Regulação e Empreendedorismo

  • Luís Neto Galvão
  • 13 Fevereiro 2017

A regulação da privacidade que temos, assegurada pela Comissão Nacional de Protecção de Dados, sofre de uma crónica escassez de recursos, que a tem impedido de dar resposta adequada aos desafios.

Estou convencido de que um dos factores mais importantes e ao mesmo tempo menos visíveis no desenvolvimento de um ecossistema favorável ao empreendedorismo é a qualidade da regulação tecnológica.

Num país pequeno, aberto e com aguda escassez de recursos, o Estado deve concentrar-se na remoção de obstáculos e na criação de um ambiente previsível e favorável ao desenvolvimento de projetos. Será tanto mais bem-sucedido nesse objetivo quanto melhor qualidade tiver a regulação independente.

Desde logo, a regulação das comunicações teve um contributo significativo para o florescimento de empreendedorismo de base tecnológica.

Veja-se, a este respeito, a nossa penetração de acessos em banda larga por fibra ótica, que é hoje em dia uma das mais importantes da OCDE.

Ao longo da última década, a ANACOM promoveu com sucesso o investimento em fibra e em redes de banda larga com grande capilaridade. Foi essa capacidade, aliada a um quadro legal e regulatório favorável, que esteve na base do surgimento de um cluster de exportadores de serviços tecnológicos em outsourcing e de centros de serviços partilhados que tem hoje um papel muito relevante na economia portuguesa.

Este fator terá sido também relevante para o quinto lugar alcançado recentemente por Lisboa, depois de Berlim, Londres, Amesterdão e Barcelona, no ranking das cidades com um ambiente mais favorável para a localização de uma startup, segundo um relatório recente (http://www.startupheatmap.eu/analytics) da European Startup Initiative.

É interessante notar que para esta classificação, obtida a partir do voto de empreendedores, não foi determinante o acesso a financiamento, apontado como crónica limitação de qualquer projeto de empreendedorismo desenvolvido em Portugal.

Os fatores principais tidos em conta foram antes a existência de talento altamente qualificado e de um ecossistema favorável ao desenvolvimento de projetos de empreendedorismo.

Uma iniciativa como o Simplex dá também um contributo relevante para esse ecossistema, ao alterar significativamente para melhor a interação dos cidadãos com a Administração Pública e em certa medida incorporar também inovação trazida por projetos de empreendedorismo na administração do Estado (veja-se o Startup Simplex).

É um exemplo bem ilustrativo de como é possível aos poderes públicos terem um impacto muito positivo no crescimento económico com um mínimo dispêndio de recursos.

Uma área onde é fundamental existir uma “regulação” adequada é a da privacidade e proteção de dados.

Tenho a nítida percepção que se não conseguirmos a este nível uma regulação eficaz, previsível, informada e célere poderemos ver escapar para outras jurisdições projetos de empreendedorismo cuja viabilidade depende de uma adequada estratégia em matéria de privacidade.

Entre estes, contam-se projetos na área da Internet das coisas (IoT), do Big Data, dos pagamentos e Fintech, projetos de base cloud, na saúde e bem-estar, onde se tratam dados de localização, ou projetos que envolvam tracking online, bem como a anonimização e pseudonimização de dados pessoais.

Em todos eles, em maior ou menor medida, a respectiva viabilidade está assente numa adequada proteção dos dados pessoais de cidadãos.

A regulação da privacidade que temos, assegurada pela Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD), sofre de uma crónica escassez de recursos, que a tem impedido de dar resposta adequada aos enormes desafios com que se depara. Com o novo regime jurídico que entra em vigor em Maio de 2018, irá perder uma receita significativa.

Urge que os poderes públicos compreendam isto e façam o necessário para evitar que um défice de regulação nesta área tenha um impacto muito negativo nas aspirações do país em ser um player de grande relevo em projetos de empreendedorismo de base tecnológica.

Nota: Caso tenha questões que gostasse de ver esclarecidas ou temas que gostasse de ver abordados envie o seu e-mail para startups@eco.pt.

O autor, por opção, escreve de acordo com a grafia antiga

  • Luís Neto Galvão

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