Crise energética. Afinal, o que se entende por açambarcamento?

  • ECO
  • 16 Agosto 2019

O açambarcamento é um crime de natureza pública e tem consequências jurídicas tanto para as pessoas coletivas como pessoas singulares.

Na atual crise energética decretada em Portugal, e depois de o Governo ter avançado com a requisição civil, o açambarcamento pode vir a ser um dos efeitos da greve dos motoristas. Mas o que se entende por açambarcamento?

Segundo explicou ao ECO o advogado Tiago Geraldo, da sociedade Morais Leitão, Galvão Teles, Soares da Silva & Associados, o açambarcamento consiste em “obstaculizar, dificultar ou inviabilizar o processo de venda de determinados bens essenciais de primeira necessidade que se encontrem em situação de escassez, prejudicando o abastecimento regular do mercado”.

Açambarcamento consiste em obstaculizar, dificultar ou inviabilizar o processo de venda de determinados bens essenciais de primeira necessidade que se encontrem em situação de escassez.

Tiago Geraldo

Advogado

Este crime contra a economia pode ser protagonizado tanto por comerciantes e fornecedores como por consumidores ou adquirentes, segundo o Decreto-Lei nº 28/84, de 20 de janeiro.

Tiago Geraldo explicou que “ocultando bens ou armazenando-os em locais não indicados às autoridades de fiscalização, quando essa indicação seja exigida; recusando a venda desses bens segundo os usos normais da respetiva atividade” os comerciantes e fornecedores dos bens essenciais podem responder por açambarcamento. Mas, “recusar ou retardar a entrega desses bens quando encomendados e aceite o respetivo fornecimento; encerrar o estabelecimento ou o local do exercício da atividade com o fim de impedir a sua venda” também são situações suscetíveis de ser classificadas como açambarcamento, acrescenta o advogado da Morais Leitão.

No caso do consumidor, o açambarcamento verifica-se quando alguém, em contexto de elevada escassez, “adquire bens essenciais de primeira necessidade em quantidade manifestamente desproporcionada às suas necessidades de abastecimento ou de renovação normal das suas reservas”, referiu Tiago Geraldo.

Quando a infração é realizada por um comerciante, as sanções podem variar entre seis meses e três anos de prisão e uma multa não inferior a 100 dias, em caso de dolo, ou a 40 dias, em caso de negligência. Quando o infrator é o consumidor, a pena máxima fixa-se nos seis meses de prisão e a multa pode oscilar entre 50 a 100 dias, explicou o advogado Gonçalo Anastácio, da SRS Advogados.

O presidente da Autoridade Portuguesa de Direito do Consumo, Mário Frota, afirmou ao ECO que o controlo do açambarcamento em Portugal está dependente da existência de “autoridades despertas para o fenómeno”. Referiu ainda que a “vigilância popular” é fundamental uma vez que “se tratam de crimes contra a economia popular”. Para Tiago Geraldo, sendo um comportamento com relevância criminal “os meios de prevenção e controlo são os gerais para qualquer outro comportamento ilícito que esteja ou se admita poder estar em curso”. O advogado da Morais Leitão defende também uma monitorização dos “processos de venda nos locais em que os bens escassos estejam a ser transacionados, por parte das autoridades públicas competentes, fiscalizando por amostra quantidades vendidas e adquiridas”.

Autoridades despertas para o fenómeno. E com uma sistemática intervenção no mercado: “o medo guarda a vinha”!

Mário Frota

Presidente da Associação Portuguesa de Direito do Consumo

Mário Frota admite que na atual crise energética possa vir a existir o açambarcamento de combustível devido ao “anormal abastecimento de vasilhame avulso”. Refere ainda a possibilidade de géneros alimentares de primeira necessidade serem também açambarcados.

Por outro lado, o advogado Gonçalo Anastácio, afirmou ser pouco provável que se chegue ao ponto de açambarcar. Até porque, recorde-se, o Governo impôs limites ao abastecimento de combustível por todo o país. Nos postos de abastecimento normais, os veículos ligeiros só podem ser abastecidos com 25 litros e os pesados até 100 litros, enquanto na Rede de Emergência de Postos de Abastecimento (REPA) o limite é de 15 litros.

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