UTAO quer capacidade para avaliar política fiscal: “Ninguém presta contas sobre os resultados” das medidas fiscais
Para o coordenador da UTAO, a avaliação das medidas fiscais é uma das áreas que precisa de mais investimento em Portugal. A Unidade que apoia os deputados podia fazer parte da solução.
A Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) considera que existe um défice na capacidade de escrutínio dos efeitos económicos das medidas fiscais e quer ter capacidade técnica para colmatar essa lacuna. Em entrevista ao ECO publicada esta terça-feira, o coordenador da UTAO, Rui Nuno Baleiras, diz que “ninguém presta contas sobre esses resultados”, em específico dos benefícios fiscais, e sugere que a Unidade e o Parlamento façam parte da solução.
Esta é uma “área muito importante para a política económica em Portugal para a qual nem o poder político prepara bem as medidas nem a UTAO tem a capacidade para os ajudar“, afirma o economista, explicando que há “excelentes profissionais” a assessorar os Governos mas são das áreas da fiscalidade, do direito, da auditoria, da contabilidade e não da economia. O resultado é que não se criam indicadores para avaliar as consequências da política fiscal. “Ficam as promessas, mas ninguém presta contas sobre esses resultados“, assinala.
Baleiras reconhece que “são muito poucas as pessoas que em Portugal têm competências específicas da economia pública para nos ajudar enquanto sociedade a perceber que determinada medida fiscal tem o efeito que o legislador pretende, mas tem outros efeitos menos visíveis e que às vezes são perversos, isto é, são contrários aquilo que o legislador pretende”. “Não nos preocupamos com os efeitos negativos que a carga fiscal tem sobre a criação de emprego, a poupança, o investimento, a competitividade externa, a inovação“, acrescenta.
Para resolver este problema, o ex-vogal do Conselho das Finanças Pública sugere que se crie capacidade técnica na UTAO que identifique “eventuais efeitos secundários e calcule o impacto das medidas”, com a contratação de profissionais de várias áreas. A UTAO passaria a ter estudos por iniciativa própria, “podendo dar ideias aos políticos para reformar a política fiscal, incluindo uma área que faz muita falta que é avaliar regularmente a eficácia dos benefícios fiscais que, no fundo, são privilégios”.
Como a capacidade de tributar advém do Parlamento (“No taxation without representation”, “Não há impostos sem representação [parlamentar]), a UTAO sugere que o Parlamento deve ter essa capacidade: “A política fiscal esteve na origem da instituição parlamentar e permanece, na atualidade, umas das suas principais justificações“, lia-se no relatório da UTAO sobre a reforma do processo legislativo. Rui Nuno Baleiras recorda que o Governo pediu ajuda ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e à Comissão Europeia para desenhar uma nova unidade técnica sobre benefícios fiscais e defende que deve haver uma fusão com a UTAO.
A Unidade “ganharia com a possibilidade de contratar desenvolvimentos informáticos no acesso a bases de dados da Autoridade Tributária e Aduaneira e o recrutamento de recursos humanos especializados em competências profissionais que não existem presentemente na UTAO, como modelos computacionais de equilíbrio geral, microeconomia pública, auditoria fiscal e, mesmo, direito tributário”. Além disso, teriam maior capacidade para contratar economistas dos impostos que, em Portugal, são escassos.
O coordenador da UTAO aborda esta sugestão e outras mudanças que quer ver no processo legislativo orçamental na entrevista publicada esta terça-feira no ECO. Rui Nuno Baleiras argumenta que, com a maioria absoluta do PS, “não vai estar em causa a sobrevivência política quando se tratar de pensar se devemos ou não fazer uma determinada reforma” pelo que é a altura ideal para avançar com estas alterações.
“Em tempo politicamente favorável, que devemos preparar o contexto das finanças públicas para que quando vier uma nova conjuntura de Governo minoritário não se padeça dos mesmos moldes que o estudo identificou“, defende o coordenador da UTAO, assinalando que a queda do Governo em virtude do chumbo do Orçamento do Estado para 2022 mostrou que o processo orçamental, “em vez de criar condições para estabilidade política, é em si fonte de instabilidade política”.
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