As comissões bancárias e os impostos eliminam grande parte dos 5,75% que as novas obrigações da Sporting SAD pagam e, em alguns casos, ser obrigacionista da SAD leonina pode traduzir-se em perdas.
O leão de Alvalade está novamente ao ataque. Depois de acumular até ao momento 69 golos marcados no campeonato nacional que carregaram o clube leonino até à liderança da Liga Portugal Betclic, a Sporting SAD pretende agora brilhar no mercado financeiro através de da sua oitava emissão obrigacionista junto dos pequenos investidores.
De acordo com o prospeto que acompanha a operação pública de subscrição (OPS) das obrigações “Sporting SAD 2024-2027”, a empresa liderada por Frederico Varandas pretende angariar 30 milhões de euros junto dos pequenos investidores para reembolsar parcialmente o empréstimo obrigacionista denominado “Sporting SAD 2021-2024”, que apresenta um saldo-vivo de 40 milhões de euros e que irá vencer a 25 de novembro de 2024, e ainda financiar a atividade corrente da Sporting SAD e servir com reforço de liquidez.
A operação deste empréstimo obrigacionista de três anos e oito meses arrancou a 11 de março e decorrerá até 22 do presente mês, e para convencer os pequenos investidores a tornarem-se obrigacionistas da Sporting SAD, o leão oferece:
- Aos novos credores: o compromisso de pagar uma taxa de cupão anual de 5,75%, pago semestralmente, até 26 de novembro de 2027, através da subscrição das obrigações “Sporting SAD 2024-2027”.
- Aos antigos credores: a possibilidade de os titulares das obrigações “Sporting SAD 2021-2024”, que têm uma taxa de cupão de 5,25%, trocarem esses títulos pelas novas obrigações “Sporting SAD 2024-2027”, e ainda receberem um prémio monetário de 7,802 euros por cada 100 obrigações antigas.
A proposta de 5,75% por ano da SAD verde e branca é tentadora. Basta lembrar que há cerca de um ano, quando as taxas de juro estavam em níveis bem acima dos atuais, a SAD do Sport Lisboa e Benfica realizou uma emissão obrigacionista semelhante à que a Sporting SAD está a promover, tendo na altura oferecido uma taxa de cupão de 5,75% aos seus obrigacionistas. Porém, “nem tudo o que reluz é ouro”. E, neste caso, isso também é verdade.
A rendibilidade proporcionada pelas obrigações da Sporting SAD não fica muito longe da yield oferecida pelos títulos de dívida com o mesmo prazo por parte de algumas das grandes empresas portuguesas, que inclusive fazem parte do principal índice acionista da Euronext Lisboa (PSI).
Não por culpa da SAD leonina, que por cada 1.000 euros investidos paga 57,5 euros. Mas por culpa das comissões bancárias cobradas pelos intermediários financeiros e dos impostos cobrados pelo Fisco.
Por exemplo, um investidor que não tenha outros ativos bolsistas e pretenda investir 2.500 euros (o mínimo permitido) nas novas obrigações da Sporting SAD, não deverá esperar alcançar uma taxa interna de rendibilidade (TIR) líquida de impostos e encargos acima dos 2,3%, segundo contas do ECO com base nos preçários dos 11 bancos colocadores do empréstimo obrigacionista da SAD sportinguista. Há mesmo casos em que através do investimento mínimo o investidor acaba por ter perdas, dado o impacto das comissões.
É certo que quanto maior o montante investido, mais as comissões fixas (como a custódia de títulos) se diluem, aumentando assim a TIR. Mas, mesmo assim, o máximo que um investidor poderá ambicionar é uma rendibilidade média anual em redor dos 4% e somente para investimentos acima dos 20 mil euros – ou então para montantes mais baixos não considerando o efeito da comissão de custódia de títulos por já ser titular de uma carteira de investimentos.
A Sporting SAD alerta justamente para esta situação. “Considerando a generalidade dos preçários dos intermediários financeiros, o investimento terá rendibilidade positiva para investidores que subscrevam apenas 500 obrigações ‘Sporting SAD 2024-2027’ e pretendam mantê-las até à data de reembolso, se tiverem outros valores mobiliários registados na mesma conta de registo”, lê-se no prospeto.
Nota: Se está a aceder através das apps, carregue aqui para abrir o gráfico.
Para os antigos credores da SAD verde e branca, titulares das obrigações “Sporting SAD 2021-20214”, a proposta apresentada pode também despertar o interesse. Desde logo porque as novas obrigações carregam uma taxa de cupão 0,5 pontos percentuais acima da taxa de cupão dos anteriores títulos de dívida. Mas essa não é a única conta que os investidores devem fazer.
Para convencer estes investidores a aderir à “operação de troca”, para que assim a SAD leonina não tenha de reembolsar o investidor a 25 de novembro, a SAD verde e branca oferece um prémio monetário “no valor de 0,07802 euros por cada obrigação ‘Sporting SAD 2021-2024’, sujeito a impostos, comissões e outros encargos”, lê-se no prospeto da emissão.
Na carteira dos atuais credores da SAD verde e branca, esse prémio traduz-se num acrescento de 0,34 pontos percentuais à TIR que terá um recente obrigacionista que só agora adquira títulos de dívida da SAD sportinguista, segundo contas do simulador do Banco Invest com base num investimento de 7.200 euros — média da aplicação por investidor na última OPS de obrigações da Sporting SAD.
Avaliação do risco do investimento
No mercado de obrigações, a rendibilidade oferecida por estes títulos (yield) encontra-se inversamente relacionada com o risco de incumprimento por parte do emitente. Ou seja: quanto maior for o risco de uma empresa ou de um Estado falhar no pagamento dos cupões e no reembolso do capital no prazo acordado, maior será a remuneração exigida pelos investidores.
Uma maneira de medir este risco é através da classificação de risco de crédito atribuída por agências de rating como a Fitch, a Moody’s ou a Standard & Poor’s.
As obrigações “Sporting SAD 2024-2027” não possuem qualquer classificação de risco por parte de nenhuma agência de notação porque o seu emitente — a SAD do Sporting Clube de Portugal — também não tem qualquer notação. Para a entidade liderada por Frederico Varandas, esta circunstância não tem representado um problema, antes pelo contrário.
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Do ponto de vista da procura, a falta de uma classificação de risco é praticamente negligenciável. Os resultados de anteriores emissões obrigacionistas da SAD verde e branca têm mostrado uma procura elevada e consistente superior à oferta, levando a que a Sporting SAD não veja necessidade de pagar para os seus títulos terem um rating como um elemento atrativo para cativar mais investidores (que são maioritariamente sócios e adeptos do clube de Alvalade).
E do lado financeiro da operação, também é difícil ignorar os benefícios da não existência de um rating de crédito para a SAD leonina. Ao analisar-se o mercado de obrigações, a rendibilidade proporcionada pelos títulos da SAD do leão não fica muito longe da yield oferecida pelos títulos de dívida com o mesmo prazo por parte de algumas das grandes empresas portuguesas, que inclusive fazem parte do principal índice acionista da Euronext Lisboa (PSI).
É disso exemplo a Mota-Engil e a Greenvolt, que atualmente têm obrigações com maturidades próximas da data de vencimento das novas obrigações da Sporting SAD (26 de novembro de 2027) a negociarem na Euronext Lisboa com yields de 4,8% e 4,6%, respetivamente.
A construtora liderada por Carlos Mota Santos, por exemplo, fechou 2023 com uma mais que duplicação dos lucros para um valor recorde de 113 milhões e euros e está a negociar com uma capitalização bolsista de 1.490 milhões de euros. Já a Sporting SAD, segundo o último relatório e contas anual, fechou o último ano fiscal (terminado em junho de 2023) com lucros de 25 milhões de euros e saiu de uma situação de falência técnica ao fim de cinco anos; e atualmente está a negociar na bolsa portuguesa com uma capitalização bolsista de 66 milhões de euros.
Mesmo diante dessas diferenças, o custo de financiamento no mercado obrigacionista pedido atualmente pela SAD do Sporting é bastante similar ao custo exigido pelos investidores à maior construtora portuguesa. Mas isso não é tudo.
Apesar de recentemente a Sporting SAD ter passado por uma reestruturação financeira que ficou marcada por um perdão da banca de mais de 100 milhões de euros à Sporting SAD e colocando a empresa numa situação financeira bem mais tranquila do que antes, há um conjunto de riscos associados à operação da SAD leonina que os potenciais futuros credores devem ter conhecimento. No prospeto das obrigações são apresentados alguns desses riscos:
- Risco de crédito e de perdas de imparidade que surge quando uma ou mais entidades da Sporting SAD falham em honrar os seus compromissos contratuais devido a circunstâncias relacionadas à sua atividade operacional. No prospeto, a SAD sportinguista refere que este risco está “maioritariamente associada às contas a receber decorrentes da alienação de direitos desportivos de jogadores e outras transações relacionadas com a atividade que exerce, nomeadamente, a cessão de direitos de transmissões televisivas, patrocínios, publicidade, rendas de espaço, camarotes, entre outras.”
- Risco de liquidez: A 31 de dezembro de 2023, o “passivo corrente” da SAD era superior ao “ativo corrente” em quase 65 milhões de euros, “o que pode condicionar a atividade da Sporting SAD, nomeadamente, as aquisições e vendas de direitos desportivos de jogadores e o orçamento salarial”, lê-se no prospeto.
- Riscos relativos a processos judicias, arbitrais e administradores em que a Sporting SAD está envolvida, que poderão lesar a SAD em vários milhões de euros; e os riscos associados à operação da SAD benfiquista, que está fortemente dependente do desempenho desportivo da principal equipa de futebol do Sporting Clube de Portugal.
Nota: A análise do ECO à nova emissão obrigacionista da Sporting SAD não dispensa a consulta do prospeto da operação.
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Obrigações da Sporting SAD não rendem mais que 4% na carteira dos pequenos investidores
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