A Isenção de Tributação de Mais-Valias do Pacote “Mais Habitação” – Veto Presidencial e como ficam as Transmissões realizadas em 2022 caso a Lei vier a ser Promulgada?

  • Pedro Saraiva Nércio
  • 22 Agosto 2023

O veto presidencial agora conhecido veio, assim, frustrar muitas expectativas, tendo em consideração que se encontra a correr o prazo para pagamento dos atos de liquidação de IRS referente a 2022.

Como é de conhecimento geral, do pacote legislativo “Mais Habitação”, que foi em bloco objeto de veto presidencial nesta segunda-feira, consta a isenção de tributação, em sede de IRS, das mais-valias realizadas com a venda de imóveis habitacionais não destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado, contanto que o valor de realização seja amortizado no empréstimo contraído para a aquisição de habitação própria e permanente do sujeito passivo ou dos seus descendentes.

De forma mais ilustrativa, a mais-valia realizada pelo Diogo com a alienação da sua casa de férias no Algarve estaria isenta de tributação, caso tal mais-valia fosse amortizada no empréstimo que o Diogo contraiu para efeitos de aquisição de um imóvel destinado à habitação própria e permanente, sua ou da sua filha Beatriz.

De acordo com a Lei em causa, esta isenção, prevista para as transmissões de imóveis ocorridas entre 1 de janeiro de 2023 e 31 de dezembro de 2023, seria extensível às transmissões ocorridas entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2022, desde que, neste último caso, a amortização do referido crédito fosse concretizada até três meses após a entrada em vigor daquela Lei.

É, pois, natural que esta Lei tenha aguçado, neste particular, o apetite de muitos contribuintes que alienaram imóveis não destinados à habitação própria e permanente no ano de 2022 e que detêm créditos para aquisição de habitação própria e permanente sua ou dos seus filhos, na medida em que viam, com esta Lei, a hipótese de não pagarem imposto sobre as respetivas mais-valias.

O veto presidencial agora conhecido veio, assim, frustrar muitas expectativas, tendo em consideração que se encontra a correr o prazo para pagamento dos atos de liquidação de IRS referente a 2022, atos estes que integram, também, as mais-valias geradas naquele ano com a alienação dos referidos imóveis.

Mas, em bom rigor, os contribuintes que alienaram os referidos imóveis em 2022 nunca iriam beneficiar diretamente, ou seja, na liquidação de IRS referente a este mesmo ano a emitir pelos serviços da Autoridade Tributária na sequência das declarações de IRS, da isenção prevista na referida Lei.

Com efeito, o Pacote “Mais Habitação” foi aprovado em Parlamento no dia 19 de julho, ou seja, numa data em que se encontrava já decorrido o prazo (30 de junho) de apresentação da declaração anual de IRS respeitante ao ano de 2022.

Resulta, assim, claro que, não havendo Lei aprovada, nem promulgada, à data de apresentação das declarações de IRS, das mesmas iria necessariamente resultar a tributação das mais-valias realizadas no ano de 2022, devendo os contribuintes proceder ao respetivo pagamento, sob pena de execução fiscal a mover pelos serviços da Autoridade Tributária.

A questão que se impõe é a de como resolver, então, este imbróglio tributário, no caso de, daqui a uns meses e após sanação dos vícios apontados pelo Presidente, a Lei vier a ser promulgada, entrando em vigor a tão almejada isenção?

Na ausência de um procedimento jurídico de devolução automática do IRS pago em excesso com fundamento em novidades legislativas de carácter retroativo e caso o Governo não venha a criar um regime específico para resolver esta situação, parece-nos que haverá apenas dois caminhos a seguir pelos contribuintes afetados.

Por um lado, poderá o contribuinte apresentar uma declaração de substituição, no prazo de 120 dias a contar do prazo de pagamento do imposto, caso a referida Lei venha a entrar em vigor neste mesmo prazo, assumindo tal declaração a natureza de reclamação graciosa para efeitos procedimentais.

Caso a referida Lei não venha a entrar em vigor no referido prazo, restará ao contribuinte a via do pedido de revisão oficiosa, a apresentar no prazo de 3 anos a contar da data de notificação do ato de liquidação em causa, com fundamento em injustiça grave ou notória.

Em ambos os casos, a restituição do imposto devido ficará sempre dependente da aprovação da Autoridade Tributária, mediante deferimento dos referidos meios procedimentais e consequente processamento do reembolso devido.

Sem prejuízo da existência dos referidos meios procedimentais ao dispor dos contribuintes, e tendo em especial consideração a intenção legislativa subjacente, a difusão propagandística gerada pelo Governo e as consequentes expectativas geradas nos contribuintes, esperamos que esta situação venha a ser efetivamente resolvida por via legislativa, através da criação de um regime especial de regularização/reembolso do imposto pago em excesso, na eventualidade de a isenção aqui abordada ser, a final, promulgada e entrar em vigor.

  • Pedro Saraiva Nércio
  • Associado principal da Miranda & Associados

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