Cláudia Leonardo integrou a Melo Alves, passando a ser a primeira mulher a integrar o colégio de sócios. À Advocatus, assume que a representatividade feminina assume um papel cada vez mais importante.
Cláudia Leonardo integrou recentemente a Melo Alves, passando a ser a primeira mulher a integrar o colégio de sócios da firma. À Advocatus, assume que a representatividade feminina assume um papel cada vez mais “importante” na atração e retenção de talento.
Sobre a arbitragem, considera que é “comprovadamente” um mecanismo de resolução alternativa de litígios com “alta eficácia”, especialmente em litígios particularmente complexos, pela rapidez, especialização e confidencialidade “que é capaz de imprimir à resolução dos litígios, sobretudo se comparada com os tribunais judiciais”.

O que a motivou a seguir a carreira de advocacia e, em particular, a especializar-se em contencioso e arbitragem?
Pode-se dizer que não escolhi o contencioso, foi o contencioso que me escolheu. Quando decidi ingressar no curso de Direito tinha uma ideia romântica da advocacia aliada à barra dos tribunais. A licenciatura abriu-me o horizonte para todas as outras dimensões da advocacia que eu não rejeitava por princípio.
O meu estágio e início de carreira foram em prática generalista e, somente quando ingressei na Simmons & Simmons integrei, pela primeira vez, um “departamento” que neste caso era de contencioso. Foi aí que senti pela primeira vez uma vocação e senti na pele o significado da frase “Escolhe um trabalho de que gostes e não terás que trabalhar nem um dia na tua vida.”
Para isso contribuiu em larga medida, o facto de ter tido sempre o privilégio de trabalhar com pessoas apaixonadas pela profissão de uma forma absolutamente inspiradora e contagiante.
Pelo contrário, a arbitragem foi uma escolha muito consciente. Em 2004, achei importante ter uma experiência internacional e a Simmons & Simmons proporcionou-me um secondment no escritório de Londres que conciliei com o curso de arbitragem comercial internacional da Queen Mary. Foi uma experiência incrível pelo mundo e pelos meandros da arbitragem.
Como descreve a evolução da sua carreira até alcançar a posição de sócia na Melo Alves?
O meu percurso profissional como advogada há mais de 20 anos, tem sido maioritariamente em sociedades de advogados de pendor internacional, onde integrei os respetivos departamentos de resolução de litígio, com uma prática essencialmente focada no contencioso e arbitragem.
Neste percurso tive a oportunidade de integrar sociedades de pequena, média e grande dimensão onde assumi funções como associada sénior, consultora e sócia.
A minha integração na Melo Alves consolida e sumariza este percurso e experiência profissionais. A sociedade tem atualmente uma dimensão na qual me revejo e uma vertente internacional muito vincada, com a qual me identifico.
O facto de anteriormente ter trabalhado vários anos com o Bruno Melo Alves e o Rui Andrade proporcionou-me uma sensação de “regresso a casa” na integração na Melo Alves, que praticamente anulou a necessidade de adaptação a uma nova estrutura, tanto mais que também já conhecia e tinha trabalhado pontualmente com o Carlos Melo Alves e o Tiago Melo Alves.
Identifico-me totalmente com o projeto e os valores da Melo Alves e um projeto como este e, neste momento, fazia todo o sentido no meu percurso profissional.

Quais foram os principais desafios que enfrentou ao longo do seu percurso profissional?
Lidei quase sempre, maioritariamente, com clientes internacionais e, por esse motivo, os maiores desafios passaram pela necessidade de gerir as suas expectativas, perante um ritmo de resolução dos processos nem sempre bem compreendido.
Durante a minha experiência na Miranda, pelas jurisdições que trabalhávamos, esse desafio foi particularmente exigente. É tão desafiante como gratificante porque nessas circunstâncias as vitórias são sempre grandes vitórias.
Como encara o facto de ser a primeira mulher a integrar o colégio de sócios da Melo Alves?
Com muito orgulho. Parece uma inevitabilidade na profissão, porque as mulheres estão em franca maioria, mas a verdade é que a estatística teima, em desmentir essa tendência, as sociedades de advogados são, ainda hoje, um mundo muito masculino nos lugares decisórios.
Por isso fiquei muito satisfeita pelo reconhecimento do convite para partilhar a liderança de um projeto como a Melo Alves.
Creio que a representatividade feminina assuma também, e cada vez mais, um papel importante na atração e retenção de talento.
Qual considera ser a importância da representatividade feminina em cargos de liderança nas sociedades de advogados?
Em qualquer estrutura de liderança a igualdade de género garante um maior equilíbrio às organizações e as sociedades de advogados não são exceção.
Desde logo porque assegura uma diversidade de perspetivas, pontos de vista e abordagem à tomada de decisões que é valiosa e enriquecedora, tanto no plano das relações com os clientes.
Creio que a representatividade feminina assuma também, e cada vez mais, um papel importante na atração e retenção de talento. Há cada vez mais uma consciência para a importância do equilíbrio de género na “saúde” das organizações e, naturalmente, jovens advogadas talentosas vão-se sentir atraídas por estruturas onde seja evidente o reconhecimento da importância das mulheres em cargos de liderança.
Que conselhos daria a jovens advogadas que aspiram a posições de liderança?
Primeiramente, muito trabalho, preparação e foco.
Depois é preciso que tenham confiança nas suas capacidades para percorrer o caminho até à liderança que não é linear.
Uma vez lá chegando, é importante que sejam generosas com as jovens advogadas e se disponibilizem a formá-los e a acolhê-los nas estruturas de liderança, sem receios e com a perspetiva de que nas organizações há sempre lugar para quem tem talento.

Como avalia a eficácia da arbitragem como meio alternativo de resolução de litígios?
A arbitragem é comprovadamente um mecanismo de resolução alternativa de litígios com alta eficácia, especialmente em litígios particularmente complexos, pela rapidez, especialização e confidencialidade que é capaz de imprimir à resolução dos litígios, sobretudo se comparada com os tribunais judiciais.
É importante que as partes, ou os seus assessores jurídicos, ponderem convenientemente as cláusulas arbitrais a adotar, adaptando-as ao caso concreto, de forma a mitigar aquele que é apontado como o maior problema da arbitragem: os custos associados.
Com experiência no mercado angolano, quais são as principais diferenças entre os sistemas jurídicos português e angolano no contexto do contencioso e arbitragem?
Em primeiro lugar, é preciso referir que o sistema judicial angolano está em desenvolvimento e, por esse motivo, apresenta desafios muito próprios, como por exemplo no que respeita a recursos, infraestruturas, formação de juízes, etc. que são muito mais desafiantes do que a realidade portuguesa. Os processos são também mais suscetíveis a atrasos, desde logo, porque não há desmaterialização de processos como no sistema português, o que implica a necessidade de prática presencial dos atos processuais.
No tocante à arbitragem, o instituto tem-se vindo a difundir em Angola, sendo cada vez mais frequente o seu recurso. Mas ainda há dificuldades, nomeadamente, na articulação com os tribunais judiciais, quer durante a tramitação do processo como na execução das decisões arbitrais, sendo que o reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras pode ainda revelar-se particularmente desafiante.
A advocacia vai decerto enfrentar um período de profunda transformação nos próximos anos, impulsionado não só pela tecnologia, mas também pela continuidade da globalização dos litígios e aumento da sua complexidade e número.
Na sua visão, quais são os principais desafios que a advocacia enfrentará nos próximos anos, especialmente nas áreas de contencioso e arbitragem?
No futuro próximo, creio que a adaptação à realidade das sociedades multidisciplinares que desafiam os grandes dogmas tradicionais da advocacia. Por outro lado, a adaptação à transformação digital e tecnológica também irá desafiar a advocacia pela grande necessidade de adaptação que imporá aos advogados, por excelência, uma classe tradicional. É preciso não as temer e encarar com naturalidade estas ferramentas e aprender a usá-las em nosso próprio benefício.
A advocacia vai decerto enfrentar um período de profunda transformação nos próximos anos, impulsionado não só pela tecnologia, mas também pela continuidade da globalização dos litígios e aumento da sua complexidade e número. Os advogados que se adaptem aos novos paradigmas, que invistam em novas tecnologias, em formação e na sua própria especialização, estão melhor posicionados para o sucesso.

Quais são as características de um grande advogado em contencioso e arbitragem?
Diria que são capacidades essenciais reunir uma sólida qualidade técnica, pragmatismo, estratégia, capacidade de gestão de expectativas e orientação para o cliente. Se apimentadas com alguma audácia, carisma e uma pitada de sorte, tanto melhor!
Qual foi o melhor conselho que lhe deram ao longo da sua carreira?
Serve para a vida profissional como para a vida pessoal: as adversidades podem ser grandes oportunidades.
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“As sociedades de advogados são, ainda hoje, um mundo muito masculino nos lugares decisórios”
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