Farmacêutica MSD diz que “investimento em Portugal segue inalterado” apesar das tarifas

Grupo norte-americano, em Portugal há mais de 50 anos e com 47 estudos clínicos no país, vai lançar um tratamento para hipertensão pulmonar em 2026. Diretor descarta impacto das tarifas na I&D.

A farmacêutica norte-americana MSD – Merck Sharp & Dohme, que está em Portugal há 55 anos através da filial MSD, conta com quase 50 estudos clínicos a decorrer no mercado nacional e garante que o grupo irá manter o investimento, sobretudo em Investigação e Desenvolvimento (I&D), mesmo no contexto da guerra comercial que também impacta a indústria dos medicamentos.

Em entrevista ao ECO, o diretor-geral da MSD Portugal diz que a empresa com escritórios em Paço de Arcos vai lançar no mercado um tratamento para hipertensão arterial pulmonar em 2026. “A operação portuguesa é bastante relevante, uma das principais subsidiárias dentro da Europa”, afirma Mario Ferrari.

A MSD Portugal vende medicamentos oncológicos e vacinas. Quando preveem lançar uma nova no mercado? Atualmente, quantos estudos clínicos têm no país?

O nosso critério para o pipeline é desenvolver medicamentos para necessidades que não têm resposta. Este ano estamos muito próximos de lançar mais um tratamento. Será na área de hipertensão pulmonar, na qual há mais de dez anos que não havia inovação. Ainda está em avaliação, já existe um PAP [Programa de Acesso Precoce a medicamentos] aberto para pacientes que necessitem possam ter acesso, mas a previsão é para o início do ano que vem. Na área de I&A, a MSD é a terceira maior empresa com estudos clínicos ativos em Portugal, sendo a número um na área de oncologia, onde temos um pipeline bastante extenso. Temos, neste momento, 47 estudos clínicos ativos.

O número tem sido consistente? Considera que há condições favoráveis para esse desenvolvimento da indústria?

Mais do que consistente, tem sido um número crescente. O nosso trabalho aqui em Portugal tem sido mostrar o quão competitivo o país é frente aos outros países europeus. E temos conseguido fazê-lo com relativo sucesso. A estratégia futura é continuar a atrair mais I&D.

Sabendo de antemão que está limitado na partilha de valores, além dos globais do grupo, como é que tem evoluído o negócio da MSD Portugal?

O principal investimento nesse momento é na I&D, porque é, do nosso ponto de vista, uma área onde podemos dar uma contribuição ao sistema de saúde bastante relevante. Ganha o paciente, ganha o sistema de saúde e é uma área prioritária para a MSD. Não consigo divulgar os números totais da investigação, mas é o nosso maior investimento. É uma operação bastante relevante para o contexto europeu, uma das principais subsidiárias dentro de um cluster de subsidiárias que atua na Europa. O modelo que temos em Portugal é integrado e universal, o que nos dá oportunidade de trabalhar conjuntamente com o Governo em parcerias estratégicas. No tema da vacinação de que falávamos há pouco, Portugal é um dos países onde a vacinação se destaca na Europa. Desde o início que estamos no PNV, há quase 60 anos, portanto tivemos momentos em que fomos capazes de eliminar o sarampo ou a rubéola. Agora há uma meta europeia que é a eliminação dos cancros associados ao HPV [vírus do papiloma humano] e nós estamos muito próximos de construir um projeto como esse. É uma prioridade do Governo português e da MSD.

Estamos muito próximos de construir um projeto na área da eliminação dos cancros associados ao HPV, que é uma prioridade da UE, do Governo português e da MSD

Qual é o vosso portefólio de vacinas no PNV? Há perspetiva de em breve terem mais alguma comparticipada pelo Estado?

Temos cinco vacinas no PNV e vacinamos cerca de 400 mil pessoas por ano. As mais importantes são para o HPV e o sarampo, mas já tivemos doença pneumocócica. Além dessas, temos para rotavírus e hepatite. Em 55 anos tivemos sempre uma forma de trabalho muito conjunta com qualquer dos governos. Para nós, o mais importante é sempre a estratégia do governo. O plano de vacinação continua a ser uma prioridade. Também temos colaborado com hospitais e com Administração Pública.

A oncologia é a área de negócio com mais peso na Merck a nível internacional. Apesar desta predominância das vacinas em Portugal, a faturação com os fármacos para o cancro supera-a, em linha com o grupo?

Sim, é a área mais relevante.

No ano passado, só as vendas do famoso Ozempic – para tratamento da diabetes e, como efeito paralelo, perda de peso – contribuíram com mais de 16 mil milhões para a Novo Nordisk, que se tornou na empresa mais valiosa da Europa e, entretanto, foi perdendo valor. O pensa sobre os ‘blockbusters’ desde mercado?

Primeiro, na MSD temos uma estratégia muito clara de desenvolvimento de medicamentos. Investimos uma parte muito significativa da faturação na I&D e temos o desenvolvimento pautado na premissa de encontrar soluções inovadoras para doenças que ainda são muito graves. Segundo, a nossa preocupação é a sustentabilidade do sistema.

Para essa sustentabilidade é necessário haver disponibilidade de medicamentos. Logo após o apagão, o bastonário da Ordem dos Farmacêuticos alertou que haveria uma rutura no fornecimento caso a falha energética durante mais horas, por não haver uma reserva estratégica nacional, o que foi contestado pelo Infarmed. Qual é a sua opinião?

Não só nesse episódio, como noutros, sempre nos preparámos para garantir que em qualquer momento de stress conseguíamos fornecer medicamento. Desta vez não foi diferente. Não tivemos nenhum problema nem rutura devido ao apagão. A primeira atuação foi garantir que a cadeia de fornecimento estava toda montada e a operar. Não sabíamos o tempo de duração, mas sabíamos que conseguiríamos abastecer o mercado por um tempo suficiente. Sobre a reserva estratégica de medicamentos, temos de confiar que as autoridades têm a visão e a estratégia correta.

Quanto tempo vos restava?

Varia de área para área.

Não tivemos rutura de medicamentos no apagão. Garantimos que a cadeia de fornecimento estava toda montada. Não sabíamos o tempo que ia durar, mas sabíamos que conseguiríamos abastecer o mercado por um tempo suficiente

Além do apagão, este seu primeiro ano enquanto diretor-geral da MSD fica marcado pela guerra comercial e ameaça de tarifas ao setor farmacêutico. A política protecionista da Casa Branca levou a que concorrentes europeias como AstraZeneca, Johnson & Johnson, Roche e Novartis anunciassem planos de investimento nos Estados Unidos. Que análise faz ao acordo com a União Europeia (UE)?

Sendo uma empresa americana com atuação global, temos capacidade produtiva e investimento significativo quer nos Estados Unidos quer na Europa. O nosso investimento em investigação mantém-se inalterado, a ser uma área prioritária para a empresa e onde vamos investir bastante esforço para continuar a manter Portugal como um dos países mais competitivos.

Precisamente por ter sede nos Estados Unidos, e não ter de fazer o mesmo que as farmacêuticas de raiz europeia, a Europa poderia ser mais descartada pelo grupo. Continua em jogo?

A estratégia da MSD continua inalterada para Portugal, garantindo que temos investimento aqui, que nos mantemos a fornecer medicamentos e a trazer inovações. Olhamos sempre para o contexto europeu como um todo.

A vossa estratégia de fusões e aquisições também permanece deste lado do Atlântico. Ainda no início de julho, a Merck anunciou a compra da britânica Verona Pharm por cerca de 10 mil milhões de dólares (8,5 mil milhões de euros). Existem empresas da UE no radar?

Todo o nosso modelo de compras é feito centralmente através dos headquarters. É um tema global. O que eu posso dizer é que a MSD procura oportunidades dentro das necessidades médicas que precisam de resposta sem um alvo específico de um país específico. Sobre o nosso pipeline futuro, temos mais de 100 programas em fase 1, 2 e 3 e, dessa centena de programas, há uma parte muito significativa na oncologia, sem ser só a imunoterapia, que hoje é a principal área de atuação, mas já com algumas combinações e outros agentes. Também passámos a olhar para áreas como doenças cardiovasculares, que é uma necessidade médica ainda sem resposta nalguns segmentos.

Mario Ferrari, diretor-geral da MSD Portugal, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Sem capacidade de resposta estão também os hospitais. Qual a solução para este contexto dos cuidados de saúde, em que falham as urgências e crescem os seguros?

Vejo o tema do acesso aos cuidados de saúde como o da sustentabilidade que mencionei antes. Do nosso lado, o compromisso é trazer as inovações que são relevantes para o sistema e que precisam ser sustentáveis para que o doente receba o tratamento seja privado ou público.

Mas concorda com o reforço das parcerias público-privadas?

Qualquer modelo que cumpra a missão de dar resposta e acesso aos doentes é válido. Portugal tem pluralidade.

E com as imposições da diretiva europeia dos tratamento de águas residuais urbanas, que penaliza os fabricantes de medicamentos e o custo final?

O nosso posicionamento é alinhado com o da EFPIA – Federação Europeia das Associações e de Indústrias Farmacêuticas: ter um debate que olhe para detalhes importantes. Acreditamos numa política de poluidor pagador, desde que isso seja feito com nível de discussão que permita entender quem de facto é o poluidor e quem traz impacto nos resíduos. Olhar exatamente para os detalhes em cada um dos segmentos, para qual é o produto e o produtor que geram impacto.

A legislação em causa, chamada ‘Wastewater’, deve ser transposta até 31 de julho de 2027. A avançar como está, fará subir as vossas tabelas de preços?

Não lhe saberia dizer neste momento o impacto no custo do tratamento. As discussões têm que ser, até que avance para uma política, mais bem entendidas.

Acreditamos numa política de poluidor pagador, desde que haja uma discussão detalhada que permita entender quem de facto é o poluidor e qual o impacto que traz nos resíduos

Entrevista atualizada a 18-08-2025 com retificação de “tratamento” em vez de “vacina”

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