

O novo regime do crédito malparado entra em vigor em dezembro: o que muda para bancos, compradores e devedores?
O crédito malparado tem gerado, a nível internacional e nos últimos anos, um mercado muito dinâmico de transações de cessão de créditos entre bancos.
Foi recentemente publicado o Decreto-Lei que regula a “venda” e gestão de crédito “bancário”. Apesar de ser, na gíria, chamado “regime do crédito malparado”, aplicar-se-á tanto a créditos em cumprimento como a créditos em incumprimento.
As novas regras, que entrarão em vigor já em dezembro, resultam da transposição em Portugal (que, diga-se, ocorre já bastante depois do fim do prazo concedido aos Estados Membros para o efeito) de uma Diretiva que visa harmonizar o regime jurídico em toda a UE. O Banco de Portugal, que passará a ser a entidade fiscalizadora da cessão e gestão de créditos, já colocou em consulta pública um projeto de aviso para complementar o novo regime, com vista a recolher opiniões até ao próximo dia 29 de outubro.
O crédito malparado tem gerado, a nível internacional e nos últimos anos, um mercado muito dinâmico de transações de cessão de créditos entre bancos – interessados, desde logo, em “limpar” esses ativos, comumente designados por “não-produtivos” (non-performing), do respetivo balanço – e investidores especializados em recuperar este tipo de créditos.
Este fenómeno tem gerado preocupações regulatórias, desde logo no que respeita à proteção dos devedores, particularmente nos casos de crédito à habitação e crédito ao consumo, sobretudo nos Estados Unidos, onde os investidores que adquirem este tipo de carteiras têm adotado práticas de recuperação mais agressivas.
É neste contexto que surge o novo regime, com o objetivo de salvaguardar a posição jurídica dos devedores, mas também o de promover o desenvolvimento de um mercado secundário de crédito alinhado com os restantes países da UE e, portanto, globalmente mais competitivo.
O princípio expresso da neutralidade
Introduz-se expressamente o princípio da neutralidade da cessão: os devedores não podem ser colocados numa posição jurídica menos favorável pelo simples facto de ter ocorrido uma venda dos seus créditos, processo ao qual tipicamente são alheios.
Este princípio tem implicações práticas relevantes, sobretudo no contexto do crédito à habitação, que tem motivado algumas decisões judiciais recentes sobre a invalidade deste tipo de operações quando não respeitem o chamado “direito de retoma” do crédito de que os consumidores dispõem ao abrigo da lei, em particular quando os créditos sejam cedidos a entidades que não estejam habilitadas a conceder crédito, o que é frequente.
Restrições aos compradores de créditos
Além dos bancos, sociedades financeiras, instituições de pagamento ou instituições de moeda eletrónica, apenas os chamados fundos de crédito e as sociedades ou fundos de titularização de créditos, que são também entidades reguladas, passam a poder comprar créditos em qualquer situação de cumprimento e independentemente da sua classificação em termos de probabilidade de cumprimento. Quaisquer outros compradores vêm limitadas as suas opções e apenas podem adquirir créditos em determinadas circunstâncias.
Novas regras para os servicers
Os compradores dos créditos passam a ter de contratar um gestor de créditos (servicer) devidamente autorizado pelo Banco de Portugal. Os servicers passam a estar sujeitos a um processo de autorização prévia, desde logo a uma avaliação de “fit&proper”, junto do BdP que passa a supervisionar a sua atividade.
Deveres concretos perante os devedores
Os cedentes (bancos e outras instituições que vendam créditos), ficam obrigados a deveres de informação sobre as operações de cessão.
As entidades compradoras e os servicers, por outro lado, passam a estar expressamente obrigados a deveres de confidencialidade e segredo, boa-fé e não-assédio ou coação, sempre com o objetivo de proteger a posição dos devedores, em especial os devedores particulares, muitas vezes abrangidos por estas operações.
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