Como chegou Sam Bankman-Fried aqui e para onde vai?
- Flávio Nunes
- 16 Dezembro 2022
Fundador da FTX foi detido nas Bahamas e está em maus lençóis. Quem é Sam Bankman-Fried, de que está a ser acusado, como responde e em que ponto está a insolvência da falida corretora.
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- Flávio Nunes
- 16 Dezembro 2022
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Quem é Sam Bankman-Fried?
Sam Bankman-Fried, 30 anos, também conhecido por SBF, é um empreendedor norte-americano que ganhou notoriedade por ter fundado a FTX em 2019. Até há bem pouco tempo, a FTX era uma das maiores corretoras de criptomoedas do mundo.
O estilo pouco ortodoxo e a respetiva fortuna, que chegou a tocar 26 mil milhões de dólares, fizeram de SBF uma figura bastante influente em Washington DC, EUA, onde foi responsável por 40 milhões de dólares em donativos políticos, sobretudo ao Partido Democrata.
Bankman-Fried é ainda um dos principais rostos do universo “cripto”. Em pouco tempo, o império FTX cresceu significativamente e a marca ganhou grande visibilidade. Por exemplo, em 2021, a FTX assinou um acordo de 130 milhões de dólares para dar nome a um estádio em Miami com capacidade para mais de 20 mil pessoas, que passou a chamar-se FTX Arena.
O jovem caiu em desgraça este ano, depois do colapso do império FTX. Suspeita-se que a FTX terá transferido depósitos dos clientes para financiar a Alameda Research, um fundo criado pelo próprio Sam Bankman-Fried em 2017 e que entrou em dificuldades com a desvalorização das criptomoedas este ano. Algo que contribuiu para a insolvência da FTX.
A queda da FTX pode ter deixado mais de um milhão de credores em risco de perderem os fundos que depositaram na corretora. Para se ter melhor noção da dimensão do problema, a FTX deve mais três mil milhões de dólares aos 50 maiores credores, segundo a imprensa internacional.
No rescaldo desta crise, Sam Bankman-Fried – que, dias antes do colapso da FTX, foi capa da revista Fortune com o título “O próximo Warren Buffett?” – acabou detido a 12 de dezembro de 2022, nas Bahamas, onde vive atualmente, sem direito a fiança.
A detenção foi feita depois de as autoridades terem recebido dos EUA a indicação de que SBF deverá ser acusado criminalmente de ter cometido fraude ao usar depósitos dos clientes para financiar atividades políticas, comprar imobiliário de luxo e investir noutras empresas.
Proxima Pergunta: De que é acusado SBF?
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De que é acusado SBF?
Depois da falência da FTX, Sam Bankman-Fried permaneceu nas Bahamas, mas não desapareceu da vista do público. Inclusivamente, participou à distância numa conferência do The New York Times, arrancando gargalhadas do público ao desabafar: “Estou a ter um mau mês.”
Agora, SBF terá de responder numa série de processos civis e criminais. Desde logo, os procuradores nos EUA acusam-no de ter usado de forma fraudulenta o dinheiro dos clientes da FTX para financiar a sua própria vida e engordar o seu próprio património.
O jovem é ainda acusado de conspiração para defraudar os EUA e de violar as regras de financiamento de campanhas eleitorais.
A Securities and Exchange Commission (SEC), que é o supervisor dos mercados de capitais nos EUA – corresponde à CMVM em Portugal –, avançou com um processo contra SBF, referindo que entre maio de 2019 e novembro de 2022, “pelo menos”, o jovem promoveu um “esquema para defraudar os investidores” e clientes da plataforma.
“Bankman-Fried angariou mais de 1,8 mil milhões de dólares dos investidores, incluindo investidores norte-americanos, que compraram uma participação acionista na FTX acreditando que a FTX tinha medidas de controlo e de gestão de risco apropriadas”, escreve a SEC.
E acrescenta: “Sem o conhecimento destes (e dos clientes da corretora), Bankman-Fried estava a orquestrar uma fraude massiva que durou anos, desviando milhares de milhões de dólares dos fundos dos clientes da corretora para seu benefício pessoal e para ajudar a crescer o seu império ‘cripto’.”
Já a Commodity Futures Trading Commission (CFTC), que regula os mercados financeiros de futuros e derivados nos EUA, acusa a FTX de ter usado indevidamente o dinheiro dos clientes para ajudar a sua outra empresa, a Alameda, mesmo tendo em conta que a FTX está sediada fora daquele país, nas Bahamas.
Para tal, a CFTC alega que o colapso do império de FTX fez tombar o valor das criptomoedas, inaugurando uma nova abordagem na regulação das atividades “cripto” a nível mundial, explica o The Wall Street Journal.
Proxima Pergunta: Como responde SBF?
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Como responde SBF?
Sam Bankman-Fried admite ter cometido erros na gestão da FTX, mas recusa ter cometido fraude deliberadamente.
“Claramente, cometi bastantes erros. Dava tudo para poder voltar atrás e refazer algumas coisas. Nunca tentei cometer fraude a ninguém. Há um mês, eu estava entusiasmado com as perspetivas da FTX. Via [a empresa] como um negócio a prosperar e a crescer. Fiquei chocado com o que aconteceu este mês. E, em retrospetiva, desejava ter feito algumas coisas de forma diferente”, disse SBF na conferência DealBook Summit (abaixo, a entrevista completa).
Na entrevista remota, Sam Bankman-Fried reconhece ainda que a exposição da FTX à Alameda – e vice-versa – era maior do que se sabia publicamente. “Dada a dimensão da posição”, as duas estavam, “de facto, substancialmente mais ligadas do que eu alguma vez quis que fosse”, assumiu.
Importa dizer que, durante todo este processo, SBF foi fazendo várias declarações públicas em mensagens no Twitter. Em algumas dessas publicações, o jovem disse ter como objetivo tentar ressarcir os credores pelos fundos perdidos: “O meu objetivo: a) Limpar e focar na transparência; b) Reembolsar os clientes.”
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Como está a FTX agora?
Um caos, a avaliar pelas declarações do homem que foi chamado para meter ordem na casa.
Quando Sam Bankman-Fried entregou o pedido de insolvência da FTX, teve de ceder o controlo do grupo a um administrador de insolvência: John J. Ray, conhecido por ter gerido a insolvência da Enron há mais de 20 anos (ganha 1.300 dólares por hora mais despesas, segundo a CNBC).
Não foi preciso muito tempo para o advogado perceber que a situação “não tem precedentes”.
“Desde a integridade de sistemas comprometida à supervisão regulatória deficiente no exterior, à concentração e controlo nas mãos de um grupo muito pequeno de indivíduos inexperientes, não sofisticados e potencialmente comprometidos, a situação não tem precedentes”, escreveu o responsável num documento.
Já em dezembro, John J. Ray falou sobre o trabalho que está a ser feito para localizar os ativos da FTX. Queixando-se de dificuldades por não haver registos na empresa, o novo CEO afirmou: “Os ativos vão levar tempo a serem encontrados. O processo, como digo, vai demorar meses e não semanas. Mas estamos a tentar fazer isto da forma mais expedita possível.”
A equipa já terá conseguido localizar mil milhões de dólares em ativos, o que representa apenas uma pequena fração da dívida total da FTX aos clientes.
A piorar tudo isto está o facto de a FTX ter sido alvo de ataque informático na fatídica semana do colapso. Alguém terá aproveitado a confusão para desviar cerca de 477 milhões de dólares em criptomoedas. Os contornos da burla estão envoltos num denso nevoeiro.
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Há ligações a Portugal?
As ondas de choque da derrocada da FTX chegaram a todo o mundo. Portugal não foi exceção.
Segundo o Público, uma comunidade portuguesa de entusiastas da tecnologia blockchain iniciou os preparativos para o que poderá vir a ser uma ação judicial coletiva contra a FTX. A Offchain Lisbon está à procura de investidores portugueses que tenham sido prejudicados pela falência através de um inquérito anonimizado.
Outra consequência conhecida foi noticiada pelo ECO em novembro. A Anchorage Digital, um banco de criptomoedas fundado pelo português Diogo Mónica, tinha o fundo Alameda, de Sam Bankman-Fried, entre os acionistas. A Alameda investiu 20 milhões de dólares na ronda de capital que fez da Anchorage o sétimo “unicórnio” português (o nome dado às startups que ultrapassam uma avaliação de mil milhões).
Na altura, Diogo Mónica explicou ao ECO que a posição da Alameda na Anchorage será vendida. E mostrou interesse em ser a própria Anchorage a adquiri-la. Para Diogo Mónica, “o que correu mal” na FTX “foi ter um criminoso como CEO”.