Os trabalhos de cinco ministros para dar força à economia e às contas públicas

Das Finanças aos Fundos Europeus, passando pelo Trabalho e Segurança Social, pelas Infraestruturas e Habitação e pelo Ambiente e Energia há dossiês que se arrastam e novas decisões a tomar.

Joaquim Miranda Sarmento, Manuel Castro Almeida, Maria Rosário da Palma Ramalho, Miguel Pinto Luz e Maria da Graça Carvalho têm em mãos áreas-chave para colocar o país a crescer. Das Finanças aos Fundos Europeus, passando pelo Trabalho e Segurança Social, pelas Infraestruturas e Habitação e pelo Ambiente e Energia há dossiês que se arrastam do primeiro ano de governação e decisões novas que urgem em se tomar.

Leia aqui os principais desafios a que os governantes terão de responder.

Manter controlo da despesa, garantir Orçamento e concluir a reforma das Finanças: a tríade de Sarmento

Joaquim Miranda Sarmento não é um novato à frente das Finanças, mas será preciso pulso firme para continuar a trajetória de redução da dívida pública e controlo da despesa, ao mesmo tempo que se coloca a exigência de aumentar o investimento em defesa.

A elevada incerteza internacional, sobretudo relacionada com a política comercial da Administração Trump, tem levado as instituições económicas a reduzir a previsão de crescimento da economia portuguesa para este ano. Um desempenho que influencia automaticamente a receita do Estado e, consequentemente, poderá refletir-se nas contas públicas.

As previsões para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) português deste ano variam entre 1,8% e 2,3%, um intervalo abaixo da taxa de 2,4% prevista pelo Governo. É, no entanto, sobre as projeções sobre o saldo orçamental que o cenário é mais cinzento.

O Executivo de Luís Montenegro garantiu que o país irá manter um ligeiro excedente orçamental no próximo ano, mas a Comissão Europeia, o Banco de Portugal, o Conselho das Finanças Públicas e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico esperam um regresso aos défices em 2026.

Paralelamente, Portugal terá de incrementar o investimento em defesa sem que isso coloque em causa as contas públicas ou, segundo Joaquim Miranda Sarmento, signifique um corte no Estado Social.

Na Cimeira da Nato, que terá lugar no fim do mês, a meta de investimento de 2% do PIB será revista em alta e a Comissão Europeia pediu aos Estados-membros que aumentem as despesas relacionadas com esta área, disponibilizando uma flexibilização das regras para permitir até ao limite de 1,5% do PIB.

O maior desafio de Miranda Sarmento irá chegar na rentrée, altura habitual do início das negociações para o Orçamento do Estado. Com a nova relação de forças no Parlamento, mesmo tendo aumentado o número de deputados, o Governo continua a precisar que o PS ou o Chega viabilizem o documento e, para isso, muito provavelmente terá de fazer cedências.

Joaquim Miranda Sarmento, ministro das Finanças, em entrevista ao ECOHugo Amaral/ECO

Outro dos dossiês nas mãos de Joaquim Sarmento será, além da nomeação do próximo governador, já amplamente sinalizada, a conclusão da reforma das Finanças Públicas. Esta é uma missão que o ministro das Finanças chamou a si para deixar como marco, após o ter defendido em diversos trabalhos ao longo dos últimos anos.

Para já, terá de decidir sobre o Centro de Pessoas e Administração Pública (CEPAP). O Presidente da República vetou a criação da nova entidade da Administração Pública, um dos três pilares da reforma da orgânica do Ministério das Finanças, mas, em abril, ao ECO o governante sinalizou que irá “repensar a forma” e insistir na questão. Ademais, irá apresentar uma revisão da Lei de Enquadramento Orçamental, bem como levar a cabo uma revisão da despesa pública.

O Novobanco é outro dos grandes temas que estará na sua secretária no Terreiro do Paço. Cabe ao fundo Lone Star avançar para a venda da instituição financeira, seja através da bolsa ou de uma venda direta, mas Miranda Sarmento tem uma palavra a dizer. O ministro já disse que não vê com bons olhos que o Caixabank compre o Novobanco porque isso significará um reforço significativo da presença espanhola no mercado nacional.

E deu carta branca à Caixa Geral de Depósitos para explorar uma eventual aquisição. Paulo Macedo já admitiu interesse na carteira de empresas do Novobanco, mas considerou que separar o banco é “complexo”. Conseguirá influenciar o processo?

Está ainda pendente a transposição do novo Regulamento MiCA para a lei nacional, o que deverá conhecer novidades. Entre outros, o diploma nacional de execução do MiCA trará novas regras para a atividade com criptomoedas e definir qual a autoridade competente nesta matéria, Banco de Portugal ou Comissão do Mercado de Valores Mobiliários.

Os fundos são quem mais ordena no novo super-ministério

Manuel Castro Almeida ganhou poder neste novo Executivo de Luís Montenegro. Na reorganização do Governo, a mensagem parece ser a de que são os fundos europeus quem mais ordena. O até agora ministro Adjunto e da Coesão Territorial acumula agora a pasta da Economia, que foi ocupada na legislatura anterior por Pedro Reis, ficando responsável por um super-ministério. Mas perde o estatuto de Adjunto.

As principais instituições antecipam um abrandamento da economia e os tempos são de grandes desafios, com uma guerra comercial em curso, uma guerra na Ucrânia e a necessidade de aumentar a despesa com a Defesa.

Além disso, é fundamental assegurar a execução atempada dos fundos europeus, seja ao nível do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) – cuja data limite de apresentação de despesas é agosto de 2026 – seja do Portugal 2030, que este ano já tem de cumprir as regras da guilhotina sob pena de ser necessário devolver verbas a Bruxelas.

O relatório da Comissão Nacional de Acompanhamento do PRR, divulgado esta quarta-feira, faz soar os sinais de alarme, porque, apesar da reprogramação, 20% dos investimentos estão em estado crítico um aumento exponencial face aos 8% do relatório anterior. Habitação, SNS, energia e digitalização são algumas das áreas onde as luzes vermelhas estão claramente a piscar.

Manuel Castro Almeida, ministro Adjunto e da Coesão Territorial, em entrevista ao podcast “ECO dos Fundos”Hugo Amaral/ECO

Tudo o que envolva obras físicas representa um risco acrescido, por isso, a operacionalização da chamada via verde é fundamental para garantir que as empresas têm a mão de obra de que necessitam.

Mas o problema é mais vasto, porque empresas tecnológicas e as universidades também enfrentam dificuldades em trazer os profissionais de que precisam e algumas ameaçam rever os investimentos em Portugal. Agora com a tutela da Aicep, Castro Almeida terá de assegurar a continuidade da atração de investimento direto estrangeiro em Portugal.

As empresas têm pedido maior celeridade nos licenciamentos, mas também uma revisão da contração pública, um ponto que comungam com os municípios. Municípios que enfrentam eleições este ano e que prosseguem o caminho da descentralização de competências.

Nas suas mãos está ainda a negociação do novo quadro comunitário de apoio. Em cima da mesa está uma quase certa redução de verbas, mas também uma possível mudança de regras.

Em Bruxelas, há quem defenda adotar na Coesão o princípio de metas e marcos que foi introduzido no PRR em detrimento da aplicação da lógica seguida até aqui, na qual são os Estados-membros, de forma mais descentralizada, que vão definindo quais devem ser as prioridades da Política de Coesão em cada região, sempre balizadas pelos princípios estratégicos delineados pela própria Comissão.

O ministro Adjunto e da Coesão já admitiu que é “um grande defensor do modelo da Coesão”, mas também já reconheceu que esta “precisa de ajustes”.

Ambiente e Energia tem de acelerar nas renováveis, segurança, resíduos e água

Maria da Graça Carvalho, que continua como ministra do Ambiente e da Energia, viu, recentemente, um desafio agigantar-se: o reforço das interligações energéticas entre a Península Ibérica e a Europa, através de França. Este tema tem estado em cima da mesa de sucessivos governos, mas o recente apagão ibérico, que deixou o país sem luz durante cerca de 10 horas, reforça a urgência de desbloquear o dossiê ao nível europeu e de acautelar a segurança energética do país.

Na área da Energia, o grande desafio é conseguir cumprir com as metas para as quais o país se comprometeu no âmbito do Plano Nacional da Energia e Clima, em relação ao qual a Comissão Europeia já teceu alguns reparos.

Nesta linha, o Governo avançou recentemente com um novo prazo para o lançamento do leilão de eólico offshore. Até ao próximo dia 20 de junho, deve ser apresentada uma proposta para a operacionalização do primeiro procedimento concorrencial, de forma a que este se realize até meados de outubro.

TIAGO PETINGA/LUSATIAGO PETINGA/LUSA

O ministério tem também sublinhado a prioridade a dar ao problema da pobreza energética, que tem uma grande prevalência no território nacional. Está previsto que tenha início este mês um programa de apoio para promover a eficiência energética nas casas, o E-Lar, com a dotação de 100 milhões de euros e foco nas famílias vulneráveis. Este deverá ser substituído em 2026 com um novo programa, assente nos 1,6 mil milhões de euros disponíveis a partir do Fundo Social do Clima. Este tipo de instrumentos deverá ser gerido através da Agência para o Clima, criada no início deste ano mas ainda sem trabalho a apresentar.

Maria da Graça Carvalho está ainda responsável por acompanhar a aplicação das duas estratégias apresentadas em março para as áreas da água e dos resíduos. A primeira, inclui um total de 294 medidas para serem aplicadas de norte a sul do país, o que exigirá um investimento de 5 mil milhões de euros até 2030. Um das medidas mais sonantes é a criação de novos “empreendimentos de fins múltiplos” para irrigar a agricultura, semelhantes ao existente no Alqueva, mas agora no Médio Tejo e Mondego.

Já o plano de emergência para os resíduos pressupõe um investimento de 2,1 mil milhões até 2030, e que pretende diminuir a produção de resíduos e a fatia que chega aos aterros, numa altura em que estes estão a chegar ao seu limite de capacidade.

Segurança Social, salários e lei do trabalho. O caderno de encargos de Palma Ramalho

Neste novo Governo de Luís Montenegro, Maria do Rosário Palma Ramalho continua com as pastas do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, mantendo, assim, em mãos temas tão quentes para a vida dos portugueses, como os aumentos das pensões, as alterações à lei do trabalho e a trajetória dos salários.

No que diz respeito à sustentabilidade da Segurança Social, convém lembrar que Palma Ramalho herdara do último Governo de António Costa um livro verde, com dezenas de recomendações para assegurar o futuro desse sistema. Crítica dessa análise, a ministra encomendou, entretanto, um novo estudo (mais abrangente) a um outro grupo de peritos, que terá até ao início do próximo ano para apresentar as suas conclusões finais. Mas antes, já este verão, terá de dar a conhecer o seu trabalho relativamente aos regimes complementares, à reforma parcial e às pensões antecipadas.

Audição da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho, na Assembleia da República - 16MAI24
Audição da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho, na Assembleia da RepúblicaHugo Amaral/ECO

Na legislatura anterior, a ministra do Trabalho tinha frisado que as mudanças, a existirem, só seriam feitas num próximo mandato, depois de um estudo profundo do sistema. Agora, não está claro qual será o plano do Executivo, e programa eleitoral da AD não dá pistas concretas sobre o que poderá ser feito, neste âmbito. À parte das reformas estruturais, mas ainda no que diz respeito à Segurança Social, os próximos quatro anos de Palma Ramalho deverão ser marcados por aumentos das pensões (decorrentes da atualização e, possivelmente, suplementares — a AD já o admitiu) e por novas subidas do Complemento Solidário para Idosos, já que os níveis baixos dos rendimentos dos mais velhos são dos maiores desafios do país.

Já quanto aos rendimentos dos demais portugueses, a ministra terá como desafio o reforço contínuo dos salários. A retribuição mínima garantida deverá crescer até 1.110 euros no final da legislatura, mas a governante tem frisado que não basta ficar por aí. É preciso puxar por todos os vencimentos, daí que o acordo celebrado na Concertação Social preveja também referenciais (não vinculativos) para os demais ordenados. Os empresários têm assinalado, contudo, que quer o aumento do salário mínimo, quer a subida dos demais vencimentos não depende de pura vontade, mas de serem criadas condições (nomeadamente, fiscais) para os que empregadores consigam suportar esses custos.

Outro dos temas quentes que Palma Ramalho tem em mãos é a lei do trabalho. Na legislatura anterior, comprometeu-se a revisitar as dezenas de alterações ao Código do Trabalho que a Agenda do Trabalho Digno introduziu na primavera de 2023, e até criou um grupo de trabalho para isso. Essa intenção não consta do programa da AD deste ano, mas as confederações empresariais têm vincado que este tema é prioritário. Por exemplo, o travão ao outsourcing após os despedimentos coletivos é um ponto que, dois anos depois, continua por pacificar (até porque está a ser ainda fiscalizado pelo Tribunal Constitucional). Outra norma crítica é a que abre a porta a que os estafetas sejam reconhecidos como trabalhadores das plataformas, que não tem conseguido consensos nos tribunais.

O mesmo ministro para os mesmos desafios: habitação, TAP, novo aeroporto e ferrovia

Miguel Pinto Luz mantém-se com a pasta das Infraestruturas e Habitação e um rol de temas para os quais o país pede solução rápida mas que vão demorar anos a resolver.

À cabeça está a habitação, onde a subida de preços e rendas continua a afastar a possibilidade de comprar casa com o rendimento dos portugueses. Entre 2020 e 2024, o preço médio da habitação em Portugal subiu a um ritmo médio anual de 10%, cerca de 2,5 vezes mais do que o crescimento anual de 3,9% registado na Zona Euro. No mesmo período, o valor mediano dos novos contratos de arrendamento em Portugal aumentou a um ritmo médio anual de 9,1%. Em contraste, o rendimento disponível dos portugueses registou um aumento anualizado de 8,13%, a preços correntes, segundo dados do Banco de Portugal.

Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas e da Habitação.Ricardo Castelo

Fez em maio um ano que foi apresentado o plano “Construir Portugal: Nova Estratégia para a Habitação”, onde se incluíam medidas como a garantia pública para ajudar os jovens a contratarem crédito à habitação e a isenção de IMT.

A receita do Governo para resolver a crise da habitação vai continuar a passar sobretudo pelo aumento da oferta. A coligação PSD/CDS propõe a criação de parcerias público-privadas para construir e reabilitar 59 mil habitações. Para incentivar o setor, pretende também insistir na redução do IVA das obras de construção e reabilitação para a taxa mínima de 6%.

Na agenda de Miguel Pinto Luz vão estar também dossiês que têm sido apontados como um entrave ao crescimento da economia, como o novo aeroporto de Lisboa ou a ferrovia.

Depois de mandatar a ANA para preparar uma candidatura à construção da nova infraestrutura no Campo de Tiro de Alcochete, o Governo aguarda que a concessionária entregue o Relatório das Consultas, onde constará a síntese da auscultação feita às partes interessadas. Um passo de um longo calendário que prevê o início das obras lá para finais de 2030 e o arranque da operação em 2037.

A continuação dos investimentos do Plano Ferroviário Nacional, que têm sofrido repetidos atrasos, será outro dos trabalhos de Pinto Luz. Com destaque para o relançamento do concurso para o desenvolvimento e construção do segundo troço da linha de alta velocidade Porto-Lisboa.

De volta à secretária do ministro estará também o processo de privatização da TAP, que já foi interrompido por duas vezes pela queda de um governo. Primeiro em novembro de 2023, com a demissão de António Costa, e novamente em março último com o chumbo da moção de confiança apresentada pelo Executivo de Luís Montenegro.

O decreto-lei estava a semanas de ser aprovado em Conselho de Ministros, mas o Governo apressou-se a esclarecer que não avançaria com a venda da transportadora aérea estando em gestão, mas continuaria com os trabalhos preparatórios, a cargo da Parpública.

Desde que o Governo caiu, a TAP apresentou os resultados para a totalidade do ano de 2024 e o primeiro trimestre de 2025, e em ambos os períodos os números pioraram. A transportadora fechou o ano passado com lucros de 53,7 milhões, uma redução de 69,7% face a 2023. Nos primeiros três meses de 2025 registou um prejuízo de 108,2 milhões, mais 18,1 milhões do que no mesmo período do ano passado, e foi a única a baixar as receitas entre as principais companhias. Já o endividamento caiu para quase metade.

Os grupos IAG, Lufthansa e Air France – KLM estão interessados na operação e exprimiram uma certa frustração com o atraso. Este deverá ser, por isso, um dos dossiês a que o novo Governo dará prioridade após tomar posse, até porque o trabalho preparatório vai bem avançado.

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