Advocacia 4.0, tecnologia e pandemia – as audiências à distância vieram para ficar?

  • Catarina Limpo Serra
  • 1 Fevereiro 2021

A experiência das audiências à distância no pós-pandemia só pode ser positiva e deverá continuar continuará a ter lugar no futuro dos processos de resolução de litígios.

O Covid-19 obrigou todos os setores a reinventar-se para manter a sua atividade a funcionar e os advogados não foram exceção. Numa perspetiva otimista e utilitária, a pandemia teve impactos positivos na sociedade jurídica, uma vez que obrigou os profissionais forenses a utilizar as tecnologias de realização do trabalho por meios à distância.

A pandemia antecipou o futuro e forçou a indústria forense a encontrar novas soluções para o problema da realização de audiências sem a tradicional audiência presencial. As audiências à distância tornaram-se parte da “nova normalidade”. Atualmente, está em vigor um regime processual transitório e excecional que prevê, como regra, que as audiências de julgamento se realizem presencialmente, podendo, se todos concordarem, realizar-se à distância. As outras diligências são obrigatoriamente realizadas à distância. Com a aprovação destas medidas, pretendeu-se evitar a paralisação no andamento dos processos.

Este regime não é de todo inédito e poderia ter ido mais longe, porque a lei de processo civil já prevê como regra a inquirição por videoconferência de testemunhas residentes fora da comarca. A ideia de audiências realizadas integralmente por meios remotos é sentida por muitos advogados como uma realidade quase alienígena. No entanto, a pandemia veio reforçar a ideia de que direito e tecnologia são inseparáveis e que as vantagens para os profissionais forenses e para os consumidores da Justiça são inegáveis.

Em tempos de pandemia, a principal virtude das audiências à distância é manter os processos em andamento. As diligências começam sempre a horas e torna-se mais difícil justificar atrasos e faltas de comparência. Outra vantagem é a celeridade da tramitação das ações, porque é mais fácil conciliar agendas e mais difícil invocar impedimentos por falta de salas de tribunal ou por dificuldades de deslocação. Para os advogados e clientes há um enorme potencial de redução de custos com o processo, com deslocações e outros encargos associados a uma diligência no tribunal.

Pense-se numa disputa internacional que frequentemente envolve várias partes de diferentes países. A distância encurta-se e o espaço torna-se quase infinito, porque as plataformas tecnológicas de videoconferência permitem a interação em tempo real entre vários intervenientes localizados em geografias distantes, com um grande número de pessoas em simultâneo, o que não é possível numa audiência presencial. No entanto, também há desvantagens. O processo é o meio por excelência de entrega de justiça aos cidadãos, que consegue aceitar mais facilmente uma decisão desfavorável após um processo transparente, justo e equitativo em que tenha tido uma intervenção direta, com discussão das posições das partes e em que o resultado final seja palpável. Esta aceitação evita recursos e a sobrecarga dos tribunais e contribui para a confiança da comunidade no sistema judicial. Uma audiência que seja entendida como injusta ou sem garantias vai gerar a desconfiança em todo o sistema.

No advento das audiências à distância, muito está por fazer. A transição do processo em papel para o processo digital ainda está a acontecer. Vamos seguramente assistir ao desenvolvimento de novas técnicas de inquirição e alegação e de produção de meios de prova.

A experiência das audiências à distância no pós-pandemia só pode ser positiva e deverá continuar continuará a ter lugar no futuro dos processos de resolução de litígios. Um regresso ao passado não é concebível.

  • Catarina Limpo Serra
  • Associada coordenadora do departamento de contencioso & arbitragem da CCA

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