mudar. Ainda há algum receio.
Que percentagem dos vossos carros está alugada?
Como disse, as reservas vêm muito em cima da hora. Neste momento ainda não entrou a frota toda que planeamos para o verão e ainda temos alguns milhares de carros para receber. Mas em percentagem da frota, as reservas ainda estão bastante baixas olhando para a frente. Em agosto ainda não temos sequer 50% das reservas que planeamos vir a ter, porque chegam muito em cima da hora. É uma tendência do mercado. Normalmente, até 2019, as pessoas reservavam com bastante antecedência e tínhamos um pipeline muito maior.
Também o vosso negócio sofre com as decisões – e recuos – dos países no que toca aos corredores aéreos?
Muitíssimo. Quando a Alemanha decretou a nossa passagem para zona de risco, tivemos imediatamente uma catadupa de cancelamentos. Praticamente todos os que tinham reservas para as semanas seguintes cancelaram. Isso tem um impacto muito grande. Agora as coisas estão um bocadinho mais estáveis, há um entendimento com o passaporte digital e isso começa a facilitar. Creio que será um dado importante para a recuperação da atividade.
Mas quando passámos ao “corredor verde” do Reino Unido, nessa semana crescemos até mesmo em relação a 2019, o que revela que há uma grande vontade das pessoas em viajar. Mas é claro que da mesma maneira que crescemos, quando passamos depois para a zona “âmbar”, também houve na mesma medida cancelamentos. É imediato. É, de facto, relativamente rápido, quase instantâneo. No dia seguinte já estamos a ver os efeitos dessas medidas.
Está confiante na recuperação do setor? Quando?
Estou confiante de que vai recuperar. Totalmente? Possivelmente só em 2023 é que voltaremos aos níveis de 2019. Vai ser uma recuperação gradual. Mas não há razão para que 2021 seja pior do que 2020. O verão vai ser um pouco melhor do que 2020, mas se as coisas se mantiveram. Se se tomarem medidas de limitar a circulação e fechar restaurantes, isso pode deitar tudo por terra.
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Crise dos chips faz subir preços no rent-a-car. “Custava menos 100 euros alugar um carro” antes da pandemia
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