Preparar o futuro

  • António Macedo Vitorino
  • 9 Abril 2020

O novo decreto do estado de emergência cerceia um pouco mais a nossa liberdade. Justo se for para prevenir a doença, mas perigoso quando leva ao exagero e à perseguição.

Foi aprovado há dias no Parlamento o prolongamento do estado de emergência. Todos dias contam-se os infetados e o número de testes e lamentam-se mais mortes. Vemos os noticiários e continuamos com a mesma lengalenga e as entrevistas às pessoas do costume. São horas e horas. Surpreende que os políticos continuem com os mesmos tiques e os mesmos rituais. As solenidades e os discursos, como sempre. A demagogia também. Porque em tempos de emergência esperava-se que todos se unissem numa causa comum e não no unanimismo do discurso, mas não é assim. O que deveríamos era cuidar dos vivos e preparar o futuro.

Na minha empresa todos trabalhamos a partir de casa. Não há perturbações no aconselhamento dos clientes. As equipas reúnem-se regularmente por videochamada. Aprendemos diariamente a trabalhar melhor com as ferramentas tecnológicas de que dispomos. As videoconferências funcionam quase na perfeição. Descobrimos novos métodos de organização do trabalho. E quando sairmos de casa, estaremos melhor preparados. O trabalho flui. Mas vemos que o ritmo está mais lento e que a economia trava, nuns casos a fundo e noutros mais devagar.

Por isso estamos a pensar em projetos para o pós-Covid. Olhar para o que estávamos a fazer e tentar perceber se faz sentido dentro de um ano.

Sabemos que o turismo, uma das nossas principais indústrias, precisará de pelo menos um ano para voltar a crescer. Primeiro terá de terminar o medo da pandemia e da chamada “segunda vaga” do vírus no outono/inverno, que verdadeira ou falsa assusta todos. Só com uma vacina se restabelecerá a confiança e isso só virá em 2021.

Todos os serviços dependentes do turismo e do consumo perderão muito com a crise. Por arrastamento, a construção e o imobiliário sofrerão perdas irrecuperáveis a curto prazo. Entretanto as cadeias de transporte e distribuição sofrerão. O consumo diminuirá. A produção industrial também.

Arrisco a dizer que o PIB português cairá em torno de 10%.

As linhas de crédito e as moratórias feitas para salvar as empresas hoje apenas acrescentarão mais dívida. Mais dívida privada e mais dívida pública. No final de 2020 estaremos mais pobres e mais endividados.

Em 2021 e 2022, os governos europeus, o português muito em particular, procurarão aumentar a sua receita, que é como quem diz aumentar os impostos para pagar as despesas de hoje e a perda de receitas provocada pela quebra económica.

No final nada ficará igual.

Sim, haverá perda de emprego. Não vale a pena proibir os despedimentos se não houver quem pague os salários dos “não despedidos”. Isto não vai lá com proibições. A única medida bem gizada por este governo foi o lay off simplificado”. Claro que lá tinha de vir o funcionalismo zeloso na proteção dos cofres públicos dizer que este mecanismo não se aplicava à empresa que deixou de fechar para proteger os seus trabalhadores sem que o governo a tivesse obrigado a encerrar. Quiçá teria sido melhor que a empresa pusesse em risco os seus funcionários.

Proteger o emprego deve ser a primeira medida. Deem-se mais incentivos financeiros às empresas que não despeçam ninguém em 2020. Isentem-se as pequenas e médias empresas afetadas pela crise de parte da taxa social única durante o primeiro semestre que não despeça em 2020.

A segunda medida deveria ser proteger as empresas.

Se quisermos fazer hoje mais pela economia do futuro deveremos, mais do que nunca, procurar capitalizar as empresas. Capitalizar significa trazer dinheiro novo. Os sócios e os acionistas terão de ir ao baú das suas poupanças e investir para aguentar hoje e preparar as suas empresas para o futuro. Os que saírem desta crise com a sua capacidade de produção intacta, estarão mais fortes amanhã, quanto mais não seja porque muitos outros sucumbirão.

Se os governos quiserem ajudar a preparar o futuro deveriam dar benefícios significativos aos investimentos feitos por sócios e acionistas nas empresas. Por exemplo a isenção de IRC sobre os lucros por um prazo muito longo para as novas ações resultantes de aumentos de capital feitos durante o ano de 2020. Assim uma empresa que duplicasse o seu capital social agora só pagaria IRC sobre metade dos seus lucros por um prazo que poderia ser de 10 anos. Em vez de CoronaBonds (dívida europeia encapotada ou descarada) teríamos CoronaShares.

Também poderíamos ter CoronaBonds empresariais, ou seja, obrigações emitidas pelas empresas, todas as empresas, sem requisitos de capital mínimo e sem as burocracias legais habituais, com isenção de impostos pelo prazo da sua vigência, mas também sem qualquer garantia estatal.

Novo capital pode significar novo sangue e uma nova vida para as empresas.

E, no entanto, os nossos políticos pedem hoje que se proíbam os lucros dos bancos em 2020 e 2021 e amanhã talvez peçam que se proíbam os lucros de todas as outras empresas. A demagogia sempre se deu bem com as situações de crise. As ditadura também.

O novo decreto do estado de emergência cerceia um pouco mais a nossa liberdade. Justo se for para prevenir a doença, mas perigoso quando leva ao exagero e à perseguição. Não esqueçamos que o “inimigo” é um vírus, não é nenhum dos nossos concidadãos, rico ou pobre, homem ou mulher, de uma ou outra raça, novo ou velho.

Voltando ao dia a dia, neste momento trabalho com outros colegas e parceiros em vários projetos na área da tecnologia e da inteligência artificial. Provavelmente a empresa não terá as mesmas condições para os financiar em 2020, mas não deixará de o fazer de uma ou outra forma porque o futuro está aí.

Juntos venceremos esta crise!

E #fiqueemcasa.

  • António Macedo Vitorino
  • Sócio da Macedo Vitorino & Associados

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