João Caldeira e Francisco Xavier de Almeida, sócios de Corporate M&A da CMS, estiveram à conversa com a Advocatus sobre o mercado português, europeu e as expetativas para 2023 em M&A.
João Caldeira e do Francisco Xavier de Almeida, sócios de Corporate M&A da CMS, estiveram à conversa com a Advocatus sobre o estado do setor de M&A e perspetivas para 2023.
João Caldeira (JC), sócio fundador da CMS Rui Pena & Arnaut, desenvolve a sua atividade maioritariamente na área das sociedades comerciais, fusões, aquisições, reestruturações societárias, capitais de risco, joint ventures, mercado de capitais e corporate finance. Lidera equipas multidisciplinares em transações de elevado perfil, domésticas e transfronteiriças.
Francisco Xavier de Almeida (FXA), membro do Conselho de Administração e membro do Comité Executivo, integra a CMS Rui Pena & Arnaut desde 2007. Desenvolve a sua atividade maioritariamente nas áreas de corporate / M&A e direito bancário e financeiro, em particular em operações de fusão & aquisição, privateequity, financiamentos de aquisições, emissão de obrigações, ofertas públicas, titularização de créditos e produtos estruturados. Tem também experiência em situações especiais, reestruturações e transações envolvendo distressed assets e non-performing loans. É especialista em corporate / M&A e de valores mobiliários e co-head da área de Corporate / M&A da CMS Rui Pena & Arnaut.
Que balanço fazem em relação ao ano que está prestes a terminar, no que diz respeito ao M&A, em Portugal?
JC – Foi um ano com desafios diferentes daqueles que estávamos à espera, mas globalmente correu bem. Estivemos, como nos anos anteriores, sempre com um grande workflow. Houve um acréscimo de trabalho depois do verão, que se tem mantido até agora. Contudo, alguns negócios foram mais difíceis de concretizar, fruto de questões que surgiram em virtude do paradigma económico que vivemos. Em alguns casos houve mesmo transações que foram suspensas em consequência do aumento de custos resultante da guerra na Ucrânia e do aumento da inflação, concretamente no setor industrial que está a sofrer bastante com a subida dos preços da energia e, como tal, ficou mais vulnerável do que outros setores.
E no que diz respeito ao M&A a nível Europeu?
FXA- Depois de um 2021 extremamente dinâmico na Europa, podemos afirmar que 2022 foi um ano de “normalização”. É uma perceção que já tínhamos, mas que ficou comprovada no estudo que a CMS publica todos os anos: o CMS European M&A Outolook, que reflete a opinião de mais de 300 clientes. Esta “normalização”, podemos afirmar, é compreensível, tendo em conta que, há um ano atrás, o crescimento económico estava em plena expansão, impulsionado pela recuperação da procura por parte dos consumidores e pelo regresso à atividade comercial, tornado possível pelo recuo da pandemia do Covid-19.
Depois, como sabemos, à inflação veio juntar-se a guerra na Ucrânia, que tem criado pressões elevadas nos preços em geral. Todo este panorama veio diminuir os níveis de dinamismo. Ainda assim, a conclusão a que chegámos foi que, não obstante as vicissitudes que estamos a viver, e o facto de haver algum sentimento de cautela quanto ao futuro, a verdade é que as grandes empresas e as firmas de private equity continuam com liquidez e vontade de investir, o que esperamos que dê algum dinamismo ao mercado. A expectativa de flexibilização nas avaliações de empresas terá aumentado o apetite dos investidores que procuram ativos específicos e é expectável que o setor TMT continue a destacar-se.
Contudo, não podemos esquecer que nos próximos 12 meses os custos vão continuar a subir e o serviço de dívida será ainda mais caro, o que provavelmente fará com que haja mais seleção nos investimentos que vão ser feitos e uma maior procura por empresas que gerem resultados sólidos e tenham modelos de negócios robustos, em paralelo com um aumento de atividade no mercado de distressed assets.
De que maneira o contexto (inflação e guerra na Ucrânia) foi pesando ao longo do ano?
JC – Como referimos anteriormente, assistimos a operações que não foram concluídas e houve mesmo investidores que suspenderem os seus processos de investimento devido a um aumento súbito da estrutura de custos das empresas target que, por sua vez, não conseguiram compensar esse aumento com um acréscimo de receita, levando a uma redução das respetivas margens, o que as tornou menos interessantes. Por outro lado, notámos alguma retração de clientes no outsourcing e uma maior preocupação com os custos, o que naturalmente afeta os escritórios de advogados.
Para além disso, a subida dos custos de serviço de dívida, pela primeira vez em muitos anos, e o fim das medidas de estímulo implementadas pelos Governos durante a pandemia, criarão alguma pressão adicional, o que poderá levar a que empresas com balanços menos sólidos tenham que promover vendas de ativos (corporate carve-outs) para gerar liquidez.
Que setores de atividade tiveram melhor desempenho este ano?
FXA – Com base na nossa experiência, podemos afirmar que as áreas com um desempenho assinalável, foram os setores de energia, alavancado pelo investimento em energias renováveis. Também o imobiliário, em contraciclo com o que vemos noutras jurisdições onde a CMS também está presente, registou um ano com um bom desempenho, continuando a atrair muito investimento, com grande enfoque nos portfolios de residencial e escritórios. Por fim, queremos realçar a área de TMT onde o volume de transações cresceu.
E que áreas abrandaram?
JC – Assistimos a algum abrandamento especialmente no setor industrial, fruto dos custos com energia. A nível europeu existiu igualmente algum abrandamento noutros setores como life sciences e consumer.
Que perspetivas têm para 2023?
FXA – A expectativa é que iremos assistir a um abrandamento das economias, o que, inevitavelmente, se fará sentir no mercado de M&A, em especial a partir do segundo trimestre de 2023. Para além disso, a subida dos custos de serviço de dívida, pela primeira vez em muitos anos, e o fim das medidas de estímulo implementadas pelos Governos durante a pandemia, criarão alguma pressão adicional, o que poderá levar a que empresas com balanços menos sólidos tenham que promover vendas de ativos (corporate carve-outs) para gerar liquidez. Como resultado, o mercado dos distressed assets deverá ficar ainda mais ativo. Todo este enquadramento permitirá às firmas de private equity, que têm bastante experiência em situações de turnaround, aproveitar oportunidades que vão surgir e esperamos que esta dinâmica compense o abrandamento geral fruto das condições acima referidas.
De que maneira estão os clientes a reagir ao clima de incerteza?
JC – Os clientes reagem de maneira diferente consoante as suas circunstâncias, perfil e setor em que operam. Temos clientes que continuam bastante ativos e à procura de boas oportunidades de investimento, clientes que começam a delinear estratégias de venda de ativos, e outros que estão a suspender decisões ou negócios à espera que o mercado estabilize. A negociação das transações será cada vez mais difícil devido a um mismatch de expectativas de vendedores e compradores (algo que já vimos no passado) e os investidores vão ter que estar preparados para enfrentar e gerir estes cenários. Tudo isto fará com que seja necessário implementar estruturas transacionais mais criativas, como por exemplo, cláusulas de pagamento de preço diferido sujeito a determinadas milestones como forma de gerir o risco dos negócios e oferecer resultados mais equilibrados para todas as partes.
Qual tem sido o papel da equipa de M&A da CMS nos projetos de M&A em Portugal?
FXA – Acompanhamos os nossos clientes nos temas jurídicos que se suscitam durante todo o processo de compra, venda ou reorganização de um negócio. Por outro lado, o facto de na CMS estarmos organizados por setores de atividade permite-nos conhecer bem a atividade dos nossos clientes e ser parceiros de negócio e assessores estratégicos, papel que vai muito para além do mero aconselhamento jurídico. O facto de também estarmos inseridos numa estrutura internacional, com presença em mais de 40 países, permite-nos estar mais perto dos investidores, o que é uma vantagem face à maioria da concorrência, tendo em conta que grande parte do capital investido é estrangeiro.
Temos clientes que continuam bastante ativos e à procura de boas oportunidades de investimento, clientes que começam a delinear estratégias de venda de ativos, e outros que estão a suspender decisões ou negócios à espera que o mercado estabilize.
Qual o perfil atual dos investidores que procuram o nosso país para este tipo de operações?
JC – O perfil é diversificado. Desde firmas de private equity, grandes empresas, family offices, empresas de menor dimensão e até investidores individuais que passaram a residir em Portugal e querem investir no nosso país.
Quais devem ser as apostas estratégicas de Portugal para o seu futuro?
FXA – Implementar soluções que promovam a capitalização das empresas e que lhes permitam ganhar dimensão e escala (essencial dado a composição do tecido económico português caracterizado por empresas de pequena e média dimensão); apoiar o financiamento às empresas através de uma maior eficiência na distribuição dos fundos comunitários e apoio ao desenvolvimento, exportação e tecnologia; um regime fiscal competitivo, simples e estável que possa atrair mais investimento, uma redução da burocracia que ainda existe a muitos níveis e que dificulta a realização de negócios em Portugal e mudanças ao nível do sistema de justiça para a tornar mais acessível e célere.
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Sócios de M&A da CMS: “Grandes empresas e as firmas de private equity continuam com liquidez e vontade de investir”
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