Os associados do Montepio estão a votar esta sexta-feira para escolher o novo presidente. O ECO foi à Rua do Ouro, na Baixa, falar com os associados que se dirigiam à mesa de voto.
Na sede do Montepio, na zona da Baixa lisboeta, as urnas abriram às 9h, mas a movimentação só se notou cerca de uma hora depois. Na entrada do edifício, apesar do silêncio, as poucas palavras que se iam ouvindo eram sempre as mesmas: “vim para votar”. Evaristo Branquinho, com 65 anos, é um dos cerca de 480 mil associados com direito a votar para escolher a próxima administração da Associação Mutualista Montepio Geral. “Infelizmente, se calhar, serão os do costume a ganhar”, diz, ao ECO, deixando implícito que não é a favor de um novo mandato de Tomás Correia, atual presidente da administração. Para o reformado, devia haver um limite de mandatos porque acabam por se criar “riscos minuciosos”. “E, no caso deste banco [a Associação é dona do banco Caixa Económica Montepio Geral], isso é público”, nota.
As pessoas saem e entram, e vão-se cumprimentando à medida que os apoiantes das diferentes listas vão chegando. Assim como Evaristo Branquinho, que defende que Tomás Correia “está cá há tempo demais”, também Carlos Lapa, com 76 anos, partilha da mesma opinião. “Os resultados são uma incógnita, porque isto está tudo viciado”, diz, sem deixar alongar mais a conversa.
Mas, se uns gritam pela mudança na administração da Associação Mutualista, outros apoiam Tomás Correia e defendem a sua continuidade. É o caso de Sousa Cintra, ex-presidente da SAD do Sporting, que também veio votar. Referindo-se ao Montepio como uma “instituição importantíssima”, nota que, ultimamente, “tem havido muito ruído e esse ruído não é bom para ninguém”. “É desagradável haver tanto ruído com uma instituição como o Montepio que presta um grande serviço aos que mais precisam. Tem de haver mais contenção e respeito, a instituição merece”, continuou.
Entendo que o trabalho feito por ele [Tomás Correia] tem sido benéfico. Ele é um homem muito sensível à área social e isso é muito importante. Ele até fez um bom trabalho, portanto vou votar nele. Independentemente do ruído, que eu acho que não tem muito sentido.
Embora tenha fugido à questão inicial sobre o candidato no qual ia votar, Sousa Cintra lá acabou por abrir o jogo. “Entendo que o trabalho feito por ele [Tomás Correia] tem sido benéfico. Ele é um homem muito sensível à área social e isso é muito importante. Ele até fez um bom trabalho, portanto vou votar nele. Independentemente do ruído, que eu acho que não tem muito sentido”, disse. Afirmando que as “coisas têm funcionado dentro da normalidade”, o empresário rematou, dizendo: “Tomás Correia tem sido um bom gestor. Se não, eu não votava nele”.
A partilhar da mesma opinião está Manuel Oliveira, com 65 anos, que vem votar pela primeira vez. Embora tenha preferido, de início, não revelar o voto, lá acabou por abrir o jogo. “Se calhar a administração atual está como deve ser”, diz ao ECO, acrescentando que não tem acompanhado muito o desenvolvimento do banco. Questionado se tem acompanhado as notícias recentes sobre Tomás Correia, Manuel responde: “Sim, tenho estado a par e tem havido uma série de pequenos ‘senãos’ que têm aparecido na comunicação social”. Mas não se mostra preocupado. “Geralmente, nestas situações, aparece sempre qualquer coisa no ar para perturbar”.
O tempo vai passado e, pouco depois, cerca das 10h30, Fernando Ribeiro Mendes aparece para exercer o seu direito de voto. O candidato da Lista B começa por referir que a participação dos associados acaba por ser prejudicada pelos votos por correspondência. Até ao início desta manhã, foram 45.300 os associados a votar através deste método, sabe o ECO. “Ao longo da campanha eu alertei para alguns dos problemas que, a meu ver, existem, do ponto de vista de transparência e isenção dos procedimentos eleitorais, mas agora é o momento do voto e depois falaremos”, disse, antes de entrar para o edifício. Independentemente do resultado, Ribeiro Mendes acredita que nada ficará como antes.
E é uma mudança que Paulo, nome fictício porque não quis revelar a sua identidade, defende. Parado na entrada do edifício, mesmo depois de ter votado, conta-nos o que pensa sobre estas eleições. “Votei contra o vilão. A administração precisa de uma mudança, mas radical. Tem que entrar no campo da seriedade”, diz. Notando que o primeiro erro desta administração foi lançar uma OPA sobre o Finibanco, somado às “aproximações que fez a outro vilão, Ricardo Salgado”, o associado do Montepio deixa no ar uma esperança: “Espero que este banco se salve. Livrando-se destas cabeças, automaticamente vai entrar no bom caminho”, atira. Contudo, pouco confiante: “O vilão tem maneiras hábeis de continuar a enganar as pessoas, esse é o meu medo”.
Espero que este banco se salve. Livrando-se destas cabeças, automaticamente vai entrar no bom caminho. O vilão tem maneiras hábeis de continuar a enganar as pessoas, esse é o meu medo.
Isabel Lopes da Silva, com 73 anos, também votou contra a Lista A, liderada por Tomás Correia. Em conversa com o ECO, mostrou-se uma apoiante fervorosa da Lista C, encabeçada por António Godinho. “Estou confiante de que vamos ganhar, é a minha aposta, sem dúvida”, disse. Para a economista, a Lista C é “justa, de gente muito trabalhadora e séria” e tem a certeza de que muitos da Lista B votarão nela. Sobre a atual administração, adota uma postura muito severa: “Não pode continuar, é demais. Muita gente não votará em nós por medo, principalmente os que estão ao serviço, o que é natural”, continua. “Alguns membros, não vou citar nomes, são arguidos, oficialmente. É vergonhoso! Não é só por ele, ele é um elemento apenas”, rematou.
António Godinho, candidato à administração pela Lista C, aparece na sede do Montepio ao final da manhã. Espera que se “inicie um novo ciclo de gestão do Montepio” e que seja um “processo eleitoral limpo e transparente”, acrescentando que este não é o caso. Relativamente à queda de cerca de 10% do número de associados que votou por correspondência, o candidato acredita que isso é um “reflexo da forma como se gere a Associação Mutualista”. “Não se chamam os associados a participar na vida da Associação e no processo eleitoral e, havendo só uma única urna em Lisboa e existindo o voto por correspondência, mantêm-se os associados à distância”, disse.
Para António Godinho, a sua candidatura não tem que ver com “uma questão de poder ou luta eleitoral”, mas sim com uma luta para mudar o Montepio. “Estaremos, dentro ou fora, sempre a lutar para que se restabeleça a democracia e as boas práticas de gestão no Montepio”, disse, acrescentando que “teria sido mais fácil com uma lista única, mas não se pode obrigar todas as pessoas a entenderem-se”. Ainda assim, vencendo ou não, deixa a promessa: “Tudo o que sirva para afastar esta gestão da Associação Mutualista, nós vamos obviamente estar disponíveis”. Porque, tendo em conta esta realidade que é “preocupante”, há várias práticas onde a gestão é “opaca e pouco transparente”.
António Godinho enfrentou Tomás Correia nas últimas eleições, tendo na altura ficado com 40% dos votos, contra os 60% do atual presidente.
Estaremos, dentro ou fora, sempre a lutar para que se restabeleça a democracia e as boas práticas de gestão no Montepio. Tudo o que sirva para afastar esta gestão da Associação Mutualista, nós vamos obviamente estar disponíveis.
Noémia e José Vicoso, casados e com cerca de 70 anos, sublinham as palavras de António Godinho. “Para mim é a lista C, eu quero que ganhe essa”, diz Noémia, animada. Mas, tal como Isabel Lopes da Silva, também apoiante desta lista, têm sérias dúvidas sobre as mudanças na administração, referindo o mesmo problema dos funcionários. “O Montepio é muito problemático na medida em que os funcionários ficam muito condicionados às administrações e, muitas vezes, têm de baixar as orelhas. Nesse sentido tenho as minhas dúvidas”, disse. Sobre o percurso dos últimos três mandatos, a resposta do casal vem ao mesmo tempo e no mesmo sentido. Se José atira a palavra “péssimo”, a esposa classifica-o como “o pior possível”. Para os dois sócios, “muito antigos”, o desejo é ver o banco Montepio continuar as pisadas daqueles que o fundaram. “Eu queria muito, e esperava que esta gente [associados] tivesse o bom senso de olhar para isto com outros olhos e fizessem a mudança”, remata Noémia.
Ricardo é outro associado que não quis ser identificado, e preferiu tecer críticas à comunicação social, defendendo a atual administração. “O Montepio é uma instituição que pode ter feito alguns erros, como outros bancos fizeram. Eu trabalhei naquele que hoje se chama hoje Millennium, esteve muito mal também, mas hoje está fantástico. E tenho visto que as últimas semanas têm sido uma descarga de notícias para prejudicar não as pessoas que estão a concorrer, mas o Montepio”, disse, embora a esposa tivesse insistido para ele não falar sobre o assunto. “Foi um mandato positivo, não há direito de a comunicação social fazer uma coisa destas, é intencional”, continuou. Para o futuro, embora não tenha querido responder se a Associação Mutualista precisa de uma mudança, fica o desejo de um bom caminho. “Espero que seja como o Millennium, que suba e suba e suba!”, rematou.
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Uns não querem o “nome do costume” no Montepio, outros preferem continuar com o “homem sensível”
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