Quatro pré-avisos de greve em cinco meses. O que mudou no discurso dos sindicatos?

Os motoristas de matérias perigosas voltaram a anunciar uma paralisação, dias depois de terem terminado uma greve. Desta vez, tem um tempo definido e incide apenas sobre as horas extraordinárias.

Desde abril deste ano, o Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas (SNMMP) já delineou quatro pré-avisos de greve, o último anunciado nesta quarta-feira, três dias depois de terminar a paralisação iniciada a 12 de agosto. Apesar de serem avançados pela mesma estrutura, existem diferenças entre os pré-avisos entregues, nomeadamente no âmbito e duração da greve.

As diferenças deste aviso prévio para os que o precederam começam logo no facto de esta se tratar de uma greve ao trabalho suplementar, feriados e fins de semana, ao contrário das últimas, que eram greves gerais. E, precisamente por estarem “assegurados os horários de função”, já que incidirá somente sobre as horas de trabalho acima das oito horas nos dias úteis, o sindicato decidiu não propor serviços mínimos, como explicou o seu líder, Francisco São Bento.

É de 7 a 22 de setembro que a próxima greve está agendada, um período de cerca de duas semanas. Nos últimos pré-avisos só foi definida a data de início da greve, sendo por um período indeterminado. De ambas as vezes que a greve se realizou, não chegou a durar mais de uma semana. Em abril durou quatro dias e em agosto prolongou-se de segunda-feira até domingo.

O primeiro documento a dar conta de que uma greve estava para vir foi entregue em abril. Aí, definia-se que os motoristas iam fazer uma greve nacional por tempo indeterminado para reivindicar o reconhecimento da categoria profissional específica. A greve avançou mesmo, a 15 de abril, e fez parar o país numa altura próxima das festividades da Páscoa.

A greve chegou ao fim depois de alcançado o compromisso entre o sindicato e a Associação Nacional dos Transportadores Rodoviários Públicos de Mercadorias (Antram) de “encetar um processo de negociação coletiva” até 31 de dezembro deste ano, segundo o acordo assinado.

Menos de um mês depois, houve novo volte-face nas negociações e foi entregue novo pré-aviso, mas que acabou por não ser cumprido. A greve, que estava marcada para 23 de maio e que iria continuar por tempo indeterminado, foi desconvocada, depois de o sindicato chegar novamente a acordo com a Antram. Na altura o caderno reivindicativo dos motoristas incluía, além de uma remuneração base de 1.200 euros, um subsídio de 240 euros e a redução da idade de reforma.

Entre as exigências dos motoristas encontrava-se ainda a obrigatoriedade do patrocínio pelas entidades patronais de acompanhamento médico anual aos motoristas expostos a substancias tóxicas e nocivas e o “respeito pelo direito a retribuição e ao horário de trabalho diurno, noturno e suplementar, traduzindo-se num aumento substancial dos valores remuneratórios e na abolição de esquemas remuneratórios que visam a fuga aos impostos e a perca de direitos dos motoristas”.

Esta mesma paralisação acabou por ser recuperada em agosto, com o SNMMP a acusar a Antram de ter recusado “formalmente cumprir com o que se comprometeu”. O aviso prévio de greve que foi entregue a 15 de julho, com quase um mês de antecedência, foi elaborado em conjunto com o Sindicato Independente dos Motoristas de Mercadorias (SIMM), que apontava também o dedo ao empregador de não ter “mostrado a intenção de aceitar nenhuma das propostas” do sindicato.

Os sindicatos exigiam um acordo para aumentos graduais no salário-base até 2022, de 700 euros em janeiro de 2020, 800 euros em janeiro de 2021 e 900 euros em janeiro de 2022. Queriam também um novo contrato coletivo de trabalho, bem como o aumento do valor das ajudas de custo.

Para esta greve, o sindicato propunha serviços mínimos de 25% em todo o território nacional, e assegurar na totalidade o “abastecimento de combustíveis e matérias perigosas a hospitais, centros de saúde, clínicas de hemodiálise e outras estruturas de prestação de cuidados de saúde inadiáveis, estabelecimentos prisionais, bases aéreas, serviços de proteção civil, bombeiros, forças de segurança e unidades autónomas de gaseificação”.

Desta vez, o SNMMP volta a avançar sozinho para a greve, ainda que convidando mais motoristas a juntarem-se ao protesto, depois de falharem as negociações com a entidade patronal ainda antes de começarem. O sindicato não aceitou continuar com a mediação do Governo a não ser que fossem aceites certos “princípios”.

Estas reivindicações são que “sejam respeitadas Leis nacionais no que toca às horas extra e que seja aplicado aos motoristas de matérias perigosas um acrescento de 50 euros no subsídio“, o qual foi fixado (e criado), depois da ameaça da greve de maio, nos 125 euros. O sindicato justifica a greve com a recusa destas garantias.

O líder do SNMMP indicou ainda, durante o anúncio deste pré-aviso de greve, pouco mais de duas semanas antes da data definida, que a paralisação visa “provar que as empresas funcionam com base no caráter extraordinário do trabalho destes trabalhadores”, ou seja, o sindicato procura comprovar que “as empresas apenas funcionam” assentes em trabalho extra dos seus motoristas.

No aviso prévio para setembro, ao qual o ECO teve acesso, o sindicato aponta que “o recurso a esta greve faz-se como derradeira forma de luta pelos direitos destes trabalhadores, que trabalham de forma desumana, alguns expostos a mais de 15 horas de trabalho diárias, que se traduz num grave perigo para a segurança dos mesmos, e para a segurança pública em geral, ampliada pelas matérias que os mesmos transportam”.

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