Governo avalia norma do Estatuto da Aposentação considerada inconstitucional

  • Cristina Oliveira da Silva
  • 25 Outubro 2017

Em causa está a regra que abrange funcionários públicos e que dita que a reforma deve ter por base o regime em vigor à data do despacho. Governo está a analisar a questão, depois da decisão do TC.

O Ministério do Trabalho está a avaliar uma norma do Estatuto da Aposentação que foi considerada inconstitucional, mas não avança para já se poderá alterar a legislação. Em causa está uma regra que determina o regime que deve ser tido em conta quando chega a hora de calcular a pensão a atribuir aos funcionários públicos.

Numa decisão publicada em julho em Diário da República, o Tribunal Constitucional (TC) julga inconstitucional, por violar os princípios da segurança jurídica e da igualdade, a parte da norma que determina que a “aposentação voluntária se rege pela lei em vigor no momento em que for proferido o despacho a reconhecer o direito à aposentação.” Ou seja, se as regras mudarem entre a data em que o funcionário pede a reforma e a data em que esta é aprovada, o que conta é o regime mais recente.

Face a esta decisão, o ECO quis saber se a norma pode vir a ser alterada. “Estamos ainda a avaliar a questão. Neste momento é prematuro dizer alguma coisa”, afirmou a secretaria de Estado da Segurança Social. “Temos conhecimento dessa decisão. Resulta das alterações introduzidas em 2013 e, portanto, é uma questão que estamos a analisar juridicamente”, acrescentou.

A decisão do TC só vale para um caso em concreto: em causa está uma trabalhadora a quem a Caixa Geral de Aposentações (CGA) atribuiu uma pensão de valor mais baixo face ao montante que seria considerado se fosse aplicada a lei que vigorava no momento do pedido de pensão — o caso remonta a 2014. Mas existindo três decisões neste sentido, a inconstitucionalidade pode ser declarada com força obrigatória geral. “Existem muitas situações semelhantes e com três decisões cria jurisprudência”, mas “não é caso neste momento”, frisa Cláudia Joaquim.

O acórdão nota, nomeadamente, que, com esta norma, “o Estado não apenas subtrai ao interessado o domínio sobre uma matéria com vastas implicações na sua vida, como se reserva a faculdade de, através da decisão discricionária quanto ao momento da prolação do despacho, assumir ele próprio controlo integral sobre a situação em benefício próprio”. E acrescenta: “É imaginável, por exemplo, que, estando em preparação legislação destinada a alterar as fórmulas de cálculo das pensões de aposentação em sentido desfavorável aos interessados, e implicando semelhante alteração uma poupança significativa de recursos públicos, sejam dadas instruções para que os processos pendentes não sejam despachados até à entrada em vigor do novo regime”.

“Semelhante possibilidade de manipulação, ainda que meramente teórica, constitui um fator adicional de insegurança para os destinatários”, diz ainda o acórdão porque à “imprevisibilidade das consequências das suas decisões”, acresce o risco de o Estado poder intervir “e, no seu próprio interesse, no sentido de precipitar um cenário desfavorável”. “Ao reservar-se tal faculdade arbitrária, o Estado inspira a desconfiança dos cidadãos na sua integridade, agravando a insegurança jurídica”, conclui.

A norma também viola o princípio da igualdade, refere o TC: “nada justifica que sejam tratados de modo diferente dois requerentes contemporâneos cujos processos são despachados no domínio da vigência de leis diversas”, avança o acórdão cujo relator é o Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro.

“Tratando-se de aposentação voluntária, as propriedades relevantes das situações são as carreiras contributivas dos requerentes e o momento do exercício do direito a aposentarem-se — nenhuma das quais tem qualquer relação com o momento em que é proferido o despacho da CGA que reconhece o direito à aposentação, o qual é, de resto, como se referiu anteriormente, um ato administrativo de conteúdo estritamente vinculado. A distinção legal é, pois, arbitrária”, diz.

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