Três perspetivas sobre o Estado de Angola

Paulo Portas, Jaime Nogueira Pinto e António Martins da Cruz partilharam a sua visão sobre o estado do Estado de Angola. Da relação com Portugal à geoestratégia e à transição do poder.

Em que estado está o Estado de Angola? O que mudou no país desde a saída de José Eduardo dos Santos do poder? Estará o ambiente mais favorável aos negócios e a economia do país mais aberta ao exterior?

Na conferência Angola: Novo ciclo político e de investimento, Paulo Portas, Jaime Nogueira Pinto e António Martins da Cruz foram chamados a partilhar uma perspetiva sobre o presente e o futuro daquele país africano. Saiba o que pensam.

Paulo Portas: Questão económica é um “desafio” para a Presidência de João Lourenço

O antigo vice-primeiro-ministro português, Paulo Portas, está otimista quanto ao futuro de Angola: “Faço parte dos que acreditam que [o país] superará as dificuldades”, afirmou. Mas é na estabilidade, desenvolvimento e saúde da economia que reside o principal “desafio” para a Presidência de João Lourenço, que assinala dois anos em setembro.

“Acho que o Presidente sabe que Angola vem de um ciclo recessivo, que gostaria de ver condições mais favoráveis, mas acaba de ter a honestidade de assumir que o crescimento será de 0% e que teremos que esperar por 2020 para que possa ser melhor; e que sabe que a dívida pública de Angola terá atingido 90% do PIB, pelo que deverá garantir condições para reduzir essa dívida”, afirmou Paulo Portas na conferência. “É evidente que um homem responsável só poderia propor ao país uma mudança”, atirou.

Para Paulo Portas, “é essencial a efetivação do IVA, pelo menos para os grandes contribuintes, para combater a evasão tributária” e, desta forma, suprimir “dificuldades orçamentais”. Além disso, “é essencial ter sucesso na atração de investimento” e “conseguir convencer o investimento estrangeiro a apostar agora” em Angola — “nomeadamente o português, mas não só”, reiterou o também ex-presidente do CDS-PP.

Dito isto, o antigo parceiro de Governo de Pedro Passos Coelho afirmou que Portugal tem de “defender” a relação que mantém com Angola, que é “um dos principais clientes” do país. Até porque, num contexto de globalização, “não há espaços vazios”: “Todo e qualquer espaço vazio que Portugal deixe com Angola será, obviamente, aproveitado por outros Estados, alguns deles nossos amigos e parceiros”.

Jaime Nogueira Pinto: “Diversificando a economia”, Angola “pode voltar a ser caso de sucesso”

O historiador e politólogo Jaime Nogueira Pinto enalteceu a “singularidade de Angola”, que “repetiu o modo normal de se fazerem Estados”, primeiro com uma guerra pela independência e, depois, com uma guerra civil: “Muitas vezes, no fim das guerras civis, desmobiliza-se o exército. Ora, em Angola não se fez isso”, frisou.

No entanto, recordou que existem desafios pela frente se o país quiser manter essa “singularidade”, nomeadamente no facto de “a renovação com o Presidente João Lourenço” ter coincidido “com o agravar da economia do país por causa da queda dos preços do petróleo”.

Jaime Nogueira Pinto afirmou que João Lourenço tem levado a cabo uma “campanha de saneamento nacional”, atacando a corrupção, que é um dos problemas “mais endémicos” do país, além “do nepotismo”. “Este esforço tem vindo a ser reconhecido dentro e fora de Angola”, garantiu o historiador português.

Ainda assim, o politólogo reconheceu que esse incremento da credibilidade angolana não tem sido acompanhado por ações concretas da comunidade internacional: “Ainda não se viu do exterior, sobretudo dos EUA, uma correspondente devolução da confiança, que ponha fim às sanções que muito prejudicam Angola”, afirmou.

António Martins da Cruz: Angola tem de dar “sinais positivos para ganhar confiança do exterior”

O embaixador português e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros, António Martins da Cruz, afirmou que Angola tem de dar “sinais positivos” que permitam ao país conquistar “a confiança” dos investidores estrangeiros.

“O Presidente João Lourenço iniciou as reformas que prometera e que os eleitores esperavam, com ceticismo, com otimismo, com um wait and see. Deu um fator de esperança, desbravou vários caminhos que eram essenciais para a política e a economia, alterado as perceções sobre Angola”, referiu o ex-ministro de Durão Barroso.

No entanto, “o novo ciclo político angolano, sem estar em sintonia com o ciclo económico internacional, tem tido dificuldade em afirmar-se”. Mas tem de continuar a dar “sinais positivos para ganhar a confiança exterior de governos, empresários e, muito importante, opinion makers, afirmou António Martins da Cruz.

O foco deve estar, por isso, em “melhorar para obter classificações mais positivas das agências de rating“, melhorando também, desta forma, a credibilidade de Angola perante o exterior.

O ex-ministro português terminou com uma provocação aos críticos das relações bilaterais entre Portugal e Angola. “Nunca ninguém foi à bomba de gasolina e perguntou: ‘tem aí petróleo da Noruega? É que eu não quero petróleo de países que não têm o mesmo sistema político que o meu'”, concluiu.

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