Paga-se mal, ponto!

Para remunerar bem profissões específicas, mais técnicas, para diferenciar sequer quem trabalha bem ou nem por isso, o Estado não tem elasticidade.

  1. Três dados marcam a semana: os juros da dívida a dez anos refletem temor económico; O investimento público ficou mais de mil milhões de euros abaixo do previsto; Portugal cresceu menos do que o esperado. Depois da queda das bolsas no final do ano, confirmado o abrandamento das exportações portuguesas e das principais economias europeias, sublinha-se a chegada de um novo ciclo económico. Menos esfuziante e menos alinhado, seja no preço do petróleo, nos juros ou no crescimento.
  2. Os números definitivos do PIB vincam uma trajetória descendente: de 2,8 em 2017 para 2,1 em 2018. De uma décima abaixo do previsto pelo governo em outubro para 1,6% em 2019. Dois anos de evolução do PIB acima da média, seja da Zona Euro ou da União Europeia, lado a lado com 20 trimestres de crescimento consecutivos – a melhor sequência deste século XXI -, sublinham a pergunta estrutural: está Portugal preparado para a mudança da conjuntura externa? Provavelmente, não. A despesa cresce mais do que a própria economia e o endividamento de famílias e empresas mais do que devia. Uma relação fatal quando os dados mudam.
  3. Na greve dos enfermeiros, dois meses e oito mil cirurgias depois, o governo decidiu atuar e repor a normalidade de uma paralisação cuja frequência – e não as causas, entenda-se – são inaceitáveis no que provocam a quem mais precisa de cuidados de saúde. Nenhum executivo de bom senso aceitará uma subida de 400 euros no salário de entrada para uma profissão. Menos, ainda, uma reforma aos 57 anos. Os custos definitivos representam, anualmente, cerca de 1000 milhões de euros. Mas o problema é mais profundo e vai para além de não haver dinheiro.
  4. Vale um enfermeiro mais do que 1200 euros por mês? Seguramente que sim. Tanto como um médico, mesmo em princípio de carreira, deveria receber mais do que 1500, depois de tantos anos de formação e investimento. Em Portugal, paga-se mal, ponto! A questão é que para remunerar bem profissões específicas, mais técnicas, para diferenciar sequer quem trabalha bem ou nem por isso, o Estado não tem elasticidade. Foram décadas de amortecimento social, a ajudar a que o desemprego não subisse. Hoje, tem muito mais gente do que devia. E todos nivelados por baixo, porque é incapaz de premiar ou corrigir. A indiferença reflete-se depois em todas as áreas, seja no relatório sobre a limpeza da estrada de Pedrógão ou nas festas da cadeia de Paços de Ferreira. Na memória, fica a frase da antiga diretora do estabelecimento prisional: 20 dos guardas estão de baixa. Seis nunca apareceram!
  5. O impasse na Venezuela veio para ficar, a expensas do povo e durante largos meses. Num país dependente do petróleo e refém da queda dos preços no mercado internacional, Maduro teve uma oportunidade de relançar o seu regime. Bastava para isso que aceitasse eleições para uma nova Assembleia, não colocando em causa o seu papel de presidente, mas dando um sinal de abertura depois do último fracasso eleitoral. Ao invés, aumentou a pressão sobre os militares e as forças de segurança. E transferiu para a ajuda alimentar o centro da querela. É curioso ver como na discussão do futuro da Venezuela regressaram os alinhamentos da Guerra Fria: Europa e Estados Unidos de um lado, Rússia e China do outro. Enquanto isso, Guaidó perdeu fôlego, tanto como as manifestações nas ruas. E o tema vai abandonando, paulatinamente, o espaço mediático.
  6. Não há memória de um desporto que floresça na suspeita e na dúvida permanente. A última polémica lança a possibilidade de haver jogadores pagos para lesionarem adversários e atira o futebol português para o grau zero da credibilidade. O que verdadeiramente surpreende não são declarações inflamadas de permanente intifada, que têm radicalizado o panorama nacional nos últimos anos. O que espanta é que patrocinadores, operadoras como Nos ou Altice que têm mais de 2 mil milhões de euros investidos em direitos, para além da própria Liga, sejam omissos relativamente à destruição e erosão do negócio. E onde, no fim, todos conseguem perder dinheiro!
  • Jornalista. Subdiretor de Informação da TVI

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