“Esta é a grande oportunidade que temos para incorporar uma cultura de mudança na Justiça”

O MJ, o ISEG e a Nova SBE assinam esta sexta-feira um protocolo para dar formação a dirigentes e gestores de projetos do PRR. O Secretário de Estado, Pedro Tavares, explicou ao ECO em que consiste.

Polícia Judiciária, Instituto de Registos e Notariado, Conselho Superior da Magistratura e Procuradoria-Geral da República são algumas das entidades abrangidas, num total de 18 instituições do setor. A Justiça tem 267 milhões de euros para aplicar no âmbito do PRR. O Governo explica que o investimento na capacitação dos recursos humanos da Justiça é um dos eixos do Plano de Transformação da Justiça.

Sob o nome LAB Justiça, o programa de formação, que terá um custo para o ministério de cerca de 250 mil euros — vai abranger uma centena de dirigentes e gestores de projetos do PRR. Com três eixos fundamentais: gestão estratégica, transição digital e liderança em contexto de mudança.

De forma sucinta, o que vai ser este programa LAB JUSTIÇA?

O LAB JUSTIÇA é um programa avançado de competências para os dirigentes e gestores de projeto da Justiça, nomeadamente no âmbito do PRR, que responde aos desafios de inovação, gestão, mudança e liderança. O objetivo é que estes líderes possam melhorar a sua capacidade de desenvolver e concretizar os seus projetos. Apesar de estar alavancado no PRR e na sua necessidade de execução, o LAB JUSTIÇA não se esgota no Programa de Recuperação e Resiliência. Estas competências podem e devem ser utilizadas de forma mais ampla, incentivando a mudança e a inovação na justiça, não só na componente tecnológica, mas também das pessoas. Este programa pretende responder de uma forma global e integrada a todos os desafios de mudança.

De que forma é que a Justiça, em concreto, pode beneficiar deste programa?

Trata-se de um programa de inovação e cultura que tem como principal desafio incorporar internamente conhecimento e capacidade de gestão de projetos. Ao desenvolvermos projetos de inovação que vão, por exemplo, do ciclo de vida do cidadão ao ciclo de vida da empresa, passando pela desmaterialização dos processos nos tribunais, ou pelo trabalho de comunicação e interação entre os diversos atores da justiça, temos de pensar que esta ação tem de ser desenvolvida com qualidade e com excelência. Deve ser feita a pensar no cidadão e para o cidadão, mas também salvaguardando o trabalho de quem intervém nos processos, promovendo uma melhoria contínua. Para fazermos projetos desta forma, temos de ter competências. Foi por isso que reunimos duas das mais respeitadas instituições de ensino superior na área da gestão, tanto a nível nacional como internacional, o ISEG e a Nova SBE, para criarem um curso “à medida” destas necessidades da justiça, permitindo melhorar não só a qualidade do trabalho, mas também a monitorização do impacto que estas políticas públicas vão ter na justiça.

Quem são os destinatários em concreto?

Este programa destina-se aos dirigentes e gestores de projetos, nomeadamente na área tecnológica, mas também a dirigentes de outras áreas em que identificámos a necessidade de haver conhecimento de gestão, de gestão de equipas e mais competências ao nível do acompanhamento de projetos.

Um dos pilares desta formação é a Transição Digital. A Justiça ainda está muito aquém do pretendido nesse campo?

A justiça sempre se pautou por ser uma das áreas que mais investiu na transição digital. Na primeira década deste século, Portugal foi um dos primeiros países a implementar a tramitação eletrónica nos tribunais, fomos dos primeiros a disponibilizar balcões integrados, como a empresa na hora, o balcão das heranças e partilhas, o casa pronta. O cartão de cidadão foi uma das iniciativas mais emblemáticas do Simplex. A Justiça sempre foi um exemplo de boas práticas nesta área. Mas agora o desafio é conseguirmos acompanhar a velocidade da transição digital e a maior exigência do cidadão na interação com os serviços. Para que a este processo seja feita para fora, também temos de fazer um trabalho profundo nas nossas organizações, interiorizando que a transição digital que é muito mais do que digitalizar, é beneficiar o ecossistema digital no trabalho diário dos serviços.

O MJ diz que já em marcha uma “agenda ambiciosa de reformas e projetos inovadores” na área da Justiça. Pode concretizar?

Esta agenda ambiciosa, que se alicerça num um investimento de 267 milhões de euros do PRR, inclui a execução de medidas que vão desde a área dos tribunais – e em especial a tramitação digital em todas as instâncias – ao trabalho na justiça administrativa e fiscal – uma área que precisa de mais instrumentos que contribuam para uma maior eficiência. Queremos melhores instrumentos de gestão, melhores interfaces para os magistrados, para as secretarias, para os cidadãos e para os mandatários. Estamos muito empenhados na diminuição dos custos de contexto para as empresas e em tornar os serviços cada vez mais integrados para os cidadãos. Também na investigação criminal estamos a dotar a Polícia Judiciária de meios que permitam responder aos desafios de hoje, por exemplo, na área da cibercriminalidade.

A ideia surgiu como? Através do exemplo europeu?

Na administração pública, muitas vezes por falta de recursos ou até mesmo por falta de tempo, é necessário recorrer a serviços externos para executar projetos. O que concluímos foi que, para que esses projetos tenham continuidade e sejam apropriados pela própria administração pública e pelos seus trabalhadores, é necessário capacitação. No caso concreto da Justiça, abordando dimensões ligadas, por exemplo, à inteligência artificial, gestão da informação ou transparência.

Os juízes – representados pelo CSM -são conhecidos por ser uma classe muito fechada o seu casulo. Esta é também uma forma de ajudar a abrirem-se mais às novas realidades?

Os magistrados têm sido agentes e intervenientes principais da transformação tecnológica da justiça, desde o início. Aliás, tanto o CITIUS como o SITAF foram desenvolvidos com o contributo dos oficiais justiça e dos próprios magistrados. Também o Magistratus, o novo interface para os magistrados, foi totalmente desenvolvido no seio de um grupo de trabalho constituído por magistrados. Três das entidades participantes neste primeiro programa são precisamente o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior dos TAF e a Procuradoria-Geral da República. Mas este trabalho não termina aqui, é necessário que essa formação ao nível da transição digital ocorra logo na formação dos auditores, no Centro de Estudos Judiciários, para que quando ingressarem na carreira possam eles próprios ser agentes de mudança.

De que forma é que o PRR pode vir a ajudar, de uma vez por todas, as condições de trabalho dos serviços na área da Justiça?

O PRR pode ajudar a aumentar o conhecimento que temos da gestão de atividades nos tribunais e a identificar as tarefas que podem ser automatizadas, por necessitarem de menor intervenção dos funcionários, por exemplo. Também vai contribuir para que, através da tecnologia, tenhamos mais informação, nomeadamente sugestão de legislação relevante na consulta de um determinado processo ou a geração de jurisprudência. Nos registos, muito do trabalho pode também ser melhorado através das tecnologias, com o maior robustecimento tecnológico e automatização dos serviços às empresas e aos cidadãos.

E, numa perspetiva mais macro, de que forma pode mudar a Justiça?

A transformação da Justiça deve ser iniciada por dentro, com excelência, qualidade de serviço. Esta é a grande oportunidade que temos para incorporar uma cultura de mudança na Justiça.

Qual é, para si, a principal aposta urgente que a nossa Justiça e tribunais precisam em contexto digital?

É muito relevante melhorar a gestão de atividades e afetação de recursos e tornar a gestão mais eficiente no dia-a-dia dos tribunais.

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