Diário de um CEO português em Silicon Valley

  • André Grilo
  • 31 Janeiro 2024

Além das apresentações, há que antecipar respostas a todo o tipo de perguntas nas reuniões agendadas. Quando o avião aterra, a agenda já ferve. Uma noite de sono para descansar e o programa arranca.

Quando ouvimos falar de Silicon Valley vem-nos de imediato à cabeça a ideia de uma “meca tecnológica”, onde grandes empresas de tecnologia de ponta estão instaladas e a cultura de inovação fervilha. É também aqui que startups e empresas mais pequenas se fixam, procurando tirar partido do dinamismo, da cultura empreendedora e de inovação tecnológica, que ali se vive. Quando se chega a Silicon Valley, há a noção de que se está a nadar entre os grandes tubarões da tecnologia.

Como CEO de uma startup de deep tech e, tendo em conta o caráter pioneiro da nossa tecnologia – afinal desenvolvemos soluções de cibersegurança pós-quântica que vão ajudar empresas de todo o mundo a proteger-se da ameaça da computação quântica -, Silicon Valley sempre teve um misto de curiosidade e sonho.

Quando surgiu a hipótese de participarmos no “Portugal to Take Off”, um programa da AICEP lançado em 2020 e que tem como principal objetivo acelerar o crescimento das empresas portuguesas na Califórnia, criando uma plataforma de apoio às startups participantes para que os empreendedores possam ter uma abordagem mais eficaz ao mercado norte-americano, mobilizámos a equipa e tratámos da candidatura.

A nossa “viagem” começou há cinco semanas: a QuantumNova foi uma das quatro escolhidas para integrar o programa, parceria da AICEP com o serviço de apoio a empresas na expansão internacional Scaler8. Este programa teria como momento alto uma semana de imersão em Silicon Valley e a apresentação da QuantumNova a um conjunto alargado de investidores, potenciais clientes e outros empreendedores.

Durante as semanas que antecederam esta viagem, tivemos várias reuniões preparatórias, com a AICEP e a Scaler8, e um conjunto de mentores, todos eles com um currículo extraordinário. No processo, estes especialistas desafiaram-me e apresentaram outras perspetivas e aspectos a desenvolver no negócio, essenciais para uma boa abordagem ao mercado americano que, neste momento, já é mais sensível aos problemas que a computação quântica apresenta para a cibersegurança.

Além de mim, Mauro Frota (Bhout), Tiago Rebelo (Connected) e João de Sousa (Leadzai), voaram até São Francisco para uma semana com uma agenda preenchida, levando já em carteira um pitch cuidadosamente preparado para apresentar (e, idealmente, surpreender!) na “Pitch Night de Palo Alto”, e uma enorme curiosidade para o que iria acontecer.

Na véspera da ida, olhei para a agenda: seis workshops, que vão desde “como fazer negócios nos Estados Unidos” a “Boas práticas de recursos humanos”, passando por técnicas de “negociação de acordos de mais de 1 milhão de euros”; sessões de treino de pitch com feedback na hora (e tempo para fazer alterações à medida das opiniões e das necessidades), e até um painel com participantes em programas anteriores que, naturalmente, levam pelo menos um ano de avanço face ao nosso negócio nos Estados Unidos. Respirei fundo e pensei: “Vamos a isso!”.

Embarco e trabalho durante todo o voo (não há tempo a perder, afinal ser CEO de uma startup é, às vezes, sinónimo de noites mal dormidas). Além das apresentações, há que antecipar respostas a todo o tipo de perguntas nas reuniões agendadas, depois das intros feitas pela nossa mentora principal. Quando o avião aterra, a agenda já ferve. Há uma noite de sono para descansar e o programa arranca cedo na segunda-feira.

Com uma mente aberta e muita vontade de aproveitar esta oportunidade e absorver todos os insights, a semana corre. Entre reuniões, sessões de treino e de feedback, workshops e pequenos encontros pontuais com os restantes fundadores, chegamos a quarta-feira, dia de Pitch, num ápice. Marcado para as 18h30, a sala enche-se a tempo e horas. E, ainda que eu não esteja nervoso — repeti mentalmente este pitch um número de vezes que nem poderia mencionar –, é óbvio que estes são os cinco minutos mais importantes de toda a semana.

No palco, detalho o papel essencial da antecipação e preparação para os riscos que esta nova era quântica traz para a cibersegurança das organizações. Afinal, os sistemas criptográficos que nos protegem hoje, podem ser quebrados em minutos. E nós temos uma solução para proteger as empresas deste problema.

Na plateia, olhos atentos ouvem e absorvem. Não sei se todos saberão exatamente do que falo quando menciono a ameaça quântica, e provavelmente muito poderão reagir com o ceticismo do passado, sempre que surgiu uma nova tecnologia que pode mudar o mundo, como o telefone, o telemóvel, o computador… “Coisas do futuro”, podem pensar. A verdade é que a computação quântica está aí, e veio para ficar.

Nos slides, acumulo histórias de dúvidas e de certezas, sugestões da equipa, feedback de mentores, muitos percalços e medos, ambição e muitas horas de trabalho…

No final do pitch, sou surpreendido com feedbacks muito positivos, incluindo de alguns daqueles “tubarões” de Silicon Valley.

Regresso a Portugal com a sensação de dever cumprido e de uma porta importante que se abriu. Afinal, aquilo que estamos a criar tem o poder de ajudar este mundo digital em que vivemos a tornar-se mais seguro, mesmo com computadores quânticos.

  • André Grilo
  • Fundador da QuantumNova

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