Vice-presidente da Square AM acredita ser "difícil" que o mercado imobiliário desvalorize com o aumento das taxas de juro.
O fundo imobiliário CA Património Crescente, gerido pela Square Asset Management (Square AM), venceu pelo 12.º ano consecutivo o prémio MSCI European Property Investment Awards, pelo portefólio imobiliário nacional com a melhor rentabilidade – 7,8%.
Em entrevista ao ECO, Pedro Coelho, vice-presidente da Square AM, fala da estratégia dos últimos 16 anos do fundo, do estado atual do mercado imobiliário e da evolução das taxas de juro.
O CA Património Crescente foi eleito o melhor fundo imobiliário do país pelo 12.º ano consecutivo. Qual é o segredo?
Não há muitos segredos. O segredo é, obviamente, muito trabalho, muito esforço, uma equipa grande e conhecedora, que está no mercado há muitos anos, e isso ajuda a ter acesso às melhores oportunidades. Para comprar e gerir bem os imóveis, tê-los sempre arrendados, com bons inquilinos e com contratos longos. No meio destes 12 anos, já passámos por duas crises [crise financeira e a pandemia], em que fomos o único fundo do mercado que teve sempre mais subscrições do que resgates. Não vou dizer que temos saudades do Covid, mas esta altura é, se calhar, muito mais desafiante do que antes devido à guerra, à inflação e às taxas de juro.
E há algo em que acho que somos diferentes dos outros. Costumo dizer que em Portugal pode ter-se um imóvel muito bem localizado, mas se houver um mau inquilino não se consegue rentabilizá-lo ou demorámos muito tempo para o rentabilizar. E um fundo aberto não se compadece com muito tempo para rentabilizar o imóvel, tem de ter permanentemente rentabilidade. E, desse ponto de vista, achamos que é mais seguro ter um imóvel eventualmente menos bem localizado, mas com um bom inquilino e um contrato longo, do que ter um imóvel, em teoria, melhor localizado e com um contrato mais curto ou com um mau inquilino.
Porque é que investir num fundo imobiliário é uma boa opção?
Primeiro de tudo é importante perceber porque é que deve aplicar dinheiro em qualquer tipo de veículo. Historicamente, os portugueses aplicavam dinheiro em depósitos a prazo ou, no limite, na bolsa. E desde há 30 anos que existem fundos de investimento de várias categorias.
Os fundos imobiliários têm a grande vantagem de ter muito pouca correlação com tudo o resto. Ou seja, enquanto os fundos mobiliários acabam por ter sempre alguma correlação com o mercado de capitais e etc., nos fundos imobiliários o ativo subjacente é outro completamente diferente. Não vou dizer que não há nenhuma relação com a economia, porque obviamente existe, mas é muito menor e é mais estática. Portanto, a vantagem é que é um produto historicamente seguro, no sentido em que tem pouca volatilidade. E o imobiliário é uma classe de ativos que os portugueses gostam por natureza.
O que é que fizeram este ano em termos de aquisições?
Fez-se e ainda se estão a fazer. Comprámos uma plataforma logística em Sintra, numa operação de sale&leaseback com a Inapa. E comprámos 11 postos de combustível em Espanha, arrendados à Eroski – que é a cadeia número três de supermercados em Espanha –, dos quais oito são no País Basco. É um contrato longo e foi uma boa operação.
Estamos com várias operações em due diligence e contamos ainda em outubro fechar duas operações. Às vezes aparecem umas oportunidades de fim de ano, mas diria que andará à volta dos 30 milhões de euros [de investimento disponível].
E ainda se vai fechar mais alguma operação até ao final do ano?
Sim, estamos com várias operações em due diligence e contamos ainda em outubro fechar duas operações.
Estamos a falar de quanto investimento disponível?
Às vezes aparecem umas oportunidades de fim de ano. Mas diria que andará à volta dos 30 milhões de euros.
Chegaram a Espanha em 2021, com a aquisição de dez supermercados, e entretanto já fizeram mais investimentos.
Começámos a pensar que Espanha era um mercado natural de crescimento porque é aqui mesmo ao lado. Ou seja, da mesma maneira que gerimos ativos em Lisboa e no país todo, Espanha era um mercado natural. Claro que houve um estudo grande, principalmente da parte fiscal, porque na prática não há ainda harmonização fiscal na Europa e, portanto, a fiscalidade é diferente consoante os países e o veículo que compra. Por outro lado, o objetivo era adquirir imóveis em Espanha que aumentassem a rentabilidade do fundo.
O que ouvíamos muito era que em Espanha as yields eram mais baixas do que cá e, em teoria, sabíamos que ia ser mais difícil adquirir imóveis lá. De qualquer modo, sempre achámos que nessa diferença de estratégia de investimento, haveria, se calhar, boas oportunidades em Espanha.
Além disso, tipicamente em Espanha, há muitos investidores estrangeiros e quase todos querem estar em Madrid e, eventualmente, em Barcelona. Mas Espanha tem cerca de 20 cidades grandes e, dentro dessa filosofia, achámos que era possível encontrar oportunidades. E a certa altura apareceu um portefólio de cerca de 20 milhões de euros – é um valor grande demais para os pequenos investidores, mas pequeno demais para os grandes, que não se mexem só por 20 milhões. Portanto, foi um bom valor para nós. Conseguimos fazer a proposta e comprar com uma yield superior ao que se consegue neste momento comprar cá supermercados.
Qual é o ativo “mais valioso”, ou joia da coroa, do fundo?
Não há joias da coroa. Muitos concorrentes gostam de ter os chamados “ativos troféu” e, às vezes, pagam um absurdo para ter um imóvel que fica muito bem na brochura. Nós temos 25 mil participantes [no fundo] – a grande maioria não conhecemos porque é a rede do Crédito Agrícola que os capta – e como não conhecemos não temos de estar a mostrar ativos troféus, porque se eles não estiverem satisfeitos com a rentabilidade resgatam e vão-se embora.
Portanto, nós temos é de trabalhar para manter o fundo rentável e, desse ponto de vista, não precisamos de ter ativos sexy. Claro que, se olharmos para a carteira, temos muitos ativos com bastante liquidez porque têm bons inquilinos, contratos longos, estão bem localizados, etc.
Como é que se ultrapassam dois anos de pandemia?
Em termos de gestão da carteira, foi um trabalho muito intenso, especialmente nos setores mais afetados, nomeadamente nos centros comerciais, ginásios e hotéis. Houve, mesmos nos outros setores, uma relação mais intensa com os inquilinos e vários casos em que, mesmo não sendo obrigatório dar diferimento das rendas, nós fizemo-lo, porque felizmente não tínhamos problemas de tesouraria.
No todo, face à qualidade dos inquilinos que temos, saímos muito airosamente da questão. Claro que se olharmos para a rentabilidade, 2020 só deu 3,6% e 2019 deu 5,5%. Mas se pensarmos que foi um ano Covid, com taxas de juro a zero, 3,6% continua a ser uma boa rentabilidade. Aliás, o fundo cresceu 9% em 2020 em ativos sob gestão.
Temos de trabalhar para manter o fundo rentável e, desse ponto de vista, não precisamos de ter ativos sexy. Claro que, se olharmos para a carteira, temos muitos ativos com bastante liquidez porque têm bons inquilinos, contratos longos, estão bem localizados, etc.
Houve muitos resgates durante esses dois anos de Covid?
Pela primeira vez em 17 anos, tivemos dois meses negativos, ou seja, em que houve mais resgates do que subscrições – embora esses resgates tenham a ver com a tal “janela”. Começou o confinamento e tínhamos uma “janela” que começava a 30 de março e, portanto, na segunda quinzena de março houve ali uma multidão [de participantes do fundo] a correr a tirar o dinheiro. Em maio também foi negativa e em junho voltou aos níveis normais.
Porque é que se fizeram mais resgates nessa altura?
Exatamente pela incerteza sobre o futuro. Se os resgates se mantivessem sem janelas e nós a pagarmos a cinco dias não teria havido tantos resgates. As pessoas sentiam que, se precisassem do dinheiro, podiam pedi-lo e nós cinco dias depois pagávamos. E, por exemplo, nós não tivemos o saldo negativo, mas notou-se um aumento de resgates quando começou a guerra na Ucrânia.
De que forma é que a evolução das taxas de juro pode influenciar o fundo?
Antes de mais, em termos negativos. Obviamente que a taxa de juro é uma variável muito importante para muita coisa nas nossas vidas. Em primeiro lugar tem a ver com os créditos que nós e as empresas temos – vamos pagar mais aos bancos e vamos ter menos capacidade de investimento ou de poupança. E tendo menos capacidade de poupança virá menos dinheiro para os fundos. Além disso, neste momento, adivinha-se uma recessão e, com isso, haverá aumento do desemprego, algum incumprimento do crédito à habitação e, mais uma vez, é natural que haja mais resgates.
Por outro lado, é natural que à medida que as taxas de juro têm vindo a aumentar, os bancos portugueses – que, felizmente, estão melhor preparados do que estavam na crise financeira – têm mais depósitos do que crédito. Por isso é que as taxas de juro têm vindo a aumentar, mas os bancos praticamente ainda não subiram taxas para remunerar depósitos e ainda há muitos bancos que estão com as taxas a zero. E, desse ponto de vista, os fundos continuam a ser uma aplicação atrativa. Mas a partir do momento em que os bancos comecem a dar nos depósitos a prazo um montante maior de juros, é natural que haja pessoas que prefiram ter o dinheiro num depósito a prazo porque a taxa é garantida. E os fundos não garantem capital.
Acredita que a subida dos juros poderá fazer o mercado imobiliário desvalorizar?
Acho um bocado difícil. No mercado residencial, na Grande Lisboa e no Grande Porto, os preços atingiram valores por metro quadrado acima dos valores anteriores à crise financeira. Mas, na prática, o que acontece é que a maioria dos compradores são estrangeiros e não recorre a crédito bancário. Portanto, no centro, não havendo aumento da oferta de projetos por licenciar, acho difícil que os preços caiam.
Eventualmente nas zonas periféricas pode começar a haver algum incumprimento, porque aí sim, são zonas em que houve mais pessoas a pedir crédito à habitação, mas não anteviram uma espécie de taxa de sensibilidade para perceber se ainda conseguiam pagar a prestação se as taxas de juro subissem. E pode haver aí algum aumento de incumprimento que possa trazer algum produto para o mercado a um preço, eventualmente, mais baixo.
O BCE não vai deixar os bancos terem um volume tão grande de imóveis no balanço. Portanto, os bancos terão, obrigatoriamente, de colocar os imóveis no mercado mais rapidamente. E isso é saudável para a economia.
Mas outra coisa que irá acontecer é que o BCE não vai deixar os bancos terem um volume tão grande de imóveis no seu balanço. Portanto, os bancos terão, obrigatoriamente, de colocar os imóveis no mercado mais rapidamente. E isso é saudável para a economia, porque liberta os bancos de terem os imóveis, e recoloca os imóveis para uso. Assim, acho difícil que o mercado imobiliário desvalorize. A diferença para a crise financeira de 2008 é que Portugal está mais no mapa em termos de procura. Basta haver alguma afluência de estrangeiros que é suficiente para fazer os preços mudar.
Já na parte não residencial, os preços não atingiram os valores de antes de 2007.
Não atingiram ou ainda não atingiram?
Há casos pontuais, mas em termos médios não. Como sabemos a economia não cresceu assim tanto e, portanto, os ocupantes pagam o que podem ocupar para a exploração ser rentável. Se não podem pagar mais, não pagam. Só há muito pouco tempo é que as rendas de escritórios começaram a subir.
Até 2017, ainda estavam abaixo de 2007. E só nessa altura, ligeiramente antes do Covid, é que começaram a ser construídos edifícios de escritórios especulativamente. Porque até aí, os poucos edifícios de escritórios que tinham sido construídos eram feitos para o consumidor final, não havia uma construção para o mercado. Portanto, os preços por metro quadrado ainda não atingiram valores tão grandes em todos os setores.
O imobiliário comercial vai continuar a atrair investidores internacionais?
Havendo uma recessão vai atrair menos investidores estrangeiros porque, no fundo, há menos liquidez. Aliás, já se está a sentir que a liquidez está a diminuir. Mas, lá está, a vantagem que se calhar temos face a 2008 é que, embora no total haja menos dinheiro, eventualmente a alocação para Portugal é superior ao que era nessa altura, porque há interesse de as empresas estarem em Portugal. Portanto, os investidores vão continuar a estar aqui, até porque têm cá yields mais altas do que no centro da Europa.
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“Fundos continuam a ser uma aplicação atrativa” mesmo com a subida das taxas de juro, diz Pedro Coelho
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