A CGD que queremos: Pública, bem administrada e transparente

Queremos um banco público, sustentável, como uma administração competente e temos que pagar de acordo com o mercado. Com a exigência declarativa da nova administração.

A CGD encontrava no fim de 2015 dois desafios fundamentais, com um contexto diferente. Mas vamos primeiro ao contexto. É sabido que a nova diretiva da resolução bancária europeia (BRRD) trazia novas restrições em 2016. Essas novas restrições emergiam do fim do período derrogatório quanto à elegibilidade dos credores seniores para efeitos de recapitalização interna e, dentro destes, os titulares de depósitos superiores a 100 mil euros. Mas a este enquadramento regulatório somou-se um outro: a supervisão bancária das quatro mais instituições bancárias portuguesas passou da alçada do Banco de Portugal para o Mecanismo Único de Supervisão do BCE, e dentro deste o exercício de escrutínio a análise dos curricula e da idoneidade dos administradores da CGD.

Ora, é neste contexto que emergem então os dois desafios:

  1. A CGD tinha um desvio significativo no seu Plano de Capitalização (quase três mil milhões de euros), ao abrigo do qual tinha recebido um volumoso aumento de capital e da emissão de capital contingente (os famosos CoCos) e isso obrigava a que o acionista Estado tivesse que tomar uma decisão difícil de novo aumento de capital ou de privatização, ainda que parcial, desta entidade bancária;
  2. A administração liderada pelo Dr. José de Matos chegava ao fim do seu mandato, e era, como foi, necessário nomear uma nova administração que respondesse a esta circunstância, mas que antes de mais pudesse passar no crivo do BCE.
    Neste quadro, e cumprindo os seus compromissos eleitorais, o Governo toma uma opção de fundo: a CGD continuará a ser 100% pública. Muitos podem discordar – não é o meu caso –, mas esta opção levava a que o Governo tivesse que fazer passar em Bruxelas um plano que suprisse o desvio do Plano de Capitalização não violando as leis da concorrência e encontrar uma administração que passasse no BCE.

O primeiro desafio, neste contexto, era decisivo; porque colocava em causa o próprio modelo de negócio da CGD e a sua estrutura acionista. Tinha que ser suportado pelo erário público numa lógica de negócio bancário, sem distorcer a concorrência e demonstrando a adequada remuneração do capital investido. Este desafio foi debelado com êxito. E foi uma das notícias mais importantes (e boa) que a economia portuguesa recebeu neste ano 2016.

Daí que substituir a administração da CGD tivesse que ser um processo (quase) paralelo com a negociação deste novo Plano de Negócios. Só a sua configuração final traria as condições de exercício do mandato da nova administração. E aí o Governo tinha que ultrapassar com êxito o segundo desafio: uma administração que respondesse às exigências de escrutínio do BCE. A questão salarial é neste domínio importante.

Não podemos ter administradores idóneos – e entenda-se no quadro do BCE – sem mostrar em Frankfurt curricula com experiência no setor bancário e com uma vasta experiência de gestão. Não há outra forma ter essa experiência sem recorrer diretamente ao mercado e, neste caso, pagando salários competitivos com o mercado.

É uma pura demagogia esperar que a CGD tenha administradores idóneos, com experiência e curriculum, e depois querer pagar salários fora do mercado. Este desafio só seria ultrapassado mostrando gente competente, com experiência no setor, e com capacidade de gestão e não, como noutras circunstâncias, ‘correias-de-transmissão’ partidária, ‘baratinhas’, mas impreparadas e incapazes de passar no escrutínio exigente de idoneidade do BCE.

E devo sublinhar: não é o salário do Dr. António Domingues que está em causa; mas antes de mais as competências e experiências que o seu curriculum, e das pessoas que o acompanham, que são cruciais para ter um banco público com uma administração idónea segundo as regras da ‘arquitetura’ de supervisão europeia.

Ora, se o processo era difícil, ele foi no essencial ultrapassado com grande competência e exigência pelo Governo. É por isso que a questão da declaração de rendimentos traz uma ‘sombra’ desnecessária e até pouco consistente com o propósito do Governo (e do PS).

Nós queremos um banco público, sustentável, como uma administração competente e, por isso, temos que pagar de acordo com a exigência do mercado; mas por ser público, tem uma exigência que não é possível eliminar: a transparência e a obrigatoriedade declarativa aquando do início de funções. E o Dr. António Domingues prestava um bom serviço à CGD se desde já percebesse que apesar do decreto-lei o retirar do perímetro do Estatuto do Gestor Público, não o subtrai à obrigatoriedade declarativa que consta da Lei 4/83 de “Controle Público da Riqueza dos Titulares de Cargos Políticos”.

E mesmo que assim não fosse, o bom senso também o obriga. E esse – o bom senso – não é escrutinado pelo BCE, mas por todos os portugueses. Que são os donos da CGD.

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