Exclusivo Juros dos Certificados de Aforro nos 2% e a caminho dos 3,5%

À boleia da escalada das Euribor, a taxa de juro dos Certificados de Aforro vai superar 2% em outubro e poderá atingir o máximo de 3,5% em 2023. O dinheiro em produtos do Estado é o que paga mais.

Depois de largos anos afastados do radar devido às rendibilidades muito magras, os “velhinhos” Certificados de Aforro voltam a estar atrativos para captar a poupança dos portugueses, sendo nesta altura claramente a melhor opção entre os produtos de capital garantido. A “culpa” é do Banco Central Europeu (BCE), que começou em julho a normalizar a política monetária para combater a inflação em máximos históricos na Zona Euro. Os dois agravamentos de juros já adotados pelo banco central e as perspetivas de mais subidas agressivas nos próximos meses colocaram as taxas Euribor numa vertiginosa trajetória ascendente e em máximos de mais de dez anos.

No prazo a 12 meses, o indexante já atingiu 2,62% e a seis meses situa-se em 1,85%. A Euribor a três meses superou 1% a meados de setembro, quando dois meses antes estava em terreno negativo. Subiu esta terça-feira pela 13.ª sessão consecutiva, para 1,228%, um novo máximo desde janeiro de 2012.

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Esta tendência representa uma “dor de cabeça” para as famílias com crédito à habitação, já que implica uma subida acentuada nas prestações do empréstimo. Mas para quem tem poupanças traduz o fim de uma década em que os produtos de capital garantido geraram um retorno encostado a 0%.

Se o custo do crédito à habitação está ligado à Euribor, também é este o indexante que manda na remuneração de vários produtos de risco nulo ou reduzido. No caso dos Certificados de Aforro, o efeito é direto e quase imediato, pelo que estes títulos emitidos pelo Estado vão pagar uma taxa bruta superior a 2% para as subscrições efetuadas em outubro.

A taxa é determinada todos os meses pelo IGCP e corresponde à média dos valores da Euribor a 3 meses observados nos dez dias úteis anteriores ao antepenúltimo dia útil do mês, acrescida de um ponto percentual. O prazo que interessa para fixar o valor em vigor em outubro terminou esta terça-feira, apontado para uma taxa de 2,106% (média de 1,106% adicionada de 1%). Descontando o imposto (taxa liberatória de 28%), a remuneração líquida rondará 1,5%, o que representa um máximo em mais de 10 anos. A confirmação oficial será publicada nos próximos dias desta semana no site do IGCP.

Apesar de estar ainda bem longe do valor da inflação atual, traduzindo por isso uma rendibilidade real negativa, o retorno é atrativo, sobretudo comparado com os produtos alternativos de capital garantido e tendo em conta as perspetivas de aumento da rendibilidade.

“Face às alternativas disponíveis, parece-me ser a remuneração mais atrativa nos produtos de capital dito garantido. Nos produtos de taxa fixa (obrigações) já há títulos com rentabilidade muito apelativas, mas corre-se o risco do emitente”, diz Filipe Garcia, economista e presidente da IMF – Informação de Mercados Financeiros, vincando que “continuamos a falar de taxas de juro reais negativas”.

“A série E dos Certificados de Aforro é a melhor aplicação de poupança com capital garantido”, refere António Ribeiro, especialista em assuntos financeiros da DECO PROTESTE, assinalando que a taxa de setembro já “supera praticamente todos os depósitos a prazo existentes no mercado”. Além de já ser o “produto mais rentável”, as perspetivas são favoráveis.

“No caso dos Certificados de Aforro, como se trata de uma aplicação que capitaliza trimestralmente, essa é a taxa de partida, dos primeiros três meses; no trimestre seguinte será remunerado à taxa calculada para esse mês. Como a taxa base depende da Euribor a 3 meses e a perspetiva é de subida da Euribor, o rendimento dos Certificados de Aforro também deverá continuar a subir”, explica António Ribeiro.

Depois de vários anos estagnada abaixo de 0,5%, a taxa bruta dos Certificados de Aforro superou esta fasquia em abril, passou 1% em agosto e vai agora situar-se já acima de 2% em outubro. Esta taxa vai beneficiar quem subscrever estes produtos no próximo mês, mas também quem comprou em julho, abril e nos ciclos de três meses anteiores. No espaço de apenas seis meses a taxa aumenta cerca de quatro vezes.

Como a taxa base depende da Euribor a três meses e a perspetiva é de subida da Euribor, o rendimento dos Certificados de Aforro também deverá continuar a subir. Assim, no universo dos produtos de capital garantido (ou seja, sem risco), os Certificados de Aforro são o produto mais rentável.

António Ribeiro, especialista em assuntos financeiros da DECO PROTESTE

Retorno a caminho do máximo de 3,5%

A tendência de subida da remuneração não vai ficar por aqui. O BCE aumentou a taxa dos depósitos para 0,75% este mês e é expectável um novo agravamento de 75 pontos base em outubro. Com a escalada da inflação sem sinais de dar tréguas na Zona Euro (em setembro terá atingido um novo máximo perto dos dois dígitos), o mercado já está a descontar que o BCE vai subir a taxa de juro até 3% em meados do próximo ano. E a OCDE aponta mesmo para juros de 4% até ao final do ano.

Se estas expectativas se confirmarem, a escalada das taxas Euribor ainda tem muito caminho pela frente, o que vai continuar a beneficiar a rendibilidade dos Certificados de Aforro. Estes produtos têm uma taxa limitada a 3,5%, um nível que os especialistas acreditam que vai ser atingido em breve. “É bem provável que essa taxa máxima [de 3,5%] seja atingida porque o mercado de futuros desconta Euribor a 3 meses a 2,5% já em finais de janeiro”, diz Filipe Garcia, alertando que “as regras não estão escritas na pedra e não descarto a hipótese de alteração de regras algures no próximo ano”.

Vai depender da política monetária do BCE, mas depois da Euribor a 3 meses ter subido 1,4 pontos percentuais em seis meses, é “bem provável” que a Euribor suba 1,4 pontos percentuais “ou mais no espaço de um ano. Por isso, é bem provável que a taxa base dos Certificados de Aforro atinja o máximo de 3,5% no próximo ano”, considera o especialista em assuntos financeiros da DECO PROTESTE.

António Ribeiro assinala que a PROTESTE INVESTE tem efetuado “algumas simulações de rendimento, de acordo com cenários de subida da Euribor” em que os Certificados de Aforro “deverão render cerca de 2,8% líquidos ao ano, para quem subscrever pelo prazo máximo de 10 anos”.

Este retorno é possível porque os Certificados de Aforro pagam um prémio de permanência que soma à taxa base: 0,5% entre o início do segundo ano e o fim do quinto ano, e 1% a partir do início do sexto ano. Caso se confirmem as perspetivas de subida da Euribor para valores acima de 2,5% no próximo ano, quem subscrever Certificados de Aforro em outubro deste ano beneficiará de uma taxa bruta de 4% no final de 2023.

Estes produtos de financiamento do Estado português têm um prazo de dez anos, um mínimo de subscrição de 100 euros (100 unidades a 1 euro cada) e um máximo de 250 mil euros. Os juros são capitalizados a cada três meses, com a taxa a ser alterada no fim de cada período. Podem ser subscritos nos balcões dos CTT, nos Espaços Cidadão e através do site AforroNet.

Bancos sem incentivos para remunerar depósitos

Os tradicionais depósitos a prazo são os principais concorrentes dos produtos do Estado, mas as taxas de juro que estão a ser oferecidas pelas instituições financeiras persistem encostadas a 0%. Os dados mais recentes do Banco de Portugal, referentes a julho, mostram uma taxa de juro média de apenas 0,09% para os novos depósitos dos particulares. Um aumento muito ténue face aos 0,07% de junho e 0,04% de maio, nível onde se situou nos seis meses anteriores.

Depois de anos seguidos com as taxas de juro negativas a deprimirem a margem financeira, os bancos têm atualmente incentivos muito escassos para aumentar a remuneração dos depósitos. Isto apesar de a atual política monetária lhes conceder uma clara vantagem. O dinheiro que captam junto dos clientes a pouco mais de 0% já rende 0,75% se for colocado no BCE. O mesmo acontece com os fundos que angariaram a taxas negativas com os empréstimos que o banco central concedeu durante a pandemia e que a banca agora pode parquear no BCE com um retorno de 0,75%.

“Os bancos ainda têm excesso de liquidez”, mas “com a próxima subida de taxas em setembro, os bancos ficam sem justificação – até moral – para não remunerar os depósitos”, argumenta o presidente da IMF, perspetivando que “mais tarde ou mais cedo, os bancos irão pagar mais pelos depósitos, mas nenhum quer dar o primeiro passo porque isso os prejudica”.

António Ribeiro também cita o “excesso de liquidez” para explicar porque “não tem havido interesse pelas instituições financeiras em subir as remunerações dos depósitos para captar dinheiro”. O especialista da DECO acredita que “levará mais tempo para os bancos começarem a mexer a sério nas remunerações dos depósitos, ainda assim, será sempre com taxas abaixo dos Certificados de Aforro”.

Dados do Banco de Portugal mostram que os depósitos de particulares atingiram 181,4 mil milhões de euros em agosto, ligeiramente abaixo do máximo de sempre fixado em julho. Trata-se da primeira queda mensal desde setembro do ano passado e a maior desde agosto de 2017, o que estará relacionado com o aumento do custo de vida dos portugueses, mais gastos nas férias e transferência para outras aplicações com remunerações menos baixas. Desde o início do ano, o “stock” dos depósitos bancários das famílias aumentou mais de 8 mil milhões de euros, depois de já ter subido 11 mil milhões de euros em 2021.

O montante aplicado em depósitos tem aumentado consecutivamente, apesar das taxas nulas que os bancos oferecem”, salienta António Ribeiro. Dai o reduzido incentivo em aumentar a atratividade dos depósitos. Uma situação bem diferente do que aconteceu durante a crise financeira de 2008 e o período da troika em Portugal, quando os bancos lançaram os “superdepósitos” para obterem junto das famílias o financiamento que estava fechado nos mercados.

Com a próxima subida de taxas em setembro, os bancos ficam sem justificação – até moral – para não remunerar os depósitos. Mais tarde ou mais cedo, os bancos irão pagar mais pelos depósitos, mas nenhum quer dar o primeiro passo porque isso os prejudica.

Filipe Garcia, economista e presidente da IMF

Dinheiro em certificados atinge recorde

No caso do Estado, também não existe ainda um incentivo forte para procurar financiamento junto das famílias, mas os portugueses estão a procurar cada vez mais os produtos de poupança do Estado, com a subscrição de Certificados de Aforro a acelerar nos últimos meses.

Segundo o IGCP, em agosto os portugueses tinham 30,78 mil milhões de euros aplicados em Certificados de Aforro e Certificados do Tesouro, o que representa o nível mais elevado de sempre para o valor acumulado destes dois produtos de poupança do Estado. Este total equivale a 11% de toda a dívida emitida pelo Estado português (279 mil milhões de euros em agosto) e 17% do valor total dos depósitos.

Os Certificados de Aforro explicam este crescimento, com o stock total destes produtos a atingirem 13,9 mil milhões de euros em agosto, o nível mais elevado desde abril de 2011 e que traduz um crescimento de 12% face ao montante que se verificava no final de 2021. As subscrições líquidas totalizaram 1,44 mil milhões de euros desde o início do ano, num movimento que ganhou intensidade nos últimos três meses. Em junho, julho e agosto entraram 1.119 milhões de euros nos Certificados de Aforro. Só em agosto o fluxo foi de 627 milhões de euros, o que corresponde a metade do dinheiro “perdido” pelos depósitos.

A corrida a estes produtos, que se deverá intensificar nos próximos meses devido à subida da remuneração, tem mais do que compensado a saída de dinheiro dos Certificados do Tesouro: o stock total baixou 980 milhões de euros desde o início do ano, situando-se atualmente em 16,9 mil milhões de euros.

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Esta redução é justificada pelo retorno pouco atrativo destes produtos, dado que a remuneração não está diretamente ligada à evolução da Euribor. Os Certificados do Tesouro Poupança Valor (CTPV) pagam uma taxa de juro bruta de 0,7% nos dois primeiros anos, crescendo posteriormente até atingir 1,6% no último ano. A partir do terceiro ano, a taxa de juro é majorada por um prémio que é calculado tendo em conta a variação do PIB de Portugal.

Melhoria nas condições dos Certificados do Tesouro?

Os Certificados do Tesouro Poupança Mais (CTPM) e os Certificados do Tesouro Poupança Crescimento (CTPC), com condições bem mais favoráveis, já não estão disponíveis para subscrição. A Obrigações do Tesouro de Rendimento Variável (OTRV) também deixaram de ser emitidas pelo IGCP.

A descida acentuada das taxas de juro das obrigações portuguesas para mínimos históricos, devido à política monetária ultra expansionista que foi implementada pelo BCE, levou o instituto responsável pela gestão da dívida pública portuguesa a deixar de contar com o retalho para obter financiamento. Agora que as yields das obrigações estão num movimento acelerado de subidas, fará sentido uma melhoria nas condições dos Certificados do Tesouro, ou novas emissões de OTRV, dizem os analistas.

Sobretudo tendo em conta as atuais condições de mercado. A yield das Obrigações do Tesouro a dez anos, no mercado secundário, já está em máximos de 2017 acima de 3%. No mercado primário também é visível o agravamento, com o IGCP a aceitar pagar quase 2% para emitir dívida a 12 meses.

“Parece-me normal que haja novas emissões ou alterações de regras, mas é difícil antever agora quais”, diz Filipe Garcia, acrescentando que “a taxa de juro média ponderada do stock de dívida pública deverá estar um pouco acima dos 2% e com tendência a subir, pelo que não fará muito sentido captar junto do retalho a juros inferiores a 2,5% a 3%”. O economista não descarta a “hipótese de alteração de regras algures no próximo ano, ou de surgimento de novos produtos”.

As OTRV ofereciam um cupão que correspondia à soma da taxa Euribor (geralmente a seis meses) mais um spread fixo, que foi diminuindo ao longo das várias emissões. Devido “à perspetiva de subida das taxas, se o IGCP entender lançar uma nova emissão com cupão dependente da Euribor, poderá suscitar muito interesse por parte dos particulares”, diz António Ribeiro.

No que diz respeito aos Certificados do Tesouro, “estão atualmente na sua versão menos interessante”, pelo que “seria desejável que o IGCP revisse o cálculo do rendimento deste produto. Continuam a ser mais rentáveis do que os depósitos, mas estão muito menos interessantes do que os Certificados de Aforro”, salienta o especialista da DECO PROTESTE.

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