Propriedade intelectual na política – que partido tomar?
Não é de estranhar que partidos políticos recorram à propriedade intelectual como ferramenta de apoio à atração no contexto eleitoral. Isso pode passar pelo registo de marcas e slogans próprios.
Na arena política moderna, a comunicação é essencial e particularmente relevante em contexto eleitoral. Não é de estranhar, pois, que partidos políticos recorram à propriedade intelectual como ferramenta de apoio à atração neste contexto. Isso pode passar tanto pelo registo de marcas e slogans próprios, como pelo (ab)uso de propriedade intelectual de terceiros. Neste último campo temos assistido, por exemplo, ao recurso a materiais de campanha que incorporam elementos semelhantes ou a associações claras a entidades e marcas conhecidas, bem como ao uso de canções e vídeos de terceiros, imagens famosas ou frases de filmes, sem autorização.
Os partidos tendem a apelar à natureza não comercial da atividade partidária para justificar a aparente irrelevância das condutas a que nos referimos ou o menor interesse que estas possam ter para os titulares dos direitos, a ponto de adotarem medidas tendentes a cessar a violação dos mesmos em contexto político. Noutra perspetiva, vale notar que, para os titulares dos direitos, tentar reprimir uma certa forma de comunicação política pode ter efeitos reputacionais adversos, com reflexos junto do público consumidor dos produtos e serviços comercializados por essas entidades (risco que é mais significativo quanto mais expressiva for a percentagem de eleitores que o partido representa). Tal não impediu, no entanto, que noutros mercados com mais relevância comercial que o português, como é o caso dos EUA, se lançasse mão de meios jurídicos em face da violação de direitos de propriedade intelectual em sede eleitoral.
Em setembro, Jack e Meg White (que formam o duo musical norte-americano The White Stripes) acusaram Donald Trump de violação de direito de autor, pela reprodução da icónica linha de baixo da canção “Seven Nation Army” num vídeo de campanha. Pouco tempo antes, Céline Dion já se tinha oposto publicamente ao uso de “My Heart Will Go On” num evento eleitoral republicano (assim como outros artistas, como Beyoncé e Bruce Springsteen, fizeram quanto ao uso de canções suas no mesmo contexto). Nas campanhas eleitorais de 2016 e 2020, Trump já tinha enfrentado alegações semelhantes, relacionadas com o uso de música de terceiros em rallies e eventos públicos (por exemplo, por parte de Rihanna e Pharrell Williams). O ex-Presidente ainda não aprendeu e, no início de setembro, um juiz de Atlanta decidiu preliminarmente que Donald Trump e a sua equipa de campanha deviam cessar de imediato o uso da canção “Hold on, I’m coming”, num processo urgente apresentado pela família do falecido artista Isaac Hayes para esse efeito.
O uso generalizado de meios digitais – veja-se que atualmente quase todos os partidos políticos recorrem a redes sociais – vem acentuar a importância da questão, porque abre ainda mais o caminho para a utilização de conteúdos violadores de direitos de terceiros: imagens, vídeos, canções (mesmo que excertos), até memes… a propriedade intelectual está em todo o lado.
Evidentemente, são os próprios partidos políticos que deveriam cuidar de obter as necessárias autorizações e licenças para explorar direitos de terceiros ou adotar diligências no sentido de pelo menos indicar, em cada contexto, quem é titular dos direitos relevantes, ao abrigo de padrões de licitude, transparência e zelo que também devem pautar a comunicação em política. Ademais, redes sociais como o Facebook ou o Instagram têm, hoje em dia, bibliotecas de músicas cuja utilização livre é permitida e diretrizes quanto à utilização de conteúdos de terceiros em publicações nessas redes. Há, assim, cada vez menos motivos para que se olhe para este domínio como uma terra sem lei.
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