7 grandes sinistros industriais em 2 meses: O que está acontecer em Portugal?
António Rito Batalha, Senior Client Manager da Swiss Re, explica que os efeitos das alterações climáticas continuam a ser seguráveis, mas maior risco pode minar a segurabilidade dos bens em Portugal.
Os efeitos das alterações climáticas continuam hoje em dia a ser seguráveis, mas o risco a longo prazo de alterações climáticas não mitigadas poderá minar a segurabilidade dos bens, particularmente em regiões altamente expostas. O principal risco de subscrição para as seguradoras é subestimar os prémios devido à dependência de dados históricos de sinistros ou de modelos incompletos ou desatualizados. A indústria precisa, portanto, de incorporar ativamente e acompanhar dinamicamente os efeitos do aquecimento do clima, adaptando os modelos a um cenário de risco em profunda mudança. Muitos modelos catastróficos não são totalmente responsáveis pelo aumento da exposição devido ao aumento da concentração de valor num mundo em rápida urbanização e mais vulnerável.
Verificados os grandes sinistros industriais noticiados na imprensa portuguesa identifiquei 7 grandes incêndios industriais em apenas 2 meses (entre 22 de Junho e 21 de Agosto último). Em contraste, desde o inicio do ano, apenas tinha sido noticiado 1 grande risco industrial (em Fevereiro).
As várias indústrias afetadas por incêndios, a atividade a que se dedicam, a sua localização e data de cada sinistro foi a seguinte:
- TUPAI – Metalomecânica (Águeda) 21-8-2020
- LQL – Calçado, (Vilela) 14-8-2020
- Polo Industrial de Castelo de Paiva, 13-7-2020
- CELTEJO – Celulose (Vila Velha de Rodão) 6-7-2020
- INDUPAL – Pasta de Algodão (Castanheira de Pera) 1-7-2020
- ZARRINHAS – Papel e cartão (Sta Mª Feira) 30-6-2020
- ADA FIOS – Têxtil (Sto.Tirso) 22-6-2020
- ENERGIE – Painéis solares (Póvoa Varzim) 26-2-2020
As causas destes sinistros serão várias, sendo que as mais frequentes em grandes indústrias são:
- Riscos elétricos, líquidos inflamáveis, gases comprimidos, trabalhos de manutenção, fraude.
- Também é conhecido o risco de instalações industriais encerradas durante um determinado período de tempo (como o do confinamento por Covid 19, ou por férias). A sua reabertura pode acumular uma série de situações que provocam ou agravam o risco de incêndio (tudo indica ter sido o caso da fábrica TUPAI).
No entanto não deixa de ser surpreendente que voltem a ocorrer tantos incêndios, que surgem acumulados em meses de verão. Tal tinha sucedido em 2017, durante os grandes incêndios florestais de junho e outubro, num ano de seca muito severa, que só terminou em outubro com a entrada da tempestade tropical Leslie em Portugal.
A severidade destes riscos atingem as capacidades de resseguro enquanto a sua maior frequência poderá pressionar o nível de solvência das seguradoras
Há a notar que desde junho deste ano, o país tem vindo a sofrer os crescentes efeitos de seca, sendo que julho foi mesmo o mês mais quente dos últimos 90 anos em Portugal de acordo com um relatório do IPMA. Já o mês de maio teve apenas 6 dias com temperaturas máximas dentro do intervalo normal do mês; todos os restantes dias ultrapassaram as máximas normais de maio conforme relatório do IPMA!
Muito recentemente o Instituto Superior de Engenharia de Coimbra (ISEC) apresentou um estudo indicando que 63% dos polígonos industriais portugueses apresentam um elevado risco de incêndio por se localizarem junto à floresta.
Vale a pena referir ainda que um conjunto de mapas da Agência Europeia do Meio Ambiente (EEA) revelam que grandes áreas de Portugal, Espanha e França podem vir a enfrentar a desertificação. É referido neste estudo que as zonas mais afetadas podem vir a sofrer um aumento de sequia que ultrapassaria o dobro da sua frequência histórica (pior cenário).
Todas estas evidências denotam que o risco associado ao aquecimento global é um fator a ter em conta também em incêndios industriais, sobretudo onde a carga térmica gerada pelos materiais envolvidos possa alcançar temperaturas elevadas, favorecidas pelo calor e sequia do ambiente envolvente às unidades fabris. Nas indústrias atingidas em 2020, vimos a presença de tais tipos de materiais, designadamente: madeira, papel, pasta de algodão, têxteis e plásticos (muito materiais em plástico na indústria de calçado atingida). A severidade destes riscos atingem as capacidades de resseguro enquanto a sua maior frequência poderá pressionar o nível de solvência das seguradoras.
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