Líderes europeus não chegam a acordo para cargos de topo. Trabalhos suspensos até amanhã

A reunião extraordinária do Conselho Europeu foi suspensa depois de uma maratona negocial madrugada dentro, que não foi suficiente para que os líderes chegassem a acordo sobre a futura liderança da UE

A reunião extraordinária dos chefes de Estado e de Governo da União Europeia foi suspensa na manhã desta segunda-feira depois de os líderes não chegarem a acordo durante a maratona negocial que fez desta cimeira a mais longa da história da União Europeia. A reunião será retomada esta terça-feira, anunciou o porta-voz do presidente do Conselho Europeu. Não houve votação no Conselho e a opção Timmermans não foi a única em cima da mesa, garante o primeiro-ministro croata.

Foram muitas as reviravoltas, mas no final ficou tudo como estava: em águas de bacalhau. A mais longa das cimeiras terminou, mais uma vez, sem resultados. Na chegada a Bruxelas, Angela Merkel, Emmanuel Macron, Mark Rutte e Pedro Sanchéz traziam na bagagem um princípio de acordo que parecia abrangente o suficiente e que noutros tempos permitiria uma reunião bem-sucedida, ainda que provavelmente longa, de qualquer das formas.

O socialista holandês Frans Timmermans seria o presidente da Comissão Europeia, o conservador alemão Manfred Weber o presidente do Parlamento Europeu durante cinco anos, o dobro do mandato atual, o liberal belga Charles Michel seria o novo presidente do Conselho Europeu.

Mas a solução, que o ex-presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, diz ter sugerido a António Costa por telefone, não foi muito bem recebida, desde logo na Europa central. Polónia e Hungria, lembrando-se das disputas acesas com Frans Timmermans devido à aplicação da lei comunitária, juntaram os outros dois parceiros do chamado grupo de Visegrado — República Checa e Eslováquia — e declararam a oposição completa e inequívoca à nomeação de Frans Timmermans.

Mas estes não foram os únicos, vários chefes de Governo membros do PPE não gostaram da solução encontrada por Angela Merkel e recusaram-se a alinhar, estando entre eles a Irlanda, o Chipre e a Bulgária. Também a Itália, através do seu ministro do Interior e um dos líderes da coligação governamental, Matteo Salvini, disse que não apoiaria um socialista na Comissão.

A reunião, que começou com três horas de atraso devido a reuniões bilaterais para tentar conseguir um consenso, foi suspensa menos de duas horas depois de começar para mais consultas, consultas essas que demoraram a noite inteira. O presidente do Parlamento Europeu, Donald Tusk, falou com todos os chefes de Estado e de Governo presentes (o presidente do Chipre, Nicos Anastasiades, não esteve presente porque partiu uma perna).

Com cada um deles testou várias soluções, que incluíam nomes do PPE para a liderança da Comissão Europeia, incluindo Michel Barnier, o negociador do Brexit, e o primeiro-ministro irlandês, que rejeitou qualquer interesse em assumir um cargo europeu.

O número de líderes contra Timmermans era suficiente para inviabilizar a sua nomeação, à luz da maioria reforçada que é exigida no Conselho: pelo menos 72% dos países que representem pelo menos 65% da população da União Europeia.

Ainda assim, os líderes voltaram a reunir-se durante a manhã todos na mesma sala para o pequeno-almoço, que foi suspenso e voltou a ser retomado. As últimas propostas em cima da mesa apontavam para a nomeação de Frans Timmermans para a presidência da Comissão Europeia, de Manfred Weber para o Parlamento Europeu durante cinco anos e de Kristalina Georgieva, atual diretora do Banco Mundial, para a presidência do Conselho Europeu.

A atual diretora do Banco Mundial é há muito um dos nomes do agrado de Angela Merkel. Quando António Guterres se candidatou a secretário-geral das Nações Unidas, Angela Merkel tinha prometido o apoio ao português, mas à última hora tentou que fosse Kristalina Georgieva a suceder a Ban Ki-moon. No entanto, a búlgara não foi além da oitava posição em dez candidatos, originando algum mal-estar com o português que levou mesmo a uma viagem secreta do então ministro dos Negócios Estrangeiros e atual presidente da Alemanha, Frank-Walter Steinmeier, a Portugal para tentar amenizar a situação com António Guterres, já depois da sua eleição.

Também os nomes do belga Charles Michel e de Margrethe Vestager estiveram em cima da mesa, mas em opções diferentes. Tanto disputariam o cargo de chefe da diplomacia europeia, como poderia ser Margrethe Vestager a ficar com o cargo de primeira vice-presidente da Comissão Europeia, assumindo o lugar da número dois da próximo Comissão, que até agora pertence precisamente a Frans Timmermans.

No entanto, e depois de testar múltiplas hipóteses e de recolher as intenções de voto de cada um dos líderes, Donald Tusk decidiu suspender a reunião e dar aos líderes a hipótese de descansar e refletir, mas não por muito tempo. Os trabalhos vão ser retomados esta terça-feira pelas 11h00 em Bruxelas (10h00 em Lisboa), até porque o Parlamento Europeu vai eleger o seu presidente na quarta-feira, haja ou não acordo no Conselho Europeu em relação aos cargos de topo. E nada está garantido. Os líderes europeus estão divididos e, até na agenda se admite a possibilidade, “caso seja necessário”, de prolongar as negociações com um jantar de trabalho.

Esta eleição poderia colocar em causa o equilíbrio necessário para haver um acordo no Conselho Europeu, seja em termos de famílias políticas, como de nacionalidades, género e distribuição geográfica.

À saída da reunião, alguns dos líderes falaram sobre as negociações. Segundo o primeiro-ministro da Croácia, Andrej Plenković, “está tudo em aberto” e “foi uma decisão inteligente adiar” a discussão para terça-feira, depois de quase 20 horas de negociações intensas.

O croata, um dos chefes de Governo que se opuseram à nomeação de Frans Timmermans, disse que o plano concebido em Osaka que daria a Timmermans a presidência da Comissão Europeia “não foi a única opção em cima da mesa”, mas que no final não houve qualquer votação. “Nós como que conseguimos sentir o que pode passar ou não”, explicou o líder croata.

Já Giuseppe Conte, o primeiro-ministro italiano, fez questão de dizer aos jornalistas que a Itália não tem nada pessoal contra Frans Timmermans e até lhe teceu alguns elogios, apesar da oposição veemente de Matteo Salvini. No entanto, este acordo foi apresentado como parte de um pacote com o qual os italianos não concordam e tendo por base reviravoltas sobre a utilidade e consequência do processo dos spitzenkandidaten, através do qual as principais famílias europeias escolhem um cabeça-de-lista às eleições para o Parlamento Europeu que concorre como candidato à Comissão Europeia, apesar de ser o Conselho Europeu a indicar este nome (que tem de ser ratificado pelo Parlamento Europeu).

Macron vira foco para a presidência do Banco Central Europeu

A prioridade de Emmanuel Macron era a Comissão Europeia e o Presidente francês não fez dessa pretensão um grande segredo. Mas não conseguindo o seu primeiro objetivo, o Chefe de Estado francês estará agora a virar agulhas para o Banco Central Europeu, um dos dois lugares mais importantes para preencher, juntamente com a presidência da Comissão Europeia.

Emmanuel Macron não quer apenas um francês, mas também que seja escolhida uma mulher, para contrabalançar a falta de igualdade de género nos principais cargos da União Europeia.

A escolhida poderá ser Sylvie Goulard, vice-governadora do Banco de França e que já foi apontada algumas vezes como sucessora de Mario Draghi, apesar de o seu chefe, François Villeroy de Galhau também ser um dos principais nomes na disputa. Sylvie Goulard foi eurodeputada, candidata a primeira-ministra francesa, e ministra da Defesa em França. Apesar de ter saído do Governo pela porta pequena, conseguiu integrar o Banco de França no ano passado.

Mas tudo dependerá do resto do acordo. A Alemanha pode deixar cair as suas pretensões à Comissão Europeia, mas há muito que tem os olhos postos no Banco Central Europeu, com Jens Weidman na dianteira. Além disso, França já teve a presidência do Banco Central Europeu durante o mandato de Jean-Claude Trichet, sendo a Alemanha a única entre as quatro maiores economias do euro que ainda não teve um alemão no cargo.

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