Grandes investidores contra proposta de troca do Novo Banco
Credores como a Pimco enviaram uma carta ao Novo Banco e ao Banco de Portugal a reclamar uma reunião “urgente”. Não estão dispostos a aceitar as condições oferecidas. Venda ao Lone Star em risco.
Um grupo de grandes investidores do Novo Banco, entre os quais se encontra a Pimco, está contra a proposta de compra de obrigações anunciada ao mercado no dia 25 de julho e, neste quadro, enviou uma carta à instituição liderada por António Ramalho e ao Banco de Portugal a propor uma reunião urgente. O ECO sabe que este grupo – que detém mais de 30% das obrigações – enviou a carta ao Novo Banco e ao supervisor na passada quinta-feira à noite por email e no dia seguinte por correio, com conhecimento também para as autoridades europeias.
O sucesso desta operação é uma das condições obrigatórias que têm de ser cumpridas para que o Novo Banco possa ser vendido aos norte-americanos do Lone Star. Por isso é que no passado dia 24 de julho o Novo Banco anunciou uma proposta de troca de obrigações por dinheiro, com o objetivo de conseguir uma almofada adicional de capital, de 500 milhões de euros. Esta operação implica que os atuais credores assumam perdas já que as obrigações serão recompradas pelo Novo Banco com desconto (face ao valor facial) de dez a 90%.
A ameaça: sem nós a operação não avança
Na carta, a que o ECO teve acesso a alguns excertos, o grupo faz uma ameaça pouco velada: sem nós a operação não se faz. Isto porque para que a operação tenha sucesso, pelo menos 75% dos credores terão de dar o seu ok na Assembleia convocada para o dia 8 de setembro.
Na missiva, o grupo, que se apelida de Comité de Obrigacionistas, diz que “o seu tamanho e influência faz com que sejam indispensáveis para o sucesso de qualquer LME [operação de troca]”. Ou seja, fazem questão de deixar claro que o LME — Liability Management Exercise na terminologia anglo-saxónica — não avança sem eles.
“Encorajamos o Banco a envolver-se com o Comité de forma apropriada para garantir que o LME tenha sucesso. A postura que o Banco tomou até esta data não reconhece que será impossível implementar com sucesso a oferta sem o apoio deste grupo”, lê-se na missiva.
Apenas uma reunião formal até agora
Este grupo, que contratou a firma britânica PJT Partners como assessora financeira, terá tido apenas uma reunião com responsáveis do Novo Banco três dias antes de ser anunciada a oferta de troca e, desde então, garante que tem, de forma reiterada, feito pedidos para ser formalmente recebido, coisa que até esta terça-feira à noite ainda não terá acontecido. Esta versão não é, ainda assim, corroborada por fontes do ECO que acompanham o processo do lado do Novo Banco e Banco de Portugal. Mais: a proposta anunciada ao mercado terá sido diferente daquela que foi apresentada aos fundos, precisamente porque incorporou algumas das suas sugestões. “Não toda, mas foi feito um esforço sério para aceitar as possíveis”, garantem.
Ainda assim, o grupo de investidores não percebe o silêncio do Novo Banco, cuja postura classifica na carta de “não satisfatória”, mas diz que “o Comité está disposto a discutir compromissos voluntários [com o Novo Banco] para facilitar a operação de venda com sucesso e o subsequente processo de reabilitação do banco”. Sobre o LME que está em cima da mesa considera que não tem uma base legal, e que só foi implementado para melhorar as condições de venda ao Lone Star.
Não sabem que juros vão receber
Além de garantirem não ter tido feedback por parte do Novo Banco, o que estranham, já que sem eles a oferta cai por terra, este grupo não percebe como é que é possível que a operação tenha já arrancado a 25 de julho e, até agora, ainda não tenha tido informações sobre parte das condições da oferta, nomeadamente os juros, a maturidade e a liquidez dos depósitos que serão oferecidos aos obrigacionistas que aceitarem a oferta. O Jornal de Negócios (acesso pago) avança que o Novo Banco está disposto a pagar um juro até 6,5%, dependendo da maturidade da aplicação, para minimizar perdas, mas aos investidores de retalho.
A resposta das mesmas fontes do Novo Banco e Banco de Portugal é clara: o grupo de investidores ainda não revelou qual é exatamente a carteira de obrigações que tem e em que séries. “Quando isso suceder, saberão com precisão as condições desses depósitos”, garantem. Além disso, os depósitos são voluntários e não integram formalmente o LME, acrescentam.
Na Rua do Comércio e na Avenida da Liberdade ainda se acredita que esta posição de força por parte deste Comité de Obrigacionistas — que pode comprometer a oferta — possa ser uma espécie de bluff.
Recorde-se que esta oferta, de quase três mil milhões de euros, implica que os obrigacionistas abdiquem dos seus títulos de dívida em troca de cash. Mas o banco também prometeu a quem aceitasse a oferta, a possibilidade de poder vir a ter um depósito no Novo Banco, com maturidade a três e a cinco anos, com “condições específicas”, para que conseguissem pelo menos minimizar as perdas.
Os investidores também estão desconfortáveis com o facto de o Novo Banco poder vir a oferecer taxas de juros diferentes de cliente para clientes, embora o ECO tenha conseguido saber junto de outras fontes que a remuneração que será oferecida pela instituição bancária vai variar em função da série de obrigações detida e não em função de cada cliente.
Do outro lado da “barricada”
Este Comité de Obrigacionistas também torce o nariz à oferta já que os credores, ao aceitarem as condições propostas, poderão ter de abdicar dos processos movidos contra o Novo Banco, sem a devida compensação a que acham ter direito. Recorde-se que parte deste credores do Novo Banco também integram um grupo de obrigacionistas que meteram um processo em tribunal contra a venda do Novo Banco por causa da decisão do Banco de Portugal de transferir, em dezembro de 2015, 2,2 mil milhões de euros de dívida do Novo Banco para a esfera dos ativos do BES, que está em processo de liquidação.
Bluff ou não, os investidores endureceram a sua posição, e mais cedo do que se esperava, tendo em conta que a oferta está no mercado até ao final de setembro. Ainda assim, os grandes investidores estrangeiros estão longe de fecharem as portas a um entendimento, e terminam a carta com um excerto onde se lê: “O Comité reitera a sua disponibilidade para trabalhar convosco de forma construtiva, com o objetivo de chegar a um acordo sobre a revisão das propostas da oferta para que esta possa ser anunciada ao mercado com o apoio público deste Comité. Acreditamos que isto deva ser feito de uma forma urgente e esperamos que possamos chegar a um acordo”.
Recorde-se que este grupo, em maio, também já tinha enviado uma carta ao Banco de Portugal e Novo Banco, com a sugestão de serem eles próprios a comprar o Novo Banco. O ECO sabe também que o grupo está disposto a ficar no banco (trocando eventualmente dívida por capital) como acionista minoritário e com a Lone Star como maior acionista. Uma solução que nunca foi levada a sério pelo Novo Banco e pelas autoridades portuguesas, desde logo pela necessidade de voltar a discutir tudo com a DG Comp (a Concorrência europeia).
Resta saber se o Novo Banco terá alguma abertura para as propostas alternativas destes grandes credores e até onde estão estes investidores dispostos a esticar a corda. Oficialmente, o Novo Banco e o Banco de Portugal garantem que não há qualquer hipótese de mudança das condições da oferta de compra de obrigações seniores já conhecidas. De resto, como lembra uma fonte que acompanha o processo, no Memorando da Oferta é o próprio Novo Banco que coloca em cima da mesa o cenário de liquidação do banco ou de uma resolução (leia-se bail in de obrigacionistas), caso esta oferta falhe.
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