Autoridade da Concorrência foi ignorada no desenho dos CMEC
Antes da entrada em vigor dos CMEC, a Autoridade da Concorrência alertou para os custos deste modelo e apresentou propostas alternativas. Foi ignorada e o seu presidente não foi reconduzido.
A Autoridade da Concorrência (AdC), então recém-criada, foi consultada inicialmente quando o decreto-lei que veio criar os Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (os chamados CMEC) estava a ser desenhado, levantando várias objeções que não foram atendidas. Voltou a ser consultada em 2005, alertando o Governo de então para os “elevados custos dos CMEC e das eólicas”. Foi novamente ignorada e “não mais foi consultada”. Em 2008, terminado o mandato do primeiro presidente desta autoridade, o responsável foi chamado ao gabinete do ministro Manuel Pinho, que o informou de que não seria reconduzido para um segundo mandato. “E ponto final”.
Os episódios foram recordados, esta terça-feira, por Abel Mateus, presidente da Autoridade da Concorrência entre 2003 e 2008, os primeiros anos de atuação desta entidade. A ser ouvido na Comissão de Inquérito ao Pagamento de Rendas Excessivas aos Produtores de Eletricidade, que recomeçou esta manhã após as férias parlamentares, Abel Mateus frisou que a Autoridade da Concorrência “teve um papel diminuto” no âmbito das rendas energéticas, até porque a autoridade não tinha recursos num período inicial.
“A vida na AdC nos primeiros dois anos foi absolutamente terrível, porque não tínhamos recursos nenhuns. Não tínhamos especialistas em eletricidade, só depois é que empregámos dois especialistas. As condições eram do mais difícil que poderiam ser”, respondeu, questionado pelo deputado bloquista Jorge Costa sobre se a autoridade poderia ter sido mais interventiva na oposição às rendas energéticas.
Apesar deste contexto, a AdC partilhou pareceres com dois governos: o de Durão Barroso, responsável pela elaboração do diploma que veio criar o regime dos CMEC (o decreto-lei 240/2004, que veio a ser publicado já durante o governo de Santana Lopes) e o de José Sócrates, que concluiu a fórmula de cálculo dos CMEC e a colocou em prática, a partir de 2007.
O ministro Manuel Pinho chamou-me ao gabinete para transmitir que o meu mandato não seria renovado e ponto final.
“A AdC foi consultada aquando do decreto-lei que criou os CMEC em 2004, pelo ministro [da Economia] Carlos Tavares, tendo apresentado várias objeções ao Governo, que não foram atendidas”, conta Abel Mateus. “Voltou a ser consultada pelo ministro Manuel Pinho, em início de 2005, tendo chamado a atenção para os elevados custos dos CMEC, elevados custos das eólicas e para a ausência de concorrência no setor. Apresentou propostas concretas para aumentar a concorrência e diminuir os custos para os consumidores. Não mais foi consultada“, acrescenta.
Questionado sobre se lhe foram apresentadas razões para não ter sido reconduzido no cargo de presidente da AdC, a resposta é curta: “O ministro Manuel Pinho chamou-me ao gabinete para transmitir que o meu mandato não seria renovado e ponto final“.
Rendas já custaram 22,6 mil milhões
Na intervenção inicial que fez nesta audição, o também professor universitário apresentou também os seus próprios cálculos dos custos das rendas energéticas para os contribuintes, concluindo que as contribuições para o setor energético já são quase tão elevadas como as que foram feitas para o sistema bancário.
“Se somarmos os sobrecustos pagos pelos consumidores aos produtores de energia elétrica, já somamos cerca de 22,6 mil milhões de euros“, aponta.
A maior fatia deste montante é atribuída aos custos de subsidiação das energias eólicas e outras renováveis, que ultrapassam os 12 mil milhões de euros entre 2006 e 2018. No mesmo período, os CMEC terão custado aos consumidores perto de 3 mil milhões de euros, enquanto os contratos de aquisição de energia (CAE) terão um custo de 1,5 mil milhões de euros.
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