Os custos da ignorância em Portugal (III)
O OE para 2023 vai agravar ainda mais os custos da ignorância provocados pelo mau funcionamento do sistema de preços, cria mais burocracia, aumenta a despesa e agrava os impostos.
Nas duas últimas semanas foram apresentados os custos da ignorância em Portugal provocados pelo deficiente funcionamento do sistema de preços causado por excessiva burocracia e pelas “falhas de governo”. A terceira causa para um deficiente funcionamento dos preços que afecta negativamente o nível de vida dos portugueses são os impostos.
Quanto maior o nível de impostos pagos pelos portugueses menos é o dinheiro que lhes resta para viver. Os portugueses entregam em média quase 40% do seu rendimento para o governo gastar, o que significa que muitos entregam mais de metade sem disso se aperceberem. O peso do que nos é imposto asfixia a nossa liberdade.
Este valor sofreu um agravamento sem precedentes nos últimos anos. Desde 2015 até ao orçamento que será votado hoje a receita corrente do Estado vai crescer 49%, o que significa que os portugueses “perderam” quase 35 mil milhões € em oito anos. É muito dinheiro para tão poucos resultados (ver artigo da semana passada).
Ao provocar o aumento dos preços, os impostos reduzem as possibilidades de consumo das famílias e de investimento das empresas. O valor brutal do aumento de impostos verificado desde 2015 representa uma quebra significativa na liberdade de escolha dos portugueses.
Para além de retirarem poder de compra, os impostos provocam uma grande distorção nos preços dos bens e na relação entre eles, afectando fortemente as decisões das famílias e das empresas e, com isso, o funcionamento dos mercados e a riqueza da sociedade. A intuição é que o sistema de preços opera como um transmissor de informação e o seu mau funcionamento reduz o conhecimento ou aumenta a ignorância dos agentes económicos quando tomam decisões, prejudicando o desenvolvimento.
A profusão de impostos e de diferentes taxas significa que decisões que deveriam reflectir as preferências dos agentes económicos passam a reflectir, pelo menos parcialmente, tentativas para minorar a “factura” fiscal, induzindo opções erradas sobre a capacidade produtiva a instalar e sobre as quantidades de bens e serviços a disponibilizar à sociedade.
Esta distorção afecta os sectores de forma diferente, alterando os preços relativos e agravando ainda mais os problemas causados, pois o que economicamente é mais barato de produzir pode tornar-se mais caro de consumir pela maior carga fiscal.
Ao impedir ou confundir estas decisões económicas, o nível de impostos prejudica ainda mais a sociedade cada vez que é aumentado, pois os agentes económicos ficam ainda mais na ignorância, com custos crescentes para o país em termos de atraso no desenvolvimento. E esse prejuízo ainda é maior se a receita obtida com os impostos for mal aplicada, como aconteceu nos últimos anos, resultando num empobrecimento efectivo da sociedade.
Os exemplos deste problema são cada vez mais numerosos na sociedade portuguesa: “impostos” sobre a aquisição de tabaco, bebidas, refrigerantes, bolos, electricidade, combustíveis, automóvel, circulação, audiovisual, recursos florestais, direitos de autor, sal e outros, para além do IVA, do selo, e dos impostos que incidem directamente sobre o rendimento e das centenas de taxas e coimas previstas um pouco por todo o país.
Um exemplo que em tempos coligi, relativo à compra a crédito e utilização de um automóvel, é elucidativo. Para concretizar esta aquisição, a família tem rendimentos sobre os quais paga IRS e que serão necessários para conseguir o empréstimo a que vai recorrer para comprar o carro e para ajudar a liquidar os muitos “impostos” que estão associados à transacção.
Primeiro, paga o imposto automóvel e o IVA que incide sobre o valor do carro e sobre o valor do imposto automóvel pago. Depois paga impostos sobre os combustíveis mais o IVA que incide sobre o valor do combustível e sobre o valor do imposto pago para o carro poder arrancar. Paga também imposto de circulação para andar nas estradas e portagens para autoestradas e pontes, além do estacionamento. Paga ainda imposto de selo sobre o contrato de financiamento e é obrigado a fazer um seguro que não é barato e sobre o qual tem de pagar novamente imposto de selo e ainda 2 taxas (INEM e Fundo de Garantia Automóvel). No total, paga 13 “impostos” sobre o rendimento que vai aplicar para poder utilizar o automóvel.
O efeito negativo destes impostos não é apenas sobre o rendimento, mas também em termos de equidade, pois impossibilita a aquisição de automóvel a muitas famílias ou limita a possibilidade de terem um veículo mais seguro e de melhor qualidade. Esta distorção é grave e explica porque é que o parque automóvel em Portugal é de menor qualidade face ao dos vizinhos espanhóis, por exemplo: os portugueses são duplamente prejudicados porque possuem um menor rendimento disponível para comprar um veículo e o seu preço é mais elevado no nosso país por causa da maior carga fiscal. O mesmo acontece com a fonte de energia que os automóveis usam, seja combustível ou eléctrica.
Num mercado que se diz único na UE, o que seria natural era que os portugueses fossem a Espanha comprar o mesmo carro por um preço mais baixo. Mas o mercado só é único porque tem esse nome. Para poder circular regularmente nas estradas nacionais com um veículo adquirido em Espanha, é necessária uma matrícula portuguesa no carro, e o custo da mudança é, na realidade, uma tarifa à importação do automóvel, ou seja, a negação de um mercado livre e aberto.
Um outro exemplo ajuda a perceber o papel dos impostos no agravamento da iniquidade. A proposta que o CDS-PP apresentou num cartaz em frente ao parlamento para eliminar o IVA sobre os bens alimentares essenciais tem uma dupla vantagem: ajuda as pessoas mais carenciadas e torna mais transparente e eficiente o funcionamento do mercado. Ou seja, é vantajosa em termos de equidade e em termos de eficiência. Só não é vantajosa para os interesses instalados que se alimentam do orçamento de Estado e por isso não é implementada.
A outra distorção grave provocada pelos 13 “impostos” é a mudança nos preços relativos, alterando muitas decisões que se desejavam racionais do ponto de vista económico e deixam de o ser. Os 13 “impostos” necessários para se usar um bem tão necessário como o automóvel encarecem a sua compra, mas também tornam relativamente mais barata a compra de outros bens ou serviços, como por exemplo as viagens aéreas. Para se ir de Lisboa ao Porto pode tornar-se vantajoso para uma pessoa usar o avião em vez do automóvel, mas essa não é uma aplicação de recursos desejável dado o maior custo económico e ambiental com a manutenção de equipamentos que o avião requer, os seus custos de operação e as emissões que gera.
O Orçamento de Estado para 2023 vai agravar ainda mais os custos da ignorância provocados pelo mau funcionamento do sistema de preços: cria mais burocracia, aumenta a despesa para alimentar mais e maiores “falhas de governo” e agrava os impostos directos e indirectos. Claramente não é uma boa política fiscal.
Desde 2015, a receita acrescida de 35 mil M€ que o governo subtraiu ao rendimento dos portugueses foi usada em despesas de “mercearia” de 30 mil M€ e no reforço da austeridade para pagar a divida pública que os socialistas criaram desde o ano 2000. Os custos da ignorância traduzem-se em não ter sido usada para nada de importante para a sociedade portuguesa. Esta política de irrelevâncias não só não é boa como não é sustentável, ameaçando gravemente as nossas esperanças num futuro melhor.
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