Sem a bazuca europeia, despesa pública diminui em 2022 face a 2021, diz CFP
O Conselho das Finanças Públicas (CFP) avisa na análise ao Orçamento que a despesa primária apresentará no final de 2022 um acréscimo de 3,4 pontos percentuais do PIB face ao pré-pandemia.
É uma análise a uma proposta de Orçamento do Estado para 2022 (OE 2022) que poderá chumbar já esta quarta-feira, a confirmarem-se os anúncios de voto contra do PCP e do Bloco. O Conselho das Finanças Públicas (CFP) endossou as previsões macroeconómicas do Governo, mas deixa vários avisos sobre o futuro. Entre as conclusões está o facto de, se expurgado o efeito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), a despesa pública vai descer em 2022, face a 2021. Porém, o peso da despesa primária continuará significativamente acima do pré-pandemia.
“Excluindo o impacto do PRR, a despesa pública deverá registar uma diminuição de 842 milhões de euros (-0,8%) face a 2021, influenciada pelo efeito decorrente da eliminação da maior parte das medidas COVID-19“, escreve a entidade liderada por Nazaré Costa Cabral na análise à proposta de Orçamento do Estado para 2022 (OE 2022) divulgada esta segunda-feira, referindo que a retirada gradual das medidas de emergência resulta numa redução de 5.037 milhões de euros de despesa pública face a 2021.
Apesar deste efeito ajudar o Governo a baixar os gastos do Estado e a diminuir o défice orçamental, o Conselho das Finanças Públicas deixa um alerta semelhante ao que tinha sido feito pelo governador do Banco de Portugal e ex-ministro das Finanças, Mário Centeno, no início deste mês: as contas públicas vão sair da pandemia estruturalmente piores. “Uma comparação com o ano de 2019 revela que mesmo removendo da despesa os one-off, o impacto do PRR e as ‘medidas de emergência’ a despesa primária [excluindo os juros da dívida] prevista para 2022 situar-se-á 3,4 pontos percentuais do PIB acima do valor pré-pandemia“, calcula o CFP, o que corresponde a um acréscimo superior a seis mil milhões de euros.
No início deste mês, Centeno tinha dito que “para o mesmo nível de atividade, temos um peso da despesa retirando todos os efeitos das medidas Covid, one-off e tudo o que é financiado por fundos europeus, um rácio da despesa primária corrente 1,8 pontos percentuais superior ao de 2019″. A diferença entre os valores do Banco de Portugal e do Conselho das Finanças Públicas deverá estar a consideração da proposta do Orçamento, a qual não estava disponível no início deste mês.
De acordo com o CFP, a maior parte desse acréscimo (dois pontos percentuais) corresponde às “componentes mais rígidas” do Orçamento, “designadamente as despesas com pessoal e as prestações sociais”. “Este incremento do peso de despesa rígida ocorre no contexto em que se prevê para o final de 2022 um PIB em volume 1,3% acima do nível de 2019 (e um PIB a preços correntes de 5,5%, mais elevado do que antes da pandemia)”, acrescentam os especialistas em finanças públicas para dar ideia da dimensão deste acréscimo de despesa.
A proposta do OE2022 em si, além do que já vem do passado, implica um aumento de 1.700 milhões de euros da despesa pública com pessoal (salários da função pública) e prestações sociais. Ainda assim, o peso da despesa pública no PIB (incluindo o PRR) desce de 49,1% em 2021 para 46,7% em 2022 graças “exclusivamente” ao crescimento nominal de 6,9% da economia. A carga fiscal deverá baixar de 35% do PIB em 2021 para 34,2% do PIB em 2022, confirma o Conselho.
Nas contas do CFP, a política orçamental planeada para 2022 — a qual está em causa por causa do esperado chumbo no Parlamento — é “expansionista pro-cíclica” ao desagradar o défice estrutural numa décima em 2022 para os 3% do PIB. Porém, “a vertente expansionista da política orçamental é intensificada pelo PRR que permite imprimir à economia um estímulo direto superior a 1% do PIB que não se reflete no agravamento do défice”, notam os especialistas em finanças públicas.
CFP deixa alerta sobre a inflação
Apesar de endossar as previsões do Governo, o Conselho das Finanças Públicas faz um conjunto de avisos à navegação para o próximo ano, entre eles a capacidade de execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e o surgimento de uma variante da Covid-19 resistente às vacinas administradas. Se o Governo tiver de resgatar as medidas de apoio à economia, tal deverá degradar o saldo orçamental no próximo ano, ainda que haja uma dotação orçamental de 400 milhões de euros para fazer face a imprevistos da pandemia, tal como existia no OE2021.
O CFP nota ainda que, no caso de uma situação pandémica agravada, como já se vê noutros países (o que prejudica a procura externa que incide sobre a economia portuguesa), poderá tornar “insuficiente” o apoio financeiro previsto para 2022 à TAP. O mesmo risco é identificado para o Novo Banco: não há nenhuma verba prevista no OE2022, mas o Conselho recorda que a “instituição financeira poderá ainda solicitar um montante até 597 milhões de euros”.
“Assinala-se ainda os riscos associados à eventual ativação das garantias do Estado concedidas no âmbito de algumas das medidas de resposta à crise pandémica (linhas de crédito) e às moratórias de crédito concedidas pelos Bancos aos agentes económicos”, recordam os especialistas em finanças públicas. Na proposta do OE2022, o Ministério das Finanças assume que apenas haverá uma perda de cerca de 100 milhões de euros no próximo ano relacionada com a ativação de garantias estatais.
Ainda mais prejudicial para a economia seria uma evolução da inflação diferente da que é prevista pelos bancos centrais. “A subida dos preços externos de combustíveis fósseis e de matérias-primas, do custo de transporte e distribuição com impacto negativo na capacidade produtiva interna podem induzir uma maior e persistente subida de preços do que considerado nas mais recentes previsões económicas“, alerta o CFP, entidade que têm uma previsão para a taxa de inflação (1,6%) de 2022 bem superior à do Governo (0,9%).
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