Rio e Rangel vão hoje a votos. O que os une e os separa
Os dois ex-aliados do norte confrontam-se a dois meses das eleições antecipadas. 46 mil militantes social-democratas escolhem o seu candidato a primeiro-ministro este sábado. Mas há diferenças?
Os dois candidatos à liderança do PSD apresentaram esta semana a moção em que definem a sua estratégia política. A dois meses das eleições antecipadas, os 46 mil militantes social-democratas são chamados a decidir quem vai ser o seu candidato a primeiro-ministro. Rui Rio aposta na experiência e governabilidade — a sua moção chama-se “Governar Portugal” — ao passo que Paulo Rangel aposta no efeito novidade com a moção “Portugal: Ambição e Esperança”.
Na medida em que pertencem ao mesmo partido, tanto Rio como Rangel partilham o mesmo enquadramento político, mas isso não os inibe de discordarem ou terem prioridades diferentes em alguns assuntos. O mais visível e discutido neste momento é a estratégia política no pós-eleições agora que a geringonça aparentemente acabou e está em aberto que condições de governabilidade existirão. Mas há muitas diferenças entre os dois?
A moção de Rui Rio mantém a estratégia adotada nas últimas eleições em janeiro de 2020 e tenta validá-la com as vitórias políticas desde então como os Açores e a autarquia de Lisboa. Agora quer aproveitar a oportunidade das eleições antecipadas para “quebrar o ciclo de hegemonia do Partido Socialista e dos partidos à sua esquerda”. “As próximas eleições decidir-se-ão ao centro do espetro político-partidário”, lê-se na moção de 18 páginas, focando-se em conquistar o eleitorado “mais idoso”.
A moção de Paulo Rangel pretende acima de tudo vincar as suas diferenças com o PS, encostando os socialistas à esquerda e mostrando-se como a única “alternativa”. “A missão do PSD é corporizar e liderar a alternativa ao socialismo, liderar para governar, governar para reformar e reformar para dar aos portugueses o futuro e o País que merecem”, lê-se na moção de 66 páginas, notando que esta é uma “oportunidade enorme” para “disputar estas eleições para vencer”.
Relação com o PS é o que (aparentemente) mais os afasta
O atual presidente do PSD tem sido claro: vai a votar para vencer e formar um Governo de direita (sem o Chega), mas se for derrotado admite um acordo parlamentar de dois anos com o PS para evitar uma nova geringonça à esquerda. “Importa construir uma nova maioria sem linhas vermelhas, assente no diálogo e no compromisso, à esquerda ou à direita, cujo único limite será a da moderação, do respeito pelas instituições constitucionais e a do superior interesse nacional”, lê-se na moção, mas sem “apoios grátis”.
Já Paulo Rangel aposta na maioria absoluta, só admite um Governo à direita com CDS e IL e até o PAN (também sem o Chega) e afasta definitivamente um bloco central (o que Rio também exclui). O objetivo também não pode ser “viabilizar ou apoiar a continuidade da governação socialista”, diz na sua moção, acrescentando que “no quadro pós-eleitoral, e sem prejuízo do respeito pela vontade expressa pelos eleitores, o PSD deve recusar a solução de bloco central ainda que de meia-legislatura”. Porém, nas intervenções públicas o candidato à liderança do PSD nunca disse claramente que exclui qualquer tipo de acordo com o PS pelo que o tabu mantém-se.
Por um lado, Rangel acusa Rio de ser um “proto-candidato a Vice-Primeiro Ministro, ou a um apoio de recurso ao PS e a António Costa”. Por outro lado, Rio acusa Rangel de levar o país para a ingovernabilidade por rejeitar acordos com o PS e de não ter a experiência e preparação necessária para ser primeiro-ministro.
Estilo de oposição: água e azeite
Outra das diferenças mais visíveis entre os dois candidatos à liderança do PSD é o estilo de oposição. É de forma indireta que o tema aparece em ambas as moções, a começar por Rio: “Não é pelo facto de elevarmos mais a voz que passamos a ter maior razão”, diz, numa alusão à “política espetáculo” de Rangel. “Se o fizermos, arriscamo-nos a ser iguais aos que no atual Governo fazem da comunicação o principal instrumento de manipulação dos cidadãos através dos media”, considera o atual líder da oposição que é criticado internamente por ser discreto na oposição.
É por aí que Rangel o critica: “A diferenciação implica coragem e assertividade na crítica aos erros e fracassos das políticas e da forma de governar socialistas, que o PSD não pode mais tolerar, ignorar ou deixar passar enquanto oposição débil ou tímida“, classifica o candidato que desafia Rio, acusando-o também de virar o confronto para o interior do PSD em vez de para o PS. “O PSD tem que ser responsável, mas não débil, quando se é oposição”, acrescenta, sugerindo que Rio abandonou a “oposição firme” por uma atitude em que aguardar pelo poder em vez de o tentar conquistar.
Crescimento económico no topo das prioridades
Mais crescimento económico é o principal argumento que ambos têm a vender aos portugueses nas próximas eleições, em comparação com a governação socialista que dizem estar esgotada e incapaz de criar riqueza, servindo apenas para a distribuir. A estratégia dos dois passa por baixar os impostos (principalmente o IRC pago pelas empresas) — quanto e para quem só dirão na campanha eleitoral — para aumentar o “bolo” que depois é distribuído em salários ou prestações sociais. Ambos criticam o PS pelo “sufoco” ou “opressão” fiscal e prometem uma descida. No salário mínimo, há uma diferença: Rangel quer uma subida “significativa” enquanto Rio é mais cauteloso. Os dois estão focado na subida do salário médio dos portugueses.
Educação focada nas necessidades das empresas. Alinhados com a esquerda nas creches
Mais um tópico em que a estratégia dos dois não parece ser divergente. A começar logo pelos mais novos uma vez que ambos assinalam a necessidade de tornar as creches mais acessíveis ou até mesmo gratuitas — um princípio que também é defendido à esquerda e que até constava do Orçamento do Estado para 2022 que foi rejeitado e desencadeou as eleições antecipadas. O segundo elemento é a ligação entre as qualificações dos portugueses e as necessidades das empresas, uma das falhas identificadas por relatórios que fazem um raio-x ao estado da economia portuguesa.
Serviço Nacional de Saúde une-os contra a esquerda
Este é outro dos pontos de convergência entre Rio e Rangel e uma das principais diferenças face à esquerda, incluindo PS. Ambos querem o regresso das PPP na saúde — já só resta uma, por decisão do atual Governo — e rejeitam a dicotomia entre público e privado no Serviço Nacional de Saúde, argumentando que toda a capacidade existente no país tem de ser usada para dar o melhor tratamento possível aos portugueses.
“Não há alternativa a considerarmos os serviços de saúde, públicos e privados, como um todo, mobilizando todos os recursos disponíveis para a concretização do objetivo principal: assegurar um bom serviço de saúde”, lê-se na moção de Rio. Na de Rangel lê-se que “é necessário pensar o SNS com base nas evidências e nos dados e não com base em preconceitos ideológicos”, rejeitando as “dualidades público/privado ou a prática exclusiva/não exclusiva pelos profissionais do SNS”.
Rapidez na justiça
O eurodeputado quer criar uma agência anticorrupção “altamente especializada” e com poder efetivo para investigar. Além disso, o seu foco na justiça está na celeridade dos processos, na simplificação processual através da digitalização e nos custos de contexto das empresas. ” A morosidade [da justiça] é uma das principais críticas dos cidadãos e também um forte obstáculo à competitividade da nossa economia e ao investimento estrangeiro”, considera Rangel.
Já o atual presidente do PSD, em linha com as propostas que apresentou nos últimos anos, defende uma intervenção mais estrutural na justiça, apesar de também falar da necessidade de maior rapidez. “A organização com traços marcantes de corporativismo e não sujeita ao escrutínio público, a morosidade dos processos que ilude o respeito e defesa dos diretos fundamentais, e os entraves ao acesso a este bem público fundamental por parte de todos os cidadãos, são os sintomas de uma tendência que urge inverter”, lê-se na moção.
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