5G: A revolução digital que nasce no meio de suspeitas de espionagem
- Lusa
- 10 Novembro 2019
Entre suspeitas de espionagem pelos EUA, rejeitadas pela chinesa Huawei, está a nascer uma revolução digital: as redes móveis de quinta geração, mais potentes e desafiantes que quaisquer outras.
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- Lusa
- 10 Novembro 2019
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O que é o 5G e como surge?
O 5G é a quinta geração de rede móvel e vem suceder ao 1G (criado em 1980), ao 2G (de 1990), ao 3G (de 2000) e ao 4G (de 2010). Com o avanço da tecnologia, as infraestruturas de rede móvel têm também vindo a ser substituídas, já que as novas são sempre mais eficazes e potentes do que as anteriores.
O 1G era apenas destinado a chamadas de voz e tinha uma velocidade de 2,4 kilobytes (kbps) por segundo. O 2G passou a incluir também mensagens de texto e já era de 64 kbps por segundo.
Com o 3G, no início do milénio, passou-se para uma velocidade 384 kbps por segundo, incluindo então, além das chamadas de voz e das mensagens escritas, a internet através de dados móveis. Foi com o 4G que se chegou à banda larga móvel, numa velocidade entre 100 megabytes (kbps) a um gigabyte (Gbps) por segundo.
O que se espera é que, com o 5G, se chegue a uma velocidade de, pelo menos, 10 Gbps por segundo, permitindo a conexão de dados ilimitados em qualquer lado, a qualquer altura e em qualquer formato. Neste novo padrão da banda larga sem fios haverá, então, mais velocidade, maior cobertura e mais recursos.
A nova infraestrutura, ainda em desenvolvimento, será 100 vezes mais rápida do que a anterior, podendo chegar inclusive a 20 Gbps. Isto torna, por exemplo, as tarefas mais velozes, com o ‘download’ de um filme com um gigabyte a poder demorar menos de 10 segundos.
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Para que serve o 5G?
Além de ser aplicado às comunicações móveis, o 5G será crucial para áreas do quotidiano, mas também para promover outros avanços tecnológicos, nomeadamente nos carros autónomos.
Isto porque a potência desta rede de quinta geração vai além da rapidez nos ‘uploads’ e ‘downloads’ e assenta, sobretudo, na redução da latência, ou seja, do tempo de resposta de um aparelho a partir do momento em que recebe a ordem até a executar.
Quanto menor for a latência, mais rápida é a reação de um aparelho acionado à distância. Isto aplica-se aos eletrodomésticos e a outros aparelhos comuns, incluindo os que estão ligados à internet, que passarão a ser mais eficientes, podendo trazer benefícios nas áreas do entretenimento, agricultura, indústria, saúde, energia e na realidade virtual.
Acresce que a rede 5G vai permitir que mais aparelhos estejam conectados ao mesmo tempo, multiplicando por 100 o número de dispositivos possíveis. A questão da latência também permitirá melhorar a tecnologia associada aos carros autónomos, tornando estes veículos mais rápidos na resposta – até perante eventualidades – e no processamento da informação.
Em termos ambientais, também há uma redução na ordem dos 90% do consumo de energia.
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Quais os principais desafios?
Apesar dos benefícios, a rede 5G traz vários desafios, nomeadamente para as empresas de telecomunicações ou para as fabricantes de telemóveis. A primeira questão passa pela uniformização, já que se estabeleceram requisitos para o 5G aplicáveis em todo o mundo, que preveem que esta rede seja flexível o suficiente para permitir o surgimento de novos serviços ou modelos de negócios.
Isto significa que o 5G deverá funcionar em várias faixas eletromagnéticas, como as de 3.4-3.8 giga-hertz (GHz), de 700 mega-hertz (MHz) ou ainda de 26 GHz, respetivamente, de média, baixa e alta.
Deverá, também, funcionar de forma igual em áreas povoadas ou rurais e em aparelhos mais avançados (como os que estão a ser fabricados tendo por base esta quinta geração móvel) ou tradicionais. Este deverá ser o maior desafio técnico, já que hoje em dia, quase uma década depois da criação do 4G, ainda há zonas no interior dos países (incluindo em Portugal) que não são abrangidas por estas redes.
Mas as discussões relativas a esta tecnologia têm ido muito além das questões técnicas e têm assentado, sobretudo, na questão da segurança cibernética. E nesta história, marcada por acusações mútuas pouco fundamentadas, estão duas potências mundiais e duas versões: Estados Unidos e China.
O principal desafio para os governos, nomeadamente dos Estados-membros da União Europeia (UE), é então assegurar a plena segurança das redes 5G, garantindo que, quando estas estiverem em funcionamento, não existe uma maior probabilidade de roubo ou acesso indevido a dados ou de ataques cibernéticos.
Quanto mais potente e abrangente é a tecnologia, mais danos pode causar se for utilizada indevidamente e é isso que cabe agora aos Estados evitar.
Proxima Pergunta: Quais as polémicas que envolvem o 5G?
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Quais as polémicas que envolvem o 5G?
Washington e a Pequim estão numa guerra global por causa da cibersegurança e das infraestruturas a nível mundial, desde logo após a administração norte-americana ter lançado suspeitas de espionagem sobre a fabricante chinesa Huawei, acusando-a de ter instalado ‘back doors’ (portas traseiras de acesso) em equipamentos 5G, o que a tecnológica tem vindo a rejeitar, reiterando a falta de provas.
Aludindo a motivos de segurança, os Estados Unidos criaram também limitações (ainda não totalmente em vigor) aos negócios da Huawei com empresas do país e baniram os seus equipamentos dos departamentos do Estado.
A administração liderada por Donald Trump tem ainda tentado pressionar alguns países, nomeadamente da UE, para adotarem posições semelhantes. Portugal já desvalorizou esta polémica e recusou fazê-lo.
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Qual a posição da UE?
Assumida como uma prioridade europeia desde 2016, a aposta no 5G já motivou também preocupações com a cibersegurança, tendo levado a Comissão Europeia, em março deste ano, a fazer recomendações de atuação aos Estados-membros, permitindo-lhes desde logo excluir empresas ‘arriscadas’ dos seus mercados.
Bruxelas pediu, também nessa altura, que cada país analisasse os riscos nacionais com o 5G, o que aconteceu até junho passado, seguindo-se agora a adoção de medidas comuns para mitigar estas ameaças, isto até final do ano.
Nessa análise feita aos riscos nacionais, os Estados-membros detetaram a possibilidade de ocorrência de casos de espionagem ou de ciberataques vindos, nomeadamente, de países terceiros.
Apesar de Bruxelas nunca ter mencionado o nome de nenhuma companhia ou visado algum país, foram já vários os críticos que já afirmaram que a UE tem agido por pressão norte-americana, o que a Comissão Europeia rejeita, assegurando estar a adotar medidas de cibersegurança com base nos seus próprios interesses.
Numa declaração escrita enviada à agência Lusa, o comissário europeu para a União da Segurança, Julian King, admitiu que não existem “soluções milagrosas” para cibersegurança nas redes 5G, pelo que defendeu uma ação conjunta dos Estados-membros.
“Já houve algum debate público [sobre a cibersegurança nas redes 5G] e algumas dessas discussões referem-se à [criação de] padrões técnicos para operadores e à diversificação de fornecedores, enquanto outras destacam a necessidade de medidas de monitorização e certificação”, afirmou Julian King.
Porém, continuou o responsável, “nenhumas dessas [medidas propostas] serão soluções milagrosas”.
De acordo com Julian King, “não só o 5G é uma tecnologia complexa, porque envolverá milhares de milhões de dispositivos conectados, como também representa o caminho para um novo ecossistema digital”.
E, “nos casos em que a segurança não pode ser assegurada pela estrutura, terá de ser por escolhas – escolhas essas que, por vezes, terão de ser feitas pelos Estados-membros e não pela indústria”, vincou o comissário europeu, numa alusão à permissão dada por Bruxelas a que os países possam, futuramente, excluir alguns fornecedores dos seus mercados por razões de segurança.
“Para permanecermos resilientes num clima geopolítico em mudança, temos de agir em conjunto para identificar e mitigar potenciais fraquezas e vulnerabilidades que possam prejudicar a nossa segurança coletiva, podendo, inclusive, agir juntamente com parceiros internacionais que pensam da mesma forma”, defendeu Julian King.
O comissário europeu rejeitou ainda a existência “do conceito de total independência tecnológica numa economia global, aberta e interligada”, como a da UE.
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E o que diz a Huawei?
A fabricante chinesa Huawei tem sido crítica da “pressão vinda do outro lado do Atlântico”, dos Estados Unidos, para a UE relativamente ao 5G, afirmando esperar que Bruxelas seja “inteligente o suficiente”.
“Obviamente, há pressão política vinda do outro lado do Oceano Atlântico […], está em todo o lado na Europa e é feita diretamente por líderes políticos de topo dos Estados Unidos”, afirmou o representante chefe da Huawei para as instituições europeias, Abraham Liu, em entrevista recente à agência Lusa.
Reagindo às suspeitas norte-americanas, Abraham Liu disse à Lusa que “a pressão está aí”. Ainda assim, apontou que a Huawei tem um “historial de 20 anos” de presença na UE, e que tem demonstrado que “é um parceiro de confiança”.
Por isso, o responsável disse esperar que a Europa seja “capaz e inteligente o suficiente para tomar as suas decisões”. “Acredito que a Europa deve ter a cibersegurança nas suas próprias mãos, independentemente do que os seus vizinhos sussurram aos seus ouvidos”, insistiu.
Para Abraham Liu, “a cibersegurança é mais uma questão técnica do que um assunto político”, já que “os Estados Unidos, mesmo sem a Huawei, estão a enfrentar sérios riscos”. “E a Europa, com a Huawei, que está presente em 170 países em todo o mundo, tem o melhor historial em termos de cibersegurança”, realçou.
Questionado pela Lusa se espera influência norte-americana nas medidas que serão adotadas pela UE para garantir a cibersegurança nas redes 5G, Abraham Liu notou que só aquando da sua divulgação “se verá”. “Eu acredito em decisões que são favoráveis aos interesses europeus e creio que a Huawei é um parceiro para soluções, não uma parte do problema”, vincou.
O responsável argumentou também que “a Europa tem especialistas e operadoras de topo – como a Vodafone, Orange, Telefónica – e todos têm competências técnicas muito fortes e […] sabem o que estão a fazer”. A Europa é o maior mercado da Huawei fora da China. De um total de 50 licenças que a empresa detém para o 5G, 28 são para operadoras europeias.
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Quais os desenvolvimentos em curso na UE?
Um relatório de setembro (o mais recente) do Observatório Europeu para o 5G, estrutura criada no ano passado pela Comissão Europeia, dá conta de que, nesse mês, existiam 165 projetos-pilotos (mais do que os 138 realizados em março passado) em curso na UE, num total de 125 cidades nos Estados-membros consideradas como habilitadas para receber a tecnologia.
O documento coloca também Portugal no ‘top’ dos 10 países UE com mais testes da tecnologia 5G, juntamente com Espanha, França, Itália, Alemanha, Reino Unido, Finlândia, Holanda, Estónia e Roménia. Segundo o relatório do Observatório Europeu para o 5G, em setembro, eram 125 as cidades nos Estados-membros da UE consideradas como habilitadas para receber a tecnologia 5G.
Os países com mais cidades habilitadas para a tecnologia 5G eram, nesse mês, Espanha (24), França (15), Itália (13), Alemanha (nove) e Reino Unido (oito), ainda de acordo com o relatório.
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E em Portugal?
Em Portugal, essas cidades ditas como aptas para receber o 5G são Aveiro, Évora e Porto, de acordo com o relatório do Observatório Europeu para o 5G, que precisa que em causa estão testes relativos às infraestruturas, mas também a corredores tecnológicos, que são feitos por privados e também no âmbito de parcerias público-privadas.
Ainda relativamente a Portugal, são apontadas no documento datas relativamente ao lançamento comercial do 5G pela Altice (segundo semestre de 2019), pela Vodafone (final de 2019) e pela NOS (em 2020), as três principais operadoras de telecomunicações no país.
Porém, estes prazos podem não se manter, já que Portugal falhou a data prevista para apresentação de uma estratégia nacional para esta tecnologia, que era o verão passado. Por essa razão, Portugal não figura entre os 11 Estados-membros apontados no relatório com planos e roteiros já divulgados, que são Espanha, França, Áustria, Luxemburgo, Alemanha, Holanda, Dinamarca, Reino Unido, Suécia, Finlândia e Estónia.
Já cumprido por Portugal foi o prazo de realizar, no ano passado, uma consulta pública ao mercado sobre o espetro a utilizar no 5G. Nessa auscultação, feita pela Autoridade Nacional de Comunicações (Anacom) entre março e maio de 2018, chegou-se à conclusão de que a faixa que reunia mais interessados era a dos 700 mega-hertz (MHz), implicando uma migração da Televisão Digital Terrestre (TDT), embora tenham sido assinaladas outras como a dos 3,6 giga-hertz (GHz).
Já mais recentemente, no final de outubro deste ano, a Anacom divulgou o projeto de decisão para a atribuição de frequências no 5G, indicando que esta alocação será feita através de leilão até agosto de 2020.
De acordo com o calendário indicativo proposto pela Anacom, o início do leilão de atribuição das licenças para o 5G decorrerá em abril do próximo ano, estando o seu encerramento previsto para junho, pelo que a conclusão dos procedimentos de atribuição de direitos de utilização de frequência (DUF) será entre junho e agosto.
O relatório do Observatório Europeu para o 5G dá também conta destes leilões de espetro programados para 2020 em Portugal, referindo que em causa está a faixa dos 700 MHz. O documento precisa que, em setembro deste ano, estavam disponíveis no país as frequências 703-733 e 758-788 MHz.
No relatório, Portugal surge ainda associado a dois dos 11 corredores transfronteiriços para o 5G, que ligarão, respetivamente, as cidades de Porto e de Évora às localidades espanholas de Vigo e Mérida, no seguimento de compromissos assumidos no ano passado.
O corredor entre Porto e Vigo será construído no âmbito de um programa de apoio financeiro para parcerias público-privadas no 5G. Juntamente com outros dois projetos (entre França, Luxemburgo e Alemanha e entre Itália e Alemanha), representa um montante total de 63 milhões de euros (50 milhões de euros dos quais suportados por verbas comunitárias).
Proxima Pergunta: E a nível mundial?
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E a nível mundial?
A rede 5G está a ser desenvolvida em vários países do mundo, estando os asiáticos e os Estados Unidos mais posicionados para vencer a corrida tecnológica. Apesar de nesta corrida estar também a UE, os avanços são maiores fora da União, já que os Estados Unidos, o Japão, a Coreia do Sul e a China são os principais países em termos de desenvolvimento desta tecnologia.
De facto, é entre estes países que se discute o título de primeiro a comercializar redes 5G. Um quadro síntese feito pelo Observatório Europeu para o 5G e datado de setembro dá conta de que, entre o final do ano passado e início deste, esta tecnologia tornou-se uma realidade na Coreia do Sul e nos Estados Unidos, mas neste último caso apenas para os telemóveis aptos da companhia norte-americana de telecomunicações AT&T.
Há quem diga, então, que o vencedor da corrida tecnológica foi a Coreia do Sul, onde o 5G começou logo a ser disponibilizado por três operadoras nacionais, que estimavam mais de três milhões de clientes sul-coreanos até final de 2019.
Entretanto, entre abril e maio passados, os Estados Unidos passaram a disponibilizar 5G para os clientes das operadoras Verizon e Sprint, mas novamente apenas em telemóveis específicos.
A UE está também nesta ‘corrida’ tecnológica, com os Estados-membros a darem passos para cumprir a meta da Comissão Europeia, que estipula que o 5G seja disponibilizado, de forma comercial, em pelo menos uma cidade por país até 2020, prevendo ainda uma cobertura mais abrangente até 2025.
De acordo com o Observatório Europeu para o 5G, esta tecnologia já está a ser comercializada em Estados-membros como Áustria, Reino Unido, Espanha, Itália, Roménia, Alemanha e Irlanda.
No estrangeiro, prevê-se para 2020 o lançamento comercial do 5G na China (onde está agora a ser pré-comercializada) e no Japão, país que acolhe no próximo ano os Jogos Olímpicos de Verão.