Holandeses da Heerema saem da Jerónimo Martins com mais-valia de 1.100 milhões em 14 anos
A Heerema ganhou 401,5 milhões quando vendeu 5% da Jerónimo Martins em 2013. Agora vendeu mais 5% e registou uma mais-valia de 500,6 milhões. Em 14 anos, encaixou mais 198 milhões em dividendos.
Quando o Banco Privado Português (BPP) alienou 15% do capital da Jerónimo Martins, em 2007, a dona do Pingo Doce perdeu um acionista incómodo – a relação entre João Rendeiro e Alexandre Soares dos Santos passava por uma fase complicada – e ganhou um acionista silencioso e discreto. A Heerema aplicou 241,7 milhões de euros na compra de 10% da Jerónimo Martins JMT 0,28% há 14 anos. O investimento resultou num verdadeiro “jackpot” para a firma holandesa ligada ao setor do petróleo, que abandonou agora o capital da Jerónimo Martins com uma mais-valia total de 1.100 milhões de euros.
A sua subsidiária Asteck concretizou, esta segunda-feira, a venda dos últimos 5% no capital da Jerónimo Martins, aproveitando o bom desempenho das ações, que negoceiam em máximos históricos. Já tinha sido assim em 2013, quando a firma holandesa alienou metade da posição quando as cotações estavam no pico.
Mas comecemos pelo princípio. A Heerema entrou na Jerónimo Martins em fevereiro de 2007, numa altura em que a crise financeira global estava à porta e o BPP a um ano do declínio. Na venda de 15% da Jerónimo Martins, João Rendeiro apurou uma mais-valia acima de 200 milhões de euros. Mas perdeu a oportunidade de realizar um ganho muito superior. A Jerónimo Martins estava a consolidar a recuperação da crise que atravessou com a aventura mal-sucedida no Brasil e que tinha deixado a companhia à beira da falência. A Heerema, que nasceu há mais de 70 anos na Venezuela, comprou as ações a 19,20 euros, um preço de entrada que dias depois ajustou para 3,84 euros devido ao stock split realizado pela cotada.
O sucesso com a alteração de estratégia do Pingo Doce e, sobretudo, o crescimento acelerado da Biedronka na Polónia, levou as ações da Jerónimo Martins a atingirem os 10 euros em setembro de 2010. O investimento da Heerema já tinha duplicado de valor, mas a companhia holandesa só iria cristalizar parte do investimento quando, em maio de 2013, as ações atingiram um máximo histórico acima de 18 euros. Na altura, vendeu metade da posição, a 16,6 euros por ação, realizando um encaixe de 522 milhões de euros. E uma mais-valia de 401,5 milhões de euros (tendo em conta o preço a que as ações foram compradas em 2007).
O desempenho das ações nos meses seguintes indicava que a Heerema tinha errado em não se desfazer logo de toda a posição. Os títulos regressaram abaixo dos 10 euros no final de 2014. Recuperaram depois, mas em 2019 estiveram de novo perto dessa fasquia. Durante todo este tempo a firma dos petróleos com sede na Holanda manteve o estatuto de segundo maior acionista da Jerónimo Martins. Sempre de forma discreta e, pelo menos publicamente, sem pressão sobre a administração liderada por Pedro Soares dos Santos. A Heerema esperou por outro pico nas ações para colocar um ponto final no investimento de sucesso na Jerónimo Martins. No início desta semana colocou 31,4 milhões de ações junto de investidores institucionais, a 19,75 euros cada uma. Encaixou 621,4 milhões de euros e apurou uma mais-valia de 500,6 milhões de euros (as ações agora vendidas tinham custado 120,8 milhões em 2007).
Segundo os cálculos do ECO, a Heerema obteve uma mais-valia bruta 902 milhões de euros nos dois momentos de venda dos 10% que tinha comprado há 14 anos. A este valor há que somar os dividendos que a Jerónimo Martins pagou todos os anos. Foram mais 198,4 milhões de euros (ilíquidos de impostos). Contas feitas, a companhia holandesa sai da Jerónimo Martins com um ganho total bruto de 1.100 milhões de euros. Um retorno acima de 400%.
No pódio do PSI-20
Uma parte considerável dos ganhos deve-se ao bom desempenho registado pela Jerónimo Martins em 2021. A retalhista (tal como a Sonae) é uma das estrelas da bolsa portuguesa este ano, com uma valorização superior a 50% tendo em conta os máximos históricos fixados antes de perder o segundo maior acionista. No PSI-20 só os CTT sobem mais desde o início do ano.
Os bons resultados a nível global, alicerçados por um crescimento robusto na Polónia (onde continua líder) e um EBITDA positivo nas operações na Polónia (onde entrou em 2013), bem como a atratividade do setor numa altura de reabertura das economias no pós-pandemia, justificam a performance das ações. A capitalização bolsista acima de 13 mil milhões de euros também dá um lugar no pódio entre as maiores cotadas portuguesas (só a EDP e EDP Renováveis têm um valor de mercado superior).
Esta terça-feira as ações afundaram mais de 10%, reagindo ao desconto de 8,6% que a Heerema aplicou na venda do pacote de ações. O CaixaBank BPI assinalava (antes da abertura da sessão desta terça-feira) que as ações tinham chegado ao seu preço-alvo (21,60 euros), o que “limitava a capacidade, em termos fundamentais, para a cotação continuar a apresentar um desempenho superior” ao setor.
Os momentos da Heerema na Jerónimo Martins
A Heerema tem as suas origens numa pequena construtora criada em 1948, na Venezuela, que se especializou no fabrico e instalação de plataformas de exploração petrolífera para companhias que operavam no Lago Maracaibo. Hoje está presente sobretudo no Mar do Norte, com escritórios em 10 países e mais de 2 mil trabalhadores. É dona dos maiores navios do mundo de transporte de infraestruturas de exploração de petróleo offshore.
Em baixo, estão os (poucos) momentos de destaque da empresa no capital da Jerónimo Martins:
23 de fevereiro de 2007 – A Asteck comprou 12.585.900 ações da Jerónimo Martins ao BPP de João Rendeiro, ficando com 10,01% do capital. As ações foram compradas a 19,20 euros cada uma (segundo uma notícia do Diário Económico), pelo que a firma holandesa efetuou um investimento de 241,6 milhões de euros. O BPP encaixou 362 milhões de euros com a venda de 15%.
31 de maio de 2007 – Jerónimo Martins multiplicou o número de ações por cinco, com a ação a ajustar em conformidade. A Asteck passou a deter 62.929.500 ações da Jerónimo Martins. O preço de compra de cada ação ajustou para 3,84 euros.
13 de maio de 2013 – A Asteck vendeu 31.464.750 ações da Jerónimo Martins (5% do capital). Os títulos foram vendidos a 16,60 euros cada um, o que resultou num encaixe de 522,3 milhões de euros. A mais-valia totalizou 401,5 milhões de euros, com a empresa holandesa a mais do que triplicar o investimento efetuado seis anos antes com a compra desta posição (120,8 milhões de euros).
15 de novembro de 2021 – A Asteck alienou os restantes 5% da Jerónimo Martins por 621,4 milhões de euros, a 19,75 euros por ação. As 31,4 milhões de ações agora vendidas tinham custado 120,8 milhões de euros há 14 anos, pelo que a mais-valia bruta desta operação foi de 500,6 milhões de euros.
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