Teletrabalho transfronteiriço – novos desafios
A prática do teletrabalho transfronteiriço coloca, como se percebe, questões difíceis de conflitos de leis que requerem uma resposta no plano normativo supranacional da União Europeia.
A crise pandémica impulsionou o teletrabalho. Finda a pandemia, verifica-se que esta prática de smart working, em que o trabalhador presta o seu trabalho para a entidade empregadora, em local não determinado por esta (frequentemente desde o domicílio do trabalhador), com recurso a tecnologias de informação e de comunicação, veio para ficar.
O teletrabalho tem sido objeto de especial atenção em vários Estados-Membros da União Europeia, incluindo Portugal. Também o legislador da União Europeia compreendeu o potencial do teletrabalho como parte da estratégia para facilitar a conciliação entre a vida profissional e a vida familiar dos trabalhadores. Intervenções como a do legislador português têm-se orientado, quer no sentido de facilitar o teletrabalho (atendendo às vantagens desta forma de trabalho flexível para a aludida conciliação entre vida familiar e profissional), quer no sentido de regular o teletrabalho, impondo obrigações para os empregadores ao nível, inter alia, do direito ao descanso do trabalhador e a não ser contactado pelo empregador em horas de descanso, da privacidade, ou da segurança e saúde no trabalho.
A prática do teletrabalho tem, em grande parte dos casos, um caráter puramente interno relativamente a um ordenamento nacional. Será o que sucede quando o trabalhador presta o seu trabalho, desde o seu domicílio, num Estado, em execução de contrato de trabalho com entidade empregadora também localizada nesse Estado. Noutros casos, no entanto, o teletrabalho surge em contexto internacional, colocando desafios adicionais e questões para as quais não há resposta fácil. São desafios comparáveis àqueles que foram e continuam a ser colocados (apesar da intervenção do legislador da União Europeia desde a Diretiva 96/71) pela prática do destacamento, como forma de mobilidade internacional de trabalhadores no âmbito de prestações de serviços na UE.
Com efeito, muitos trabalhadores poderão prestar o seu trabalho habitualmente, desde o seu domicílio localizado num Estado (o Estado de origem do trabalhador), para uma entidade empregadora localizada noutro Estado, de destino. Esse trabalho pode ser executado no Estado de origem de modo adequado às necessidades da entidade empregadora e com o pleno assentimento desta à sua execução noutro Estado.
O Direito que regulará o contrato individual de trabalho de um trabalhador em teletrabalho transfronteiriço será o do Estado de origem do trabalhador, que poderá até nem ser um Estado-Membro da União Europeia, ou o do Estado de destino?
Sendo aplicável o Direito do Estado de origem, por se considerar que é aí que o trabalhador presta habitualmente o seu trabalho em execução do contrato, esse trabalhador poderá, então, auferir, eventualmente, uma remuneração bem inferior à praticada no Estado de destino onde legalmente se imponham níveis salariais mais elevados. Esta situação poderá originar uma forte concorrência, para os trabalhadores daquele Estado-Membro de destino, por parte de trabalhadores que executem o seu trabalho, em modo remoto, em Estados onde as condições de trabalho sejam menos onerosas para as entidades empregadoras.
E serão aplicáveis as normas imperativas do Estado de destino relativas ao teletrabalho, mesmo que o contrato individual de trabalho esteja submetido ao Direito do Estado de origem?
Tal como ocorre com o destacamento, também a prática do teletrabalho transfronteiriço coloca, como se percebe, questões difíceis de conflitos de leis que requerem uma resposta no plano normativo supranacional da União Europeia.
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