Desconfinamento está a travar aumento da fatura no supermercado
Em julho vendeu-se menos bebidas nos super e hipermercados, em contrapartida as vendas de produtos de higiene pessoal subiram 5%.
O fim do ano escolar, a entrada em férias e uma maior mobilidade dos portugueses já estão a ter impacto nas vendas de bens de consumo nos super e hipermercados. Em julho vendeu-se mais 814 milhões de euros em relação a junho, elevando para 5.601 mil milhões de euros os bens de consumo vendidos nos primeiros sete meses do ano. Mas foi uma subida mais branda de 2,4% (e mais 131 milhões de euros) face a 2020, quando o setor registava um crescimento de 9,6%, e abaixo dos 2,7% que o setor registava no primeiro semestre. Em julho vendeu-se menos bebidas, mas em contrapartida as vendas de produtos de higiene pessoal subiram 5%, segundo os dados scantrends, da Nielsen IQ, a que o ECO teve acesso.
“Mesmo com as limitações colocadas pelas medidas sucessivas impostas pelo Governo, o aumento da mobilidade e a reabertura da restauração desde o início de abril motivaram a transferência de uma parte do consumo no lar para o consumo fora de casa, o que significa algum retrocesso comparativo nas compras no retalho alimentar”, explica Pedro Pimentel, diretor-geral da Centromarca.
“Julho marca o final do ano escolar para os mais novos, o início do período de férias para muitas famílias e com condições climatéricas mais favoráveis, um convite a uma vida passada mais no exterior e à realização de um maior número de refeições fora de casa”, destaca ainda o responsável da Centromarca, lembrando que essa desaceleração dos gastos no super já vinha a ocorrer desde março.
Higiene pessoal a categoria mais dinâmica
A compra de produtos alimentares continuou a crescer, entre 21 de junho a 18 de julho, segundo os dados da NielsenIQ, uma subida de 1,1% – há um ano o crescimento era de 5,5% -, mas é a categoria de higiene pessoal a mais dinâmica neste período: um crescimento de 5%, tanto nas marcas de distribuição (+12,6%), como nas de fabricante (+2,3%).
“Muitas das famílias de produtos que compõem a categoria de higiene pessoal viram as suas vendas especialmente penalizadas ao longo de 2020 e em especial nos períodos de confinamento e também por força da menor mobilidade (teletrabalho, aulas à distância)”, refere Pedro Pimentel.
“Produtos como cosmética, cremes corporais, protetores solares e tantos outros tiveram, em 2020, retrocessos fortíssimos das suas vendas face aos anos anteriores, pelo que é natural que o progressivo desconfinamento, o regresso a aulas presenciais e ao trabalho nas empresas e uma vida mais ‘exterior’, promovam um regresso à compra destes produtos, em especial a partir do início do processo de regresso progressivo à normalidade, em abril último”, justifica.
Em contraciclo está a venda de bebidas – que apresenta um recuo de 2%, com as marcas de fabricante a cair 2,7% e as dos super a recuar 1,2% – e as de produtos de higiene do lar que, em julho, diminuem 1,2%. “O destaque nesta categoria vai para as marcas de distribuição, que aumentam 6,5% contra um decréscimo de 4,8% das marcas de fabricante, invertendo a tendência do período homólogo”, aponta a NielsenIQ.
Crescimento das marcas do super
Nas várias categorias é claro que as marcas de distribuição estão a ganhar espaço no cabaz de compras dos portugueses. Evidência da quebra do rendimento das famílias ou da aposta das cadeias nesta oferta? “Não obstante já serem visíveis diversos sinais que apontam para a quebra de rendimentos de muitos agregados familiares, o que, obviamente, terá consequências a nível de consumo, parece legítimo considerar que o crescimento das marcas de distribuição resulta, nesta altura, da atenção e opções tomadas pelas diferentes insígnias”, considera Pedro Pimentel.
“O crescimento da presença no mercado nacional – seja a nível do número de lojas, seja a nível de quotas de mercado – das chamadas cadeias de soft e hard discount, de que são exemplos a Lidl, Aldi, Mercadona ou Minipreço, motiva desde logo o crescimento da quota global das marcas de distribuição”, aponta.
“Quando um consumidor deixa de fazer as suas compras numa insígnia convencional (em que a quota de vendas de marcas de distribuição ronda os 35-40%) e transfere o seu consumo para uma loja de hard discount (com quota de vendas de marcas de distribuição superior a 70%), a probabilidade de comprar mais produtos das cadeias aumenta exponencialmente”, exemplifica o responsável da Centromarca.
“Não apenas porque isso representa um fator adicional de atração e fidelização dos consumidores, mas também porque há, nesta altura, uma fortíssima atenção dos principais retalhistas aos movimentos de cadeias como Lidl ou Mercadona, todas as restantes insígnias, a começar logicamente pelas duas líderes do mercado nacional, estão a colocar o seu foco no lançamento e, especialmente, na comunicação dos seus lançamentos a esse nível, ‘empurrando’ o consumidor para as suas marcas próprias”, acrescenta.
Impacto da “libertação” no retalho
Com as novas fases de desconfinamento foram anunciadas medidas para o retalho, como o fim da limitação de horários. Que efeito já está a ter no setor, em particular no não alimentar, fortemente fustigado com o impacto da pandemia?
“Com o alargamento de horários, já se nota uma melhoria no tráfego em lojas em virtude de mais opções para os consumidores, que sempre defendemos. Mas estamos ainda muito longe dos níveis dos anos anteriores e há segmentos que tardam em recuperar, de onde a moda será o exemplo mais paradigmático”, refere Gonçalo Lobo Xavier, diretor-geral da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED). “Temos de ter níveis de confiança maiores nos consumidores e a segurança de que não vamos ter mais surpresas com outras medidas de combate à pandemia e que possam ter impacto no setor.”
Depois de o retalho especializado fechar o ano passado com uma quebra de 17,7%, para pouco mais de 7 mil milhões, em contraciclo com o alimentar (uma subida de 8,1%, para 15,6 mil milhões de euros), segundo dados do Barómetro de Vendas de 2020 da APED), quais as estimativas para 2021, completada já mais de metade do ano?
“O retalho alimentar continua com níveis de crescimento interessantes mas os nossos associados do retalho especializado ainda estão a recuperar de vários meses de restrições e de níveis de tráfego baixo”, diz Gonçalo Lobo Xavier. “Esperamos que com o fim das restrições e com mais confiança na economia e nos consumidores o último quadrimestre do ano seja de recuperação sustentada para estas áreas de negócio para quem, os últimos meses do ano são fundamentais para fechar o ano com contas equilibradas”, acrescenta o responsável da APED sem apontar estimativas.
“Julgamos que o retalho não alimentar irá progressivamente melhorando as suas taxas de crescimento e não obstante o fortíssimo impacto do confinamento de janeiro-março fechará o ano em terreno positivo”, estima Pedro Pimentel.
Otimismo que não se estende ao retalho alimentar. Aqui, diz, “a tendência é potencialmente inversa”. E explica porquê. “Depois de um primeiro trimestre de evolução muito positiva (período de confinamento em 2021 vs um trimestre quase integralmente em situação de pré-pandemia em 2020), há uma notória desaceleração a partir de meados de março que coloca, ainda assim, o total do ano já decorrido (neste caso até final de julho) com um crescimento ligeiro (+2,4%)”, aponta.
“Os fatores de desaceleração – mobilidade, ‘desobrigação’ no teletrabalho, aumento do consumo fora-de-casa – tenderão a manter-se nos próximos meses, caso não haja nenhum retrocesso no contexto de saúde pública e nas medidas limitantes associadas à pandemia, pelo que é razoável pensar que o ano – no retalho alimentar – fechará a um nível inferior à taxa de crescimento atual”, conclui.
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