As previsões apontam para que o consumo de eletricidade das famílias aumente em média 23% entre janeiro e março de 2021, face ao período homólogo, devido ao elevado número de horas passadas em casa.
Há 15 anos que Portugal não consumia tão pouca eletricidade como no ano passado. Mas para as famílias a realidade em 2020 foi outra, bem distinta: fechados em casa, o consumo doméstico de energia elétrica dos portugueses aumentou quase 15% e o valor das suas faturas disparou 23%. O que nos espera agora, em 2021? É ainda uma incógnita, mas o ano arrancou já com novos recordes: o maior gasto de luz de sempre em Portugal, num único mês.
Os dados da REN mostram que, por causa do frio extremo que se fez sentir em Portugal, aliado ao confinamento, o consumo de energia elétrica registou, em janeiro, o valor mensal mais elevado de sempre e apresentou um crescimento homólogo de 2,7%, com uma primeira quinzena muito forte devido às temperaturas baixas e uma segunda quinzena já em queda.
Para ao período de janeiro a março de 2021, as previsões da plataforma de comparação de faturas Payper vieram já apontar para que o consumo de eletricidade das famílias aumente em média 23%, face ao mesmo período de 2020, “devido ao número significativo de pessoas em teletrabalho, em confinamento, em telescola ou abrangidos por programas de lay-off“.
Portanto, o já inflacionado valor médio mensal de 70,55 euros pago por habitação pela energia elétrica consumida durante 2020 poderá aumentar ainda mais 13,5% para os 80 euros por mês, dizem os analistas do Payper, isto tendo em conta a atual situação de confinamento, mas também a descida do IVA para 13% nos primeiros 100 kWh consumidos.
Avaliando as mais de 6.000 faturas submetidas na plataforma desde o início de 2021, foi também já possível concluir que os comercializadores em mercado livre aumentaram significativamente os preços dos tarifários em janeiro (tanto no termo fixo como na energia), o que pode significar mais 71 euros por ano na fatura.
Consumo de luz aumentou 14,9% para as famílias, desceu 18,3% nos serviços e na indústria recuou 5,6%
De acordo com a REN, é mesmo preciso recuar até 2005 para encontrar um valor tão baixo de consumo de energia elétrica em Portugal. Em 2020, e por culpa exclusiva da pandemia de Covid-19 que se abateu sobre todo o mundo, o país gastou 48.800 GWh de eletricidade (48,8 TWh) em 12 meses, o que representa uma queda de 3,1% face ao ano anterior (54,6 TWh em 2019), ou 3,7%, considerando as correções de temperatura e dias úteis.
Mas se há 15 anos 20% da energia elétrica consumida em Portugal vinha ainda do carvão queimado na central de Sines (que fechou portas às zero horas de 15 de janeiro de 2021), muito mudou na última década e meia. Em 2020 a produção de origem renovável abasteceu 59% do consumo de energia elétrica, repartida pela hidroelétrica e eólica, ambas com cerca de 25%, biomassa com 7% e fotovoltaica com 2,6%, revela a REN
Já a produção não renovável abasteceu 38% do consumo, fundamentalmente com gás natural, representando o carvão apenas cerca de 4% do consumo.
De acordo com os números recolhidos pelo ECO/Capital Verde junto da REN, é possível ver que, face a 2019, a grande queda a pique nota-se precisamente nos meses do primeiro confinamento em Portugal, entre março e junho de 2020, com as famílias fechadas em casa, os adultos em teletrabalho e as crianças e jovens em ensino à distância, a grande maioria do comércio encerrado e as empresas em lay-off. Muito à semelhança deste segundo confinamento, que vivemos atualmente, e que se prevê que dure pelo menos até abril.
Com o desconfinamento, nos meses de verão, o consumo de energia elétrica em Portugal voltou então a acompanhar os níveis de 2019, para depois cair novamente entre outubro e novembro, mas não de forma tão acentuada. No final das contas, entre um ano e outro, a pandemia levou o país a consumir menos 5.823 GWh de eletricidade no espaço de 12 meses.
Estamos a falar de eletricidade suficiente para alimentar durante um ano inteiro o consumo doméstico de quase 1.165 agregados familiares de quatro pessoas (5.000 kWh/ano por família, segundo estimativas da ERSE).
Olhando mais em pormenor para o consumo de energia elétrica em Portugal em 2020, os dados divulgados esta semana pela Agência para a Energia (Adene) mostram que o país pode até ter consumido muito menos luz, mas as famílias viram as suas faturas muito mais sobrecarregadas. Isto porque o consumo de eletricidade aumentou 14,9% nos lares portugueses entre março e dezembro do ano passado, face ao período homólogo.
De março a junho de 2020, por comparação com o período homólogo, a fatura dos portugueses com eletricidade aumentou em média cerca de 23% (para os 70,55 euros por mês ou 846,36 euros por ano), devido ao número significativo de pessoas em teletrabalho, em confinamento, em telescola ou abrangidos por programas de lay-off.
As conclusões são de um estudo de dezembro de 2020 da aplicação Payper, realizado através de um algoritmo de inteligência artificial aplicado a 388 mil faturas submetidas na plataforma (que abrange 95 mil locais de consumo), que mostra como a pandemia de Covid-19 alterou os padrões de consumo de eletricidade dos portugueses na habitação.
Nos serviços o consumo de eletricidade desceu 18,3% e na indústria recuou 5,6%, revela a Adene, segundo as estimativas rápidas do consumo energético da Direção-Geral da Energia e Geologia (DGEG). No conjunto da atividade económica, à qual se acrescem os consumos de energia elétrica referentes aos transportes ferroviários e à agricultura e pescas, a queda foi de 3,8%.
A agência explicou que o confinamento e o encerramento de grande parte dos de serviços e indústria, bem como o teletrabalho e a telescola “significaram, para uma grande parte da população, mais tempo em casa e, consequentemente, um maior consumo de energia nas suas residências”, que ajudam a explicar estes resultados.
Por outro lado, assistiu-se a uma “redução do setor dos serviços, principalmente durante os primeiros meses de confinamento” destacando-se “a queda abrupta de 43,4% no mês de abril de 2020, face ao ano anterior”.
No caso da indústria, observou-se “uma quebra acentuada em abril, mantendo-se o consumo baixo durante três meses, verificando-se depois uma recuperação que se manteria até ao final do ano”, de acordo com a Adene.
Menos eletricidade, menos poluição para a atmosfera
E se 2020 ficou marcado pelo grande impacto da crise pandémica no setor elétrico — redução no consumo de eletricidade, queda de preços do mercado grossista — do lado da produção de energia elétrica foram utilizados muito menos combustíveis fósseis, o que levou a mínimos de 30 anos nas emissões de dióxido de carbono (cerca de 9 milhões de toneladas) e ao phase-out precoce das centrais a carvão, refere a APREN e a associação ambientalista Zero.
No ano passado os centros eletroprodutores de Portugal Continental produziram um total de 49.324 GWh de eletricidade, dos quais 61,7% foram provenientes de fontes limpas, na sua maioria hídrica (28%). Verificou-se ainda uma melhoria na produção de eletricidade a partir do solar fotovoltaico: entraram em operação novas centrais que acrescentaram 124 MW à capacidade instalada nacional.
Abril foi o mês com maior produtibilidade renovável (84%), seguido de dezembro (75%). O último mês de 2020 foi o único a ultrapassar a centena de horas de geração 100% renovável ao longo do ano, tendo registado 167 horas não consecutivas, o equivalente a sete dias. Isto resultou de uma acentuada produtibilidade hidroelétrica e eólica, provando a elevada resiliência do sistema elétrico nacional face a grandes níveis de integração renovável.
Já a produção de eletricidade a partir de combustíveis fósseis reduziu 5,6 % face a 2019, já que as centrais térmicas registaram uma taxa de utilização de 32% e as centrais a carvão de apenas 15 %.
E se consumimos menos eletricidade e produzimos menos eletricidade com recurso a combustíveis fósseis, também poluímos menos. Diz a APREN e a Zero que o setor da produção de energia elétrica tem sido responsável por aproximadamente 25% das emissões de gases com efeito de estufa de Portugal. Desde 1990, os valores mais baixos foram registados nos anos de 2010 e 2014: 14,5 milhões de toneladas.
2020 trouxe consigo um recorde dos últimos 30 anos: emissões de 8,5 milhões de toneladas de dióxido de carbono, uma queda de 24% face a 2019. Na queima de carvão as emissões também encolheram em 2,6 milhões de toneladas, sendo que a queda só não foi maior porque ainda houve necessidade de esgotar todo o carvão armazenado na central termoelétrica de Sines até ao final do ano.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Confinamento pode aumentar fatura de luz das famílias 13,5% até março
{{ noCommentsLabel }}