Elisa Ferreira: Reações da direita à esquerda, passando pelas ilhas
Entre a "honra" de ter uma comissária com a pasta dos fundos, às críticas pelo facto de até países menores terem conseguido vice-presidências, à "mulher certa no lugar certo", reações multiplicam-se.
Elisa Ferreira, comissária designada por Portugal para o futuro executivo comunitário, foi nomeada responsável pelos fundos de coesão, reformas estruturais e pela implementação do futuro instrumento orçamental para a zona euro, segundo revelou esta terça-feira a presidente eleita da Comissão Europeia.
Na “carta de missão” entregue por Von der Leyen à ex-ministra portuguesa, é detalhado que “a sua tarefa nos próximos cinco anos é assegurar que a Europa investe e apoia as regiões e as pessoas mais afetadas pela transição digital e pela transição climática, sem deixar ninguém para trás”. A nível de política de coesão, a missiva aponta ainda que a comissária designada “deve trabalhar com os colegisladores em busca de um acordo sobre o quadro legislativo para os Fundos de Coesão no próximo orçamento plurianual” (2021-2027).
“A futura política deve ser moderna, de simples utilização, e levar a um investimento com mais qualidade. Um acordo rápido é essencial para assegurar que os programas estão prontos desde o primeiro dia”, pede Leyen, acrescentando que Elisa Ferreira deve também apoiar “as regiões e as autoridades de gestão a preparar os seus programas, em linha com as suas necessidades específicas e objetivos globais da Europa”.
Conhecida a “carta de missão” entregue à comissária europeia portuguesa, tempo de olhar para as diferentes reações que a pasta escolhida para Elisa Ferreira suscitou no país, a começar pela própria Elisa Ferreira.
Elisa & António
“É com muita satisfação, e consciente da elevada responsabilidade que me é confiada, que exercerei o pelouro que me foi atribuído para os próximos cinco anos, caso venha, como espero, a ser confirmada no cargo para que fui indigitada”, referiu a comissária designada em nota enviada à agência Lusa.
Para Elisa Ferreira, “investimento, desenvolvimento económico, coesão territorial, convergência económica e social no quadro da União Económica e Monetária e transição energética são áreas prioritárias da Comissão Europeia”, nas quais disse ir colocar toda a “determinação, energia e experiência” adquirida ao longo da sua carreira profissional. “Nunca, como hoje, a União Europeia (UE) precisou tanto do empenhamento de todos contra as tendências desagregadoras que a ameaçam”, afirmou.
Já do lado do primeiro-ministro, que à imagem de Elisa Ferreira já conhecia há dias qual a “tutela” que iria recair à portuguesa, a reação foi a de puxar pela “honra” para o país ter uma comissária europeia com tal pasta. “Esta era a pasta que tínhamos acertado com a senhora Ursula Von der Leyen, penso que honra o nosso país e que, seguramente, está ao nível da qualidade da nossa comissária [Elisa Ferreira]. A pasta permitirá à comissária Elisa Ferreira – e também a Portugal – trabalhar em áreas estratégicas para o país”, sustentou o líder socialista.
António Costa sublinhou que a pasta em questão surge num formato “mais alargado do que o tradicional”, já que engloba “dois novos fundos que financiarão a transição para a sociedade digital e para o novo paradigma energético, o novo fundo que constitui o embrião da capacidade orçamental da zona euro e a dimensão do desenvolvimento da estratégia das políticas urbanas da União Europeia”, apontou.
No centrão
Saindo da figura do primeiro-ministro, mas continuando entre socialistas, destaque para a reação da delegação socialista no Parlamento Europeu, que defendeu que a pasta atribuída a Elisa Ferreira, é “uma vitória” para a União Europeia (UE) e para Portugal, abrangendo os fundos estruturais e o orçamento comunitário. “A atribuição desta pasta a Elisa Ferreira constitui, em primeiro lugar, uma vitória para a UE e uma boa vitória para Portugal, tendo em conta o conteúdo da pasta e o perfil de Elisa Ferreira”, afirmou, em Bruxelas, Carlos Zorrinho.
“Verdadeiramente, a pasta da Coesão e Reformas é a pasta da convergência porque Elisa Ferreira vai ter responsabilidade sobre os fundos estruturais e de proximidade, nomeadamente os fundos de coesão e outros que permitem desenvolver os territórios, mas vai ao mesmo tempo ter responsabilidade sobre os fundos de transição, ou seja, sobre aqueles recursos que vão permitir aos países e às regiões fazer a transição digital que é necessária, o progresso necessário para a descarbonização e transição energética e fazê-lo de forma justa, mantendo a competitividade dos territórios”, detalhou Carlos Zorrinho.
Já do lado do PSD, Rui Rio reconhece que a “pasta que coube à comissária de Portugal é uma pasta que objetivamente tem relevo, vai gerir fundos comunitários e os fundos são relevantes para todos os países, particularmente para Portugal”, defendeu. Contudo, sublinhou, “uma coisa é a pasta” e outra será a forma como Elisa Ferreira “consegue ou não gerir o poder que pode ter e se consegue, pelo facto de ser portuguesa, não prejudicar Portugal” na questão dos fundos.
“Vai ter de ter muita habilidade para gerir uma pasta onde Portugal é notoriamente um país interessado”, alertou.
Apesar da advertência, Rio não assume estar “desencantado” como Paulo Rangel, eurodeputado do PSD. “Nem fiquei nem deixei de ficar, vai ser medido com a forma como vai ser exercida a pasta. Ele pode estar com uma visão mais pessimista da margem de manobra que a dra. Elisa Ferreira pode ter, eu neste momento prefiro aguardar”, disse.
Fora do centro
No Bloco de Esquerda, a reação foi mais dedicada às intenções da equipa de Ursula von der Leyen que a Elisa Ferreira a quem, todavia, reconhecem grandes capacidades. José Gusmão, eurodeputado do Bloco ouvido pela TSF, afirmou acreditar nas capacidades da ex-ministra, mas aponta que a criação desta área de influência pode servir para controlar as reformas em cada um dos Estados-membros.
“Se a intenção da presidente da Comissão for começar a racionar os fundos de coesão em função do tipo de reformas que são implementadas pelos vários Governos – o que seria, aliás, consistente com o seu pensamento, mas seria um instrumento de interferência inaceitável nas competências dos Estados-membros e na sua soberania democrática -, o que esperamos de Elisa Ferreira é que se oponha a esse projeto e que se bata por uma política de coesão que respeite as escolhas que são feitas ao nível nacional.”
Quanto ao CDS, Nuno Melo, eurodeputado, preferiu criticar o facto de Elisa Ferreira não “ter sido escolhida como uma das várias vice-presidentes de vários países, inclusivamente alguns pequenos e médios da UE”. Melo reconhece, porém, que a pasta de Elisa “é muito importante para a União Europeia porque os mecanismos de coesão e as questões energéticas são fulcrais em qualquer país e projeto político”.
“Hoje, do ponto de vista energético, a UE é completamente dependente da energia a leste, nomeadamente proveniente da Rússia, […] e Portugal poderia ajudar a compensar dependência, desde que franceses e espanhóis estivessem disponíveis a ajudar que a energia que Portugal produz e não utiliza ficasse disponível para o resto dos europeus”, observou Nuno Melo como desafios para o futuro na ‘tutela’ de Elisa Ferreira.
No pós-ideológico
Francisco Guerreiro, eurodeputado do PAN, partido que se coloca num universo “pós-ideológico”, considerou “relevante” e “exigente” a pasta atribuída a Portugal na nova Comissão Europeia, realçando as questões do clima associadas à mesma.
“É uma pasta bastante relevante para Portugal e para a Europa e que é exigente, mas à qual a dra. Elisa Ferreira certamente responderá com a maior responsabilidade e eficiência, como tem mostrado ao longo dos anos, não só ao nível dos fundos regionais, de coesão, mas também sendo uma ferramenta orçamental para a transição energética, o que nos parece bastante relevante”, afirmou Guerreiro à agência Lusa, reconhecendo alguma “sensibilidade ambiental” à socialista.
“Queremos ver até onde vai essa sensibilidade e tudo faremos para garantir que esses fundos são alocados do modo mais correto e que haja esse pendão de emergência climática nesta alocação dos fundos“, salientou.
Na ilhas
Para o presidente do Governo dos Açores, socialista Vasco Cordeiro, a reação não podia ser mais simples e eficaz: Elisa Ferreira é “a mulher certa no lugar certo”.
“Pela sua competência, pelas suas qualificações, mas também pela sua sensibilidade política e pelo conhecimento que tem, desde logo, do território de um país como Portugal, com as suas regiões ultraperiféricas dos Açores e da Madeira, a assunção desta área em concreto traz-me a fundada esperança de que a Coesão, um dos grandes desígnios do projeto europeu, possa ganhar uma relevância acrescida, uma capacidade de concretização mais determinada e uma relevância política mais consistente”, diz o chefe do executivo açoriano em nota enviada à imprensa pelo seu gabinete.
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