Com 140 trabalhadores e 3.800 entregadores em Portugal, a Glovo critica as alterações na Lei de Trabalho portuguesa que antecipam a Diretiva Europeia das plataformas digitais.
Num momento em que ainda se aguarda a formulação final da Diretiva Comunitária para regular as relações das plataformas digitais com os estafetas ou motoristas, no final de 2022 foi aprovado no Parlamento português alterações à Lei de Trabalho, no âmbito da Agenda do Trabalho Digno, que impacta este setor.
O objetivo é acabar com os falsos trabalhadores independentes e dar maior segurança laboral às pessoas que trabalham para este tipo de plataformas, mas para Joaquín Vázquez, general manager de Portugal da Glovo, a adaptação das plataformas à futura lei de trabalho portuguesa representa um gasto de tempo e recursos porque o diploma, com a futura adaptação da Diretiva, tornar-se-á “obsoleto em menos de nada”.
“(Adaptar ao diploma português) quando a Diretiva Europeia for implementada será tempo investido em algo que ficará obsoleto muito rapidamente”, diz o general manager da Glovo. O responsável da Glovo lamenta ainda a forma como decorreu o processo, que “poderia ter sido gerido melhor em termos de colaboração entre as diferentes partes”, defendendo a existência de um período de carência, à semelhança da Lei em Espanha, para as plataformas se adaptarem às alterações legislativas.
Em Portugal, a Glovo tem 140 trabalhadores e 3.800 entregadores ligados à aplicação, que ganham em média 7,4 euros por hora. “Há entregadores que ganham muito mais e outros menos, mas em média um entregador em Portugal ganha 7,4 euros por hora. Pensamos que é justo. Depois têm um seguro, estão cobertos quando estão a trabalhar e quando não estão porque tiveram um acidente. Tomamos mesmo conta dos entregadores e penso que nisso somos um exemplo”, revela.
O Governo tem “esperança que seja aprovado este mês na AR” a Agenda do Trabalho Digno.
Um dos desafios para 2023 é o novo pacote legislativo que mexe com a relação dos entregadores com as plataformas digitais. Há uma Diretiva europeia a ser discutida, espera-se a publicação do novo diploma do Parlamento português. Que impacto pode ter na operação?
É ainda cedo para avaliar porque o texto final ainda não foi publicado. Sabemos os contornos da Diretiva, mas está ainda a ser finalizada. Estamos ainda dependentes disso. A ideia de regular era proteger centenas de trabalhos, melhorar as condições destes trabalhadores independentes, mas o que vemos é que isso não está a ir nessa direção. Mais, está a ir contra o que a Europa está a ditar. Por isso, provavelmente, todos teremos de investir tempo e recursos para nos adaptar a uma legislação que será obsoleta em menos de nada.
A ideia de regular era proteger centenas de trabalhos, melhorar as condições destes trabalhadores independentes, mas o que vemos é que isso não está a ir nessa direção, mais está a ir contra o que a Europa está a ditar. Por isso, provavelmente, todos teremos de investir tempo e recursos para adaptar para uma legislação que será obsoleta em menos de nada.
Refere-se ao diploma português?
(Adaptar ao diploma português) quando a Diretiva Europeia for implementada será tempo investido em algo que ficará obsoleto muito rapidamente.
Por último, penso que o processo poderia ter sido gerido melhor em termos de colaboração entre as diferentes partes e deveria haver um período de carência que nos permitisse fazer ajustamentos. Pretendem que, a partir do momento que a Lei é publicada, estejamos prontos e, dependendo das mudanças que teremos de fazer para nos adaptar, pode levar muito tempo. Por isso, estamos desapontados com isso, mas iremos dar o nosso melhor e estaremos preparados.
Que período de adaptação faria sentido, do vosso ponto de vista?
O problema é que não sei as mudanças que preciso fazer. E as mudanças em tecnologia, apesar do que as pessoas possam pensar, levam muito tempo. Penso que, entre três a seis meses seria razoável. A legislação espanhola não é um exemplo do que deveria ser feito, mas é um exemplo no período de carência. Deram às plataformas em Espanha seis meses para se adaptarem, é um tempo justo.
Em França, plataformas e representantes dos trabalhadores acordaram um rendimento mínimo por viagem para os motoristas da TVDE, de mais de 7 euros. Seria um modelo interessante para Portugal?
É um modelo interessante. Através do “Couriers Pledge” (da Glovo) o que tentamos é assegurar que os entregadores têm rendimentos, seguros, ajudando-os a progredir e a crescer. Não sei se um modelo único de que se tem de pagar um montante fixo é possível devido à flexibilidade de muito do staff, mas penso que vai na direção certa do que estes trabalhadores precisam e de proteção dos entregadores.
Há entregadores que ganham muito mais e outros menos, mas em média um entregador em Portugal ganha 7,4 euros por hora. Pensamos que é justo. Depois têm um seguro, estão cobertos quando estão a trabalhar e quando não estão porque tiveram um acidente. Tomamos mesmo conta dos entregadores e penso que nisso somos exemplo.
Carlos Moedas na inauguração do escritório de Lisboa instou a Glovo a cuidar das suas pessoas. Têm feito o suficiente, podiam fazer mais?
Em termos genéricos, podemos sempre fazer mais pelas pessoas, mas penso que nisto a Glovo tem sido pioneira. Cuidamos mesmo das nossas pessoas, não só entregadores, como parceiros e trabalhadores. Monitorizamos em todos os países quanto os entregadores estão a ganhar para garantir que ganham um mínimo.
E nesse ranking onde fica Portugal posicionado? Quanto ganha um entregador da Glovo Portugal?
Posiciona alto. Há entregadores que ganham muito mais e outros menos, mas em média um entregador em Portugal ganha 7,4 euros por hora. Pensamos que é justo. Depois têm um seguro, estão cobertos quando estão a trabalhar e quando não estão porque tiveram um acidente. Tomamos mesmo conta dos entregadores e penso que nisso somos um exemplo.
Vão investir 50 milhões de euros em Portugal, mais 10 milhões do que no ano passado. Quais as prioridades neste ano que se estima desafiante?
Será, de facto, um ano desafiante, por isso as nossas principais prioridades, em termos de investimento, estão focadas em oferecer a opção com os preços mais acessíveis aos nossos utilizadores. Estamos a reduzir as nossas tarifas de entrega, para que ficam o mais baixas possível, e da nossa oferta Prime. A segunda prioridade será garantir que temos o melhor conteúdo para os utilizadores portugueses. Sabemos que a razão para usar uma aplicação e não outra é ter o parceiro favorito e estamos a trabalhar nisso.
Referem expectativas de crescimento na ordem dos 30-40%. Face ao atual momento económico – inflação elevada com quebra de rendimento das famílias –, o que o faz ser tão otimista?
Ao oferecermos a opção mais em conta, e ao termos o melhor conteúdo, acreditamos que mais utilizadores vão começar a usar a Glovo ou repetir mais compras. Não se trata apenas de adquirir novos utilizadores, que nunca experimentaram entregas em casa, e fazer crescer globalmente o mercado, mas também ganhar quota de mercado.
Qual é o objetivo de crescimento de quota? É ser o número 1? Qual é a atual posição?
Temos um objetivo que não posso partilhar. Não há dados de mercado, por isso não sabemos (qual a nossa quota de mercado). O nosso objetivo é manter as nossas taxas de crescimento sabendo que, se as mantivermos, atingiremos as nossas ambições. Temos uma quota relevante de mercado e o investimento que estamos a fazer, está a permitir-nos crescer mais rápido do que a nossa concorrência.
Estão em mais de 100 cidades e querem expandir este ano. Para onde?
Estamos em 132 cidades e cobrimos cerca de 70% da população e vamos expandir para mais duas localizações: Benavente (distrito de Santarém) e Vila Verde (distrito de Braga). Estamos já em cidades com menos de 10 mil habitantes, não há muito mais espaço para continuar a expandir. Vamo-nos focar em consolidar a nossa pegada e crescer nas cidades onde já estamos.
Tentamos sempre ter uma abordagem e uma mentalidade enxuta no que toca ao quadro de colaboradores, por isso, é que estamos muito confiantes que temos a equipa certa e que não vamos precisar de mais, nem menos. Temos as bases para crescer de forma rentável.
O setor tech tem estado agitado, com anúncios de despedimentos afetando milhares de trabalhadores. Pesou na decisão de, neste ano, manter estável o número de colaboradores?
A decisão vem de muito antes. Quando assumi como country manager em outubro de 2021 decidimos qual seria a estrutura perfeita que necessitávamos para dar o melhor serviço aos nossos utilizadores, aos nossos parceiros e aos nossos entregadores. Já a alcançamos. Contratamos de forma massiva durante 2022, agora é altura de estabilizar, crescer através da nossa equipa e investir na equipa. Já somos uma equipa grande (140 colaboradores espalhados pelo escritório de Lisboa e Porto) e não precisamos de mais pessoas.
Quando temos a Microsoft a anunciar um despedimento de 10 mil pessoas, face ao atual momento na economia, com impacto no ecossistema, antecipa em algum cenário uma redução de pessoal na Glovo em Portugal?
Não sei o que se poderá passar. Mas temos muita certeza que a nossa estrutura nos vai permitir crescer de muita forma rentável e saudável. Algumas companhias sobrecarregaram ao nível de pessoal para atingir certos objetivos que requeriam muitas pessoas e agora há um período de quebra e não precisam de tantas, ou então cresceram demasiado num modelo não sustentável.
Tentamos sempre ter uma abordagem e uma mentalidade enxuta no que toca ao quadro de colaboradores, por isso, é que estamos muito confiantes que temos a equipa certa e que não vamos precisar de mais, nem menos. Temos as bases para crescer de forma rentável.
O crescimento será apenas orgânico? No passado compraram a portuguesa Kitch e o Mercadão. Novas aquisições ainda estão em cima da mesa?
A porta está sempre aberta. Portugal já provou já ser uma fantástica fonte de talento. A Glovo tem um compromisso com Portugal, adquirimos Kitch e o Mercadão, não estamos ativamente a negociar com ninguém sobre algum negócio, mas se a oportunidade certa surgir iremos considerá-la.
Estamos constantemente a olhar para este tipo de oportunidades. A ideia, quando compramos estas empresas, não é sequer geri-las – são geridas pelos seus CEO –, queremos é escalar o que construíram para os restantes países onde a Glovo está presente.
Alguma proposta em cima da mesa?
Não, neste momento.
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“Teremos de investir tempo e recursos para nos adaptar a uma legislação obsoleta”, diz general manager da Glovo Portugal
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